quinta-feira, 7 de março de 2013

A DOUTRINA LUTERANA DA COMUNICAÇÃO DE ATRIBUTOS

1. EXPOSIÇÃO DA POSIÇÃO LUTERANA. Os luteranos divergem dos reformados (calvinistas) em sua doutrina da communicatio idiomatum. Eles ensinam que os atributos de uma natureza são atribuídos à outra com base numa transferência fatual e acham que somente com tal transferência a real unidade da pessoa pode ser assegurada. Esta posição não envolve uma negação do fato de que os atributos das duas naturezas podem ser atribuídos à pessoa, mas acrescentam alguma coisa a isso no interesse, como eles o vêem, da unidade da pessoa. Nem sempre eles expõe a doutrina da mesma forma. Lutero e alguns dos primitivos luteranos ocasionalmente falavam de uma comunica’;cão em ambas as direções, da natureza divina para a humana, e também da humana para a divina. Contudo, no subseqüente desenvolvimento da doutrina, a comunicação da natureza humana para a divina logo deixou de se ver, e somente se deu ênfase à comunicação da natureza divina para a humana. Seguiu-se logo outra limitação ainda maior. Os escolásticos luteranos distinguiam entre os atributos operativos de Deus (onipotência, onipresença e onisciência) e os Seus atributos quiescentes (infinidade, eternidade, etc.), e ensinavam que somente os primeiros foram transferidos à natureza humana. Todos eles concordavam que a comunicação foi feita quando ocorreu a encarnação. Mas naturalmente surgiu a questão sobre como se pode enquadrar isso no retrato que os evangelhos nos dão de Cristo, que não é o retrato de um homem onisciente e onipresente. Isto deu surgimento a diferenças de opinião. Conforme alguns, Cristo necessariamente exerceu estes atributos durante a Sua humilhação, mas o fez secretamente; mas conforme outros, o exercício deles estava sujeito à vontade da pessoa divina, que voluntariamente os deixou inoperantes durante o período da Sua humilhação. Repetidamente se manifestou oposição a essa doutrina dentro da Igreja Luterana. Demonstrou-se que ela é incoerente com a idéia de um desenvolvimento verdadeiramente humano da vida de Cristo, tão claramente ensinado pelo próprio Lutero. A insistência do grande reformador na comunicação dos atributos acha sua explicação, em parte em suas tendências místicas, e em parte em seus ensinos sobre a presença física de Cristo na Ceia do Senhor. 2. OBJEÇÕES A ESSA DOUTRINA LUTERANA. Há sérias objeções à doutrina luterana da communicatio idiomatum. a. Não tem base bíblica. Se for deduzida de declarações como a de Jo 3.13, então, por coerência, dever-se-ia concluir de 1 Co 2.8 que a possibilidade de sofrer foi comunicada à natureza divina. Contudo, os luteranos evita, essa conclusão. b. Implica a fusão das naturezas divina e humana de Cristo. Os luteranos falam como se os atributos pudessem ser abstraídos da natureza, e como se pudessem ser comunicados permanecendo separadas as naturezas, mas a substância e os atributos não podem ser separados desse modo. Havendo uma comunicação dos atributos divinos à natureza humana, esta natureza, como tal, deixa de existir. A onipresença e a onisciência não são compatíveis com a humanidade. Tal comunicação resultaria numa mistura do divino e do humano, quando a Bíblia os mantém rigorosamente separados. c. Na forma em que a doutrina é geralmente aceita pelos luteranos, padece de incoerência. Se os atributos divinos são comunicados à natureza humana, a humana também deve ser comunicada à divina. E se alguns atributos são comunicados, todos devem ser comunicados. Mas os luteranos evidentemente não se atrevem a ir tão longe e, daí, param a meio caminho. d. É incoerente com a descrição do Cristo encarnado durante o tempo da Sua humilhação, como a vemos nos evangelhos. Não é esta a descrição de um homem onipresente e onisciente. As explicações luteranas desta incoerência não lograram recomendar-se à mente da igreja em geral e nem mesmo a alguns dos seguidores de Lutero. e. Virtualmente destrói a encarnação. Os luteranos distinguem entre a encarnatio e a eximinitio (entre a encarnação e o esvaziamento). O Logos só está sujeito à primeira. Ele torna a natureza humana receptiva para a habilitação da plenitude da Divindade e lhe comunica alguns dos atributos divinos. Mas, ao fazê-lo, virtualmente abroga a natureza humana, assimilada pela divina. Assim, só a natureza divina permanece. f. Essa doutrina também oblitera a distinção entre o estado de humilhação e o estado de exaltação. Brenz chega a dizer que esses estados não são sucessivos, mas, sim, estados que coexistiram durante a vida terrena de Cristo. Para escapar à dificuldade aqui, os luteranos produziram a doutrina da exinanitio, cujo sujeito é, não o Logos, mas o Deus e homem, no sentido de que Ele praticamente se esvaziou, ou pôs de lado os atributos divinos. Alguns falavam de um uso constante, mas secreto, desses atributos, e outros falavam de um uso intermitente deles. (Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.321)