sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

OS ESTADOS DE CRISTO

I. O Estado de Humilhação A. Introdução: A Doutrina dos Estados de Cristo em Geral. 1. DISTINÇÃO ENTRE ESTADO E CONDIÇÃO. Deve-se ter em mente que, embora a palavra “estado” às vezes seja usada como um sinônimo de “condição”, aquela palavra aplicada a Cristo neste contexto denota uma relação, e não uma condição.Em geral se pode distinguir entre estado e condição como segue: Estado é uma posição ou categoria ou “status” na vida, e particularmente a relação forense da pessoa com a lei, enquanto que condição é o modo de existência da pessoa, especialmente como determinado pelas circunstancias da vida. Quem é achado culpado num tribunal de justiça acha-se num estado de culpa ou condenação, e a isto geralmente se segue uma condição de encarceramento com toda a resultante provação e vergonha. Na teologia, os estados do Mediador são geralmente considerados como incluindo as condições resultantes. De fato, os diferentes estágios de humilhação e de exaltação, como normalmente são expostos, têm a tendência de fazer com que as condições sobressaiam mais proeminentemente que os estados. Todavia, os estados são mais fundamentais que as condições, e assim devem ser considerados. No estado de humilhação Cristo estava sob a lei, não só como regra de vida, mas também como a condição da aliança das obras e a pena pelo pecado. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 326)

A DOUTRINA DOS ESTADOS DE CRISTO NA HISTÓRIA

A doutrina dos estados de Cristo realmente data do século dezessete, embora já se encontrassem indícios dela nos escritos dos reformadores, e mesmo em alguns dos chamados pais da igreja primitivos. Desenvolveu-se primeiro entre os luteranos, quando procuravam harmonizar a sua doutrina da communicatio idiomatum com a humilhação de Cristo como retratada nos evangelhos, mas logo foi adotada também pelos reformados (calvinistas). Divergiam, porém, quanto ao real sujeito dos estados. De acordo com os luteranos, o sujeito é a natureza humana de Cristo, mas de acordo com os reformados é a pessoa do Mediador. Havia considerável diferença de opinião sobre o assunto, mesmo entre os luteranos. Sob a influência de Schleiermacher, a idéia dos estados do Mediador desapareceu gradativamente da teologia. Por sua tendência panteizante, as linhas de demarcação entre a criatura foram praticamente obliteradas. Mudou-se a ênfase do Deus transcendente para o Deus imanente; e o Deus soberano, cuja lei é o padrão do direito, desapareceu. Na verdade, a idéia de direito objetivo foi banida da teologia, e em tais condições tornou-se impossível sustentar a idéia de uma posição judicial, isto é, de um estado de mediador. Além disso, na medida em que a humanidade de Cristo foi salientada a ponto de ser excluída a Sua divindade, e por um lado foi negada a Sua preexistência e, por outro lado, a sua ressurreição, toda e qualquer alusão à humilhação e exaltação de Cristo perdeu seu sentido. O resultado é que em muitas obras atuais de dogmática, buscamos em vão um capítulo sobre os estados de Cristo. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 327)

NÚMERO DOS ESTADOS DO MEDIADOR

Há diferença de opinião quanto ao numero dos estados do Mediador. Alguns opinam que, se admitirmos que a pessoa do Mediador é o sujeito dos estados, a lógica estrita exigirá que falemos de três estados ou modos de existência: o estado preexistente do Ser divino e eterno, o estado terreno de existência humana temporal e o estado celeste de exaltação e glória. Mas, desde que só podemos falar da humilhação e exaltação da pessoa de Cristo em relação a Ele como o Deus homem, é melhor falar de dois estados somente. Os teólogos reformados (calvinistas) vêem uma antecipação da humilhação e da exaltação de Cristo em Seu estado preexistente: de Sua humilhação, em que Ele se incumbiu espontaneamente, no pactum salutis (aliança de redenção), de merecer e administrar a nossa salvação; e de Sua exaltação, na glória que Ele, na qualidade de nosso Mediador prospectivo, gozava antes de encarnação, cf. Jo 17.5. Os dois estados estão claramente indicados em 2 Co 8.9; Gl 4.4,5; Fp 2.6-11; Hb 2.9. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 327)

O ESTADO DE HUMILHAÇÃO

Com base em Fp 2.7, 8, a teologia reformada (calvinista) distingue dois elementos na humilhação de Cristo, a saber, (1) a kenósis (esvaziamento, exinanitio), que consiste em renunciar Ele à Sua majestade do supremo Governador do universo, e assumir a natureza humana na forma de um servo; e (2) a tapeinosis (humiliatio), que consiste em haver-se Ele feito sujeito às exigências e à maldição da lei, e em toda a Sua vida ter-se feito obediente em ações e em sofrimento, até ao próprio limite de uma morte ignominiosa. Com base na referida passagem de Filipenses, pode-se dizer que o elemento essencial e central do estado de humilhação acha-se no fato de que Ele, que era o Senhor de toda a terra, o supremo Legislador, colocou-se debaixo da lei para desincumbir-se das Suas obrigações federais e penais a favor do Seu povo. Ao fazê-lo, Ele se tornou legalmente responsável por nossos pecados e sujeitos à maldição da lei. Este estado do Salvador, concisamente expresso nas palavras de Gl 4.4, “nascido sob a lei”, reflete-se na condição que lhe é correspondente e que é descrita nos vários estágios da humilhação. Enquanto a teologia luterana fala em nada menos que oito estágios da humilhação de Cristo, a teologia reformada geralmente enumera cinco, a saber: (1) encarnação; (2) sofrimento); (3) morte; (4) sepultamento; e (5) descida ao hades. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 327)

A ENCARNAÇÃO E O NASCIMENTO DE CRISTO

Sob este título geral, vários pontos merecem atenção. a. O sujeito da encarnação. Não foi o trino Deus, mas a segunda pessoa da Trindade que assumiu a natureza humana. Por essa razão, é melhor dizer que o Verbo se fez carne, do que dizer que Deus se fez homem. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que cada uma das pessoas divinas agiu na encarnação, Mt 1.20; Lc 1.35; Jo 1.14; At 2.30; Rm 8.3; Gl 4.4; Fp 2.7. Quer dizer também que a encarnação não foi uma coisa que simplesmente aconteceu com o Logos, mas foi uma ativa realização da parte dele. Ao se falar de encarnação em distinção do nascimento do Logos, dá-se ênfase à Sua participação ativa neste fato histórico, e se pressupõe a Sua preexistência. Não é possível falar da encarnação de alguém que não teve existência prévia. Esta preexistência é claramente ensinada na Escritura: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”, Jo 1.1. “eu desci do céu”, Jo 6.38. “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos”, 2 Co 8.9. “pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens”, Fp 2.6, 7. “Vindo, pois, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho”, Gl 4.4. O preexistente Filho de Deus assume a natureza humana e se reveste de carne e sangue humanos, um milagre que ultrapassa o nosso limitado entendimento. Isto mostra claramente que o infinito pode entrar em relações finitas, e de fato entra, e que, de algum modo, o sobrenatural pode entrar na vida histórica do mundo. b. A necessidade da encarnação. Desde os dias do escolasticismo, tem-se debatido a questão sobre se a encarnação deve ser considerada como envolvida na idéia da redenção, ou como já envolvida na idéia da criação. Popularmente exposta, a questão era se o Filho de Deus poderia ter vindo em carne mesmo que o homem não tivesse caído em pecado. Rupert de Deutz foi o primeiro a afirmar clara e positivamente que Ele se encarnaria independentemente do pecado. Seu conceito foi compartilhado por Alexandre de hales e Duns Scotus, mas Tomaz de Aquino tomou a posição de que a razão da encarnação está na entrada do pecado no mundo. Os reformadores partilham este conceito, e as igrejas da Reforma ensinam que a encarnação foi tornada necessária pela queda do homem. Contudo, alguns especialistas luteranos e reformados (calvinistas), como Osiander, Rothe, Dorner, Lange, Van Oosterzee, Martensen, Ebrad e Westcott, tinham a opinião contrária. Os argumentos aduzidos por eles eram como se segue: Um fato estupendo como a encarnação não pode ser contingente, e não pode ter a sua causa no pecado como um ato acidental e arbitrário do homem. Deve ter sido incluído no plano original de Deus. A religião anterior e posterior à Queda não pode ser essencialmente diferente. Se é necessário um Mediador agora, deve ter sido necessário também antes da Queda. Além disso, a obra realizada por Cristo não se limita à expiação e às suas operações salvíficas. Ele é o mediador, mas também o Chefe, a Cabeça; é n!ao somente o arché (princípio), mas também o telos (fim) da criação, 1 Co 15.45-47; Ef 1.10, 21-23; 5.31, 32; Cl 1.15-17. Todavia, deve-se notar que a escritura invariavelmente representa a encarnação como condicionada pelo pecado humano. Não se pode eliminar facilmente a força de passagens como Lc 19.10; Jo 3.16; Gl 4.4; 1 Jo 3.8; Fp 2.5-11. A idéia às vezes expressa de que a encarnação era em si mesma conveniente e necessária para Deus, pode levar à noção panteísta de uma auto-revelação eterna de Deus no mundo. A dificuldade ligada ao plano de Deus, dificuldade que se supõe pesar sobre este conceito, não existirá se considerarmos o assunto sub specie aeternitatis (na perspectiva da eternidade). Não há senão um só plano de Deus, e este plano inclui, desde o início último, o pecado do homem e a encarnação do Verbo. Em última análise, como é natural, a encarnação, como também toda a obra de redenção, dependia, não do pecado, mas do beneplácito de Deus. Não é preciso negar que Cristo tem também significação cósmica, mas esta não se acha ligada à Sua significação redentora, em Ef 1.10, 20-23; Cl 1.14-20. c. A mudança efetuada na encarnação. Quando se nos diz que o Verbo se fez carne, não significa que o Verbo deixou de ser o que era antes. Quanto ao Seu Ser essencial, o Logos era exatamente o mesmo, antes e depois da encarnação. O verbo egeneto, em Jo 1.14 (o Verbo se fez carne), certamente não significa que o Logos se transformou em carne, alterando assim a Sua natureza essencial, mas simplesmente que Ele contraiu aquele caráter particular, que Ele adquiriu uma forma adicional, sem de modo algum mudar a Sua natureza original. Ele continuou sendo o infinito e imutável Filo de Deus. Ademais, a afirmação de que o Verbo se fez carne não significa que Ele se revestiu de uma pessoa humana, nem, por outro lado, que Ele apenas se revestiu de uma pessoa humana, nem, por outro lado, que Ele apenas se revestiu de um corpo humano. A palavra sarx (carne) aqui denota a natureza humana, que consiste de corpo e alma. A palavra é empregada num sentido um tanto similar em Rm 8.3; 1 Tm 3.16; 1 Jo 4.2; 2 Jo 7 (comp. Fp 2.7). d. A encarnação fez de Cristo um membro da raça humana. Em oposição aos ensinos dos anabatistas, a nossa Confissão afirma que Cristo assumiu a Sua natureza humana da substancia da Sua mãe. A opinião predominante entre os anabatistas era que o Senhor trouxe do céu a Sua natureza humana, e que Maria foi apenas o conduto ou canal pelo qual a natureza humana passou. Segundo este conceito, a Sua natureza humana foi realmente uma nova criação, semelhante à nossa, mas não organicamente ligada à nossa. Logo se verá a importância de opor-nos a esse conceito. Se a natureza humana de Cristo não derivou do mesmo tronco que a nossa, mas apenas se assemelhou a ela, não existe aquela relação entre nós e Ele que é necessária para tornar a Sua mediação eficaz para o nosso bem. e. A encarnação efetuada por uma concepção sobrenatural e um nascimento virginal. A nossa Confissão afirma que a natureza de Cristo foi “concebida no ventre da bendita virgem Maria pelo poder do Espírito Santo, sem o concurso do homem”. Isto salienta o fato de que o nascimento de Cristo absolutamente não foi um nascimento comum, mas, sim, um nascimento sobrenatural, em virtude do qual Ele foi chamado “Filho de Deus”. O elemento mais importante, com relação ao nascimento de Jesus, foi a operação sobrenatural do Espírito Santo, pois só por este meio foi possível o nascimento virginal. A Bíblia se refere a esta característica em Mt 1.18-20; Lc 1.34, 35; Hb 10.5. A obra do Espírito Santo concernente à concepção de Jesus foi dupla: (1) Ele foi a causa eficiente do que foi concebido no ventre de Maria, e assim excluiu a atividade do homem como fator eficiente. Isso está em completa harmonia com o fato de que a pessoa que nasceu não era uma pessoa humana, mas a pessoa do Filho de Deus que, como tal, não estava incluída na aliança das obras e estava livre da culpa do pecado. (2) Ele santificou a natureza humana de Cristo logo no início, e assim a manteve livre da corrupção do pecado. Não podemos dizer exatamente como pó Espírito realizou esta obra santificadora, porque até hoje não se sabe bem como a corrupção do pecado passa ordinariamente de pai para filho. Deve-se notar, porém, que a influencia santificante do Espírito Santo não se limitou à concepção de Jesus, mas teve continuidade por toda a Sua vida, Jo 3.34; Hb 9.14. Foi somente pela sobrenatural concepção de Cristo que Ele pôde nascer de uma virgem. A doutrina do nascimento virginal baseia-se nas seguintes passagens da Escritura: Is 7.14; Mt 1.18, 20; Lc 1.34, 35, e também é favorecida por Gl 4.4. Esta doutrina foi confessada na igreja desde os primeiros tempos. Já a encontramos mas formas originais da confissão apostólica e, posteriormente, em todas as grandes confissões das igrejas protestantes e do catolicismo romano. Sua rejeição atual não se deve à falta de provas bíblicas, nem à falta de sanção eclesiástica, mas à corrente aversão geral pelo sobrenatural. As passagens da Escritura em que se baseia a doutrina são simplesmente repudiadas com bases críticas que estão longe de convincentes; e isso a despeito do fato de que a integridade das narrativas está comprovadamente fora e além de contestação; e se admite gratuitamente que o silêncio dos outros escritores do Novo testamento com relação ao nascimento virginal prova que eles nada saibam do suposto fato do nascimento virginal prova que eles nada sabiam do suposto fato do nascimento miraculoso. Todas as espécies de tentativas engenhosas são feitas para explicar como o conto do nascimento virginal surgiu e conquistou aceitação geral. Alguns buscam a explicação nas tradições dos hebreus, outros, nas dos gentios. Não podemos entrar numa discussão deste problema aqui, e, portanto, meramente nos reportamos a obras como as seguintes: Marchen, The Virgin Birth of Christ (O nascimento Virginal de Cristo); Orr, The Virgin Birth of Christ; Sweet, The Birth and Infancy of Jesus Christ (O Nascimento e a Infância de Jesus Cristo); Cooke, Did Paul Know the Virgin Birth? Será que Pulo Sabia do nascimento Virginal?), Knowling, The Virgin Birth. Às vezes perguntam se o nascimento virginal é matéria de importância doutrinária. Brunner declara que não tem o mínimo interesse pelo assunto. Ele rejeita a doutrina do nascimento milagroso de Cristo e sustenta que foi puramente natural, mas não está suficientemente interessado em defender extensamente a sua opinião. Além disso, ele diz: “A doutrina do nascimento virginal teria sido abandonada há muito tempo, não fosse o fato de, ao que parece, haver interesses dogmáticos preocupados com a sua manutenção”. Barth reconhece o milagre do nascimento virginal, e vê nele um sinal do fato de que Deus estabeleceu criadoramente um novo princípio condescendendo em fazer-se homem. Ele vê também no nascimento virginal importância doutrinária. Segundo ele, a “herança do pecado”é transmitida pelo pai, de modo que Cristo pode assumir a “criaturidade” nascendo de Maria e, ao mesmo tempo, escapar da “herança do pecado”pela eliminação do pai humano. Em resposta à indagação se o nascimento virginal tem importância doutrinária, pode-se dizer que é inconcebível que Deus fizesse Cristo nascer desse modo tão extraordinário, se isto não atendesse a algum propósito. Pode-se expor o seu propósito doutrinário como se segue: (1) Era mister que Cristo se constituísse o Messias e o messiânico Filho de Deus. Conseqüentemente, era necessário que Ele nascesse de mulher, mas também que não fosse fruto da vontade do homem, mas nascesse de Deus. O que é nascido da carne é carne. Com toda a probabilidade, este maravilhoso nascimento de Jesus estava na mente de João quando ele escreveu o que está em Jo 1.13. (2) Se Cristo fosse gerado por um homem, seria uma pessoa humana, incluída na aliança das obras, e, como tal, partilharia da culpa comum da humanidade. Mas, visto que o Seu sujeito, o Seu ego, a Sua pessoa, não provém de Adão, Ele não está na aliança das obras e está livre da culpa do pecado. E estando livre da culpa do pecado, a Sua natureza também pôde ser mantida livre da corrupção do pecado, antes e depois do Seu nascimento. f. A encarnação propriamente dita, uma parte da humilhação de Cristo. Será a encarnação uma parte da humilhação de Cristo, ou não? Os luteranos, com a sua distinção entre a incarnatio e a exinanitio, negam que o seja, e baseiam a sua negação no fato de que a humilhação de Cristo limitou-se à Sua existência terrena, ao passo que a Sua humanidade continua no céu. Ele tem ainda a sua natureza humana e todavia, não se acha mais num estado de humilhação. Havia alguma diferença de opinião sobre este ponto mesmo entre os teólogos reformados (calvinistas). Ao que parece, esta questão deve ser resolvida com discriminação. Pode-se dizer que a encarnação, totalmente no abstrato, o mero fato de que Deus em Cristo assumiu a natureza humana, apesar de ser um ato de condescendência, não foi em si mesma uma humilhação, embora Kuyper ache que foi. Mas certamente constitui humilhação o fato de o Logos assumir a “carne”, isto é, a natureza humana como esta é desde a Queda, enfraquecida e sujeita ao sofrimento e à morte, embora isenta da mancha do pecado. Isto parece estar implícito em passagens como Rm 8.3; 2 Co 8.9; Fp 2.6, 7. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 331)

OS SOFRIMENTOS DO SALVADOR

Vários pontos devem ser salientados com relação aos sofrimentos de Cristo. a. Ele sofreu durante toda a Sua vida. Em vista do fato de que Jesus começou a falar dos Seus sofrimentos vindouros quando já se aproximava o fim da Sua vida, muitas vezes somos inclinados a julgar que as Suas agonias finais constituem os Seus sofrimentos completos. Contudo, toda a Sua vida foi uma vida de sofrimentos. Foi uma vida de servo, a do Senhor dos Exércitos, a vida do único ser humano sem pecado, na diária companhia de pecadores, e a vida do Santo num mundo amaldiçoado pelo pecado. O caminho da obediência foi para Ele, ao mesmo tempo, um caminho de sofrimento. Ele sofreu com as repetidas investidas de Satanás, com o ódio e a incredulidade do Seu povo, e com a perseguição dos Seus inimigos. Visto que Ele pisou sozinho o lagar, a Sua solidão só tinha que ser deprimente e o Seu senso de responsabilidade, esmagador. Seu sofrimento foi um sofrimento consagrado, e cada vez mais atroz, conforme o fim se aproximava. O sofrimento iniciado na encarnação, chegou finalmente ao clímax na passio magna (grande paixão) no fim da Sua vida. Foi quando pesou sobre Ele toda a ira de Deus contra o pecado. b. Sofreu no corpo e na alma. Houve tempo em que a atenção geral se fixava exclusivamente nos sofrimentos corporais do Salvador. Não foi uma simples dor física, como tal, que constitui a essência do Seu sofrimento, mas essa dor acompanhada de Angústia de alma e da consciência mediatária do pecado da humanidade que pesava sobre Ele.l mais tarde se tornou costumeiro subestimar a importância dos sofrimentos corporais, uma vez que achavam que, a natureza espiritual, só podia ser expiado por sofrimentos puramente espirituais. Esses conceitos unilaterais devem ser evitados. Tanto o corpo como a alma foram afetados pelo pecado, e a punição tinha que atingir ambos. Além disso, a Bíblia ensina claramente que Cristo sofreu em ambos. Ele agonizou no jardim, onde a Sua alma esteve “profundamente triste até a morte”, e também Ele foi esbofeteado, açoitado e crucificado. c. Seus sofrimentos resultaram de várias causas. Em última análise, todos os sofrimentos de Cristo resultaram do fato de que Ele tomou o lugar dos pecadores vicariamente. Mas podemos discernir várias causas próximas, como: (1) O fato de que Ele , que era o Senhor do Universo, teve que ocupar uma posição subalterna, sim, a posição de servo cativo, ou escravo, e Aquele que tinha inerentemente o direito de exercer mando, ficou com a obrigação de obedecer. (2) O fato de que Aquele que era puro e santo, teve que viver numa atmosfera pecaminosa e corrupta, diariamente na companhia de pecadores, e os pecados do Seus contemporâneos constantemente O lembravam da enormidade da culpa que pesava sobre Ele. (3) Sua perfeita noção e clara antecipação, desde o início da Sua vida, dos sofrimentos extremos que, por assim dizer, o esmagariam no fim. Ele sabia exatamente o que estava para vir, e a perspectiva estava longe de ser animadora. (4) Finalmente, também as privações da vida, as tentações do diabo, o ódio e rejeição do povo, e os maus tratos e perseguições a que esteve sujeito. d. Seus sofrimentos foram únicos. Às vezes falamos dos sofrimentos “ordinários” ou “comuns” de Cristo quando pensamos naqueles sofrimentos que resultaram das causas ordinárias das misérias do mundo. Mas devemos lembrar-nos de que essas causas são muito mais numerosas para o Salvador que para nós. Além disso, mesmo estes sofrimentos comuns tinham um caráter extraordinário no caso dele, e, portanto, foram únicos, singulares. A Sua capacidade para o sofrimento era proporcional ao caráter da Sua humanidade, à Sua perfeição ética e ao Seu senso de justiça, santidade e verdade. Ninguém poderia sentir como Jesus sentia a dureza da dor, da tristeza e do mal moral. Mas, além destes sofrimentos mais comuns, havia também os sofrimentos causados pelo fato de que Deus fez com que as nossas iniqüidades viessem sobre Ele qual torrente. Os sofrimentos do Salvador não eram puramente naturais, mais também o resultado de uma ação positiva de Deus, Is 53.6, 10. Juntamente com os sofrimentos mais extraordinários do Salvador devem ser computadas as tentações no deserto e as agonias no Getsêmani e no Gólgota. e. Seus sofrimentos nas tentações. As tentações de Cristo são parte integrante dos Seus sofrimentos. Essas tentações se acham na vereda do sofrimento, Mt 4.1-11 (e paralelas); Lc 22.28; Jo 12.27; Hb 4.15; 5.7,8. Seu primeiro público iniciou-se com um período de tentação, e mesmo após esse período as tentações se repetiam, a intervalos, culminando no trevoso Getsêmani. Só penetrando empaticamente nas provações dos homens em suas tentações, Jesus poderia ser o Sumo Sacerdote compassivo que foi e atinge as culminâncias da perfeição provada e triunfante, Hb 4.15; 5. 7-9. Não podemos pôr em dúvida a realidade das tentações de Jesus como o último Adão, por mais difícil que seja conceber que alguém que não podia pecar fosse tentado. Várias sugestões têm sido feitas para dirimir a dificuldade, como, por exemplo, que na natureza humana de Cristo, como na do primeiro Adão, havia a nuda possibilitas peccandi, a possibilidade puramente abstrata de pecar (Kuyper); que a santidade de Jesus era santidade ética, que tinha que se desenvolver altamente por meio da tentação e em meio a esta manter-se (bavinck); e que as coisas com as quais Cristo foi tentado eram em si mesmas perfeitamente legítimas, e exerciam atração sobre instintos e apetites perfeitamente naturais (Vos). Mas, a despeito disso tudo, permanece o problema: Como foi possível que Aquele que, in concreto,isto é, como Ele era realmente constituído, não podia pecar, não podia sequer ter alguma inclinação para pecar, e, não obstante esteve sujeito a verdadeira tentação? (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 333)

MORTE DO SALVADOR

Os sofrimentos do Salvador culminaram finalmente em Sua morte. Neste contexto devemos dar ênfase aos seguintes pontos: a. A extensão da Sua morte. É simplesmente natural que, quando falamos da morte de Cristo neste contexto, temos em mente primeiro e acima de tudo a morte física, isto é, a separação de corpo e alma. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que isto não esgota a idéia da morte apresentada na Escritura. A Bíblia faz uma conceituação sintética da morte, e considera a morte física apenas como uma das suas manifestações. A morte é a separação de Deus, mas esta separação pode ser vista de duas maneiras diversas. O homem se separa de Deus pelo pecado, e a morte é o resultado natural, de modo que até se pode dizer que o pecado é a morte. Mas não dessa maneira que Jesus se tornou sujeito à morte, visto que Ele não tinha nenhum pecado pessoal. Com relação a isto, deve-se ter em mente que a morte não é meramente a conseqüência natural do pecado, mas é, acima de tudo, a punição do pecado, punição judicialmente imposta e infligida. É a ação pela qual Deus se retira do homem com todas as bênçãos de vida e felicidade, e visita o homem com ira. É segundo este ponto de vista judicial que se deve considerar a morte de Cristo. Deus impôs judicialmente a sentença de morte ao Mediador, desde que Este se incumbiu voluntariamente de cumprir a pena do pecado da raça humana. Uma vez que Cristo assumiu a natureza humana com todas as suas fraquezas, como ela existe desde a Queda, e assim se fez semelhante a nós em todas as coisas, com a exceção única do pecado, segue-se que a morte operou nele desde o princípio e se manifestou em muitos dos sofrimentos aos quais Ele esteve sujeito. Ele era um homem de dores e sabia o que é padecer. O catecismo de Heidelberg diz acertadamente que “todo o tempo em que Ele viveu na terra, mas especialmente no fim da Sua vida, Ele suportou, no corpo e na alma, a ira de Deus contra o pecado de toda a raça humana”. Estes sofrimentos foram seguidos por Sua morte na cruz. Mas isso não foi tudo; Ele esteve sujeito, não somente à morte física mas também à morte eterna, se bem que sofreu esta intensiva, e não extensivamente, quando agonizou no jardim e quando bradou na cruz, “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” Num curto período de tempo, Ele suportou a ira infinita contra o pecado até o fim, e saiu vitorioso. Isto somente Lhe foi possível graças à sua natureza exaltada. Neste ponto, porém, devemos resguardar-nos contra algum entendimento errôneo. No caso de Cristo, a morte eterna não consiste numa abrogação da união do Logos com a natureza humana, nem num abandono da natureza divina por parte de Deus, nem em retirar o pai o Seu divino amor ou o Seu beneplácito da pessoa do mediador. O Logos permaneceu unido à natureza humana, mesmo quando o corpo estava no túmulo; a natureza divina absolutamente não podia ser desamparada por Deus; e a pessoa do Mediador foi e continuou sendo sempre objeto do favor divino. A morte eterna revelou-se na consciência humana do Mediador como um sentimento do desamparo de Deus. Isto implica que a natureza humana perdeu por um momento divino, bem como a percepção do amor divino, e esteve dolorosamente cônscia da plenitude da ira divina que pesava sobre ela. Contudo, não houve desespero, pois, mesmo na hora mais trevosa, enquanto exclama que está desamparado, dirige Sua oração a Deus. b.O caráter judicial de Sua morte. Era deveras essencial que Cristo não sofresse morte natural, nem acidental, e que não morresse pelas mãos de um assassino, mas sob sentença judicial. Ele tinha que ser contado com os transgressores e condenado como criminosos. Além disso, Deus dispôs providencialmente que o Mediador fosse julgado e sentenciado por um juiz romano. Os romanos tinham talento para a lei e a justiça, e representavam o poder judicial mais alto do mundo. Poder-se-ia esperar que o julgamento perante um juiz romano serviria para demonstrar claramente a inocência de Jesus, o que de fato aconteceu, para que ficasse absolutamente claro que Ele não foi condenado por nenhum crime cometido por Ele. Isto dá testemunho do fato de que, como diz o Senhor, Ele “foi cortado da terra dos viventes; por causa da transgressão do meu povo foi ele ferido”. E quando o juiz romano, não obstante, condenou o inocente, ele é verdade, também se condenou a justiça humana como ele a aplicara, mas, ao mesmo tempo, impôs sentença a Jesus na qualidade de representante do mais elevado poder judicial do mundo, exercendo as suas funções pela graça de Deus e ministrando a justiça em nome de Deus. A sentença de Pilatos foi também sentença de Deus, embora sobre bases inteiramente diferentes. É também significativo que Jesus não foi decapitado, nem mortalmente apedrejado. A crucificação não era uma forma judaica de castigo, mas, sim, romana. Era considerada tão infame e ignominiosa, que não podia ser aplicada a cidadãos romanos, mas somente à escória da humanidade, aos escravos e criminosos mais indignos. Sofrendo esse tipo de morte, Jesus satisfez as extremas exigências da lei. Ao mesmo tempo, padeceu morte amaldiçoada, e assim provou que se fez maldição por nós, Dt 21.23; Gl 3.13. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 335)

O SEPULTAMENTO DO SALVADOR

Poderia parecer que a morte de Cristo foi o derradeiro estágio da Sua humilhação, principalmente em vista de uma das suas últimas palavras na cruz: “Está consumado”. Mas, com toda a probabilidade, esse pronunciamento se refere ao Seu sofrimento ativo, isto é, ao sofrimento no qual Ele teve parte ativa. Este de fato se consumou quando Ele morreu. É evidente que o Seu sepultamento também fez parte de Sua humilhação. Note-se especialmente o seguinte: (a) Voltar o homem ao pó, do qual fora tomado, é descrito na escritura como parte da punição do pecado, Gn 3.19; (b) Diversas declarações da escritura implicam que a permanência do Salvador na sepultura foi uma humilhação, Sl 16.10; At 2.27, 31; 13.34, 35. Foi uma descida ao hades, em si mesmo sombrio e lúgubre, lugar de corrupção, se bem que ele foi guardado da corrupção; (c) Ser sepultado é ir para baixo, e, portanto, uma humilhação. O sepultamento dos cadáveres foi ordenado por Deus para simbolizar a humilhação do pecador. Há um certo acordo entre os estágios da obra objetiva de redenção e a ordem da aplicação subjetiva da obra de Cristo. A Bíblia fala do pecador sendo sepultado com Cristo. Pois bem, isso tem que ver com o despojamento do homem velho, e não do revestimento do novo, cf. Rm 6.1-6. Conseqüentemente, o sepultamento de Jesus também faz parte da Sua humilhação. Além disso, o sepultamento de Jesus não serve apenas para provar que Jesus estava realmente morto, mas também para remover os terrores do sepulcro para os remidos e santifica-lo para eles. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 335)

A DESCIDA DO SALVADOR AO HADES

a. Esta doutrina na Confissão Apostólica (Credo). Depois de mencionar os sofrimentos, a morte e o sepultamento do Senhor, a Confissão prossegue com estas palavras: “Desceu ao inferno (hades)”. Esta afirmação não é um artigo tão antigo nem tão universal do Credo como os demais. Foi usada pela primeira vez na forma do Credo de Aquiléia (cerca de 390 A. D.), “descendit in inferna”. Entre os gregos, alguns traduziram “inferno” por “hades”, e outros por “partes inferiores”. Algumas formas de Credo, nas quais se acham essas palavras, não mencionam o sepultamento e omitem a descida ao hades. Rufino observa que elas contêm a idéia da descida nas palavras “foi sepultado”. Mais tarde, porém, a forma romana do Credo acrescentou o artigo em questão após sua menção do sepultamento. Calvino argumenta acertadamente que para aqueles que as acrescentaram após a expressão “foi sepultado”, elas só tinham que denotar uma coisa adicional. Deve-se ter em mente que essas palavras não se acham na escritura, e não se baseiam em proposições diretas da Bíblia como se dá com os restantes artigos do Credo. b. Base Bíblica para a expressão. Há especialmente quatro passagens que entrarão em consideração aqui. (1) Ef. 4.9, “Ora, que quer dizer subiu, senão que também havia descido até às regiões inferiores da terra? Os que procuram apoio nesta passagem tomam a expressão “regiões inferiores da terra” como equivalente de “hades”. Mas esta é uma interpretação duvidosa. O apóstolo argumenta que a subida de Cristo pressupõe uma descida. Ora, o oposto da ascensão é a encarnação, cf. Jo 3.13. Daí, a maioria dos comentadores entende que a expressão se refere simplesmente à terra. A expressão pode derivar de Sl 139.15 e se refere mais particularmente à encarnação. (2) 1 Pe 3.18, 19, que fala de Cristo como estando “morto, sim, na carne, mas vivificado no espírito, no qual também foi e pregou aos espíritos em prisão”. Supõe-se que esta passagem se refere à descida ao hades e visa a declarar o propósito dessa descida. O espírito ali referido é então entendido como sendo a alma de Cristo, e a pregação mencionada terá que ter tido lugar entre a Sua morte e a Sua ressurreição. Mas, tanto uma coisa como a outra são impossíveis. O Espírito mencionado não é a alma de Cristo, mas o Espírito vivificante, e foi com esse mesmo Espírito que dá vida que Cristo pregou. A interpretação comum que os protestantes fazem desta passagem é que, no Espírito, Cristo pregou por meio de Noé aos desobedientes que viveram antes do dilúvio, que eram espíritos em prisão quando Pedro escreveu, podendo ele, pois, denomina-los desse modo. Bavinck considera isso insustentável e interpreta a passagem como se referindo à ascensão, que ele considera uma rica, triunfante e poderosa pregação aos espíritos em prisão. (3) 1 Pe 4.4-6, particularmente o versículo 6, redigido como segue: “Pois, para este fim foi o evangelho pregado também a mortos, para que, mesmo julgados na carne segundo os homens, vivam no espírito segundo Deus”. Neste contexto o apóstolo admoesta os leitores a que não vivam o restante de suas vidas na carne para as luxúrias dos homens, mas para a vontade de Deus, mesmo que com isso ofendam os seus ex-companheiros e sejam ultrajados por eles, visto que eles terão que prestar contas dos seus feitos a Deus, que está pronto a julgar os vivos e os mortos. Os “mortos” a quem o Evangelho foi pregado, evidentemente não estavam mortos ainda quando ouviram a sua pregação, visto que o propósito dessa pregação era, em parte, que fossem “julgados na carne segundo os homens”. Isso só poderia acontecer durante a vida deles na terra. Com toda a probabilidade, o escritor se refere aos mesmos espíritos dos quais fala no capítulo anterior. (4) Sl 16.8-10 (comp. At 2.25-27, 30, 31). É especialmente o versículo 10 que entra em consideração aqui: “Pois não deixarás a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção”. Desta passagem Pearson conclui que a alma de Cristo esteve no inferno (hades) antes da ressurreição, pois se nos diz que ela não foi deixada lá. Mas devemos notar o seguinte: (a) A palavra nephesh (alma) é muitas vezes empregada no hebraico pelo pronome pessoal, e sheol, pelo estado de morte. (b) Se entendermos assim essas palavras aqui, teremos um claro paralelismo sinonímico. A idéia expressa seria a de que Jesus não foi deixado sob o poder da morte. (c) Isso está em perfeita harmonia com a interpretação feita por Pedro em At 2.30, 31, e por Paulo em At 13.34, 35. Em ambos os casos o Salmo é citado para provar a ressurreição de Jesus. c. Diferentes interpretações da expressão do Credo. (1) A Igreja Católica Romana a entende no sentido de que, após a Sua morte, Cristo foi para o Limbus Patrum (Limbo dos pais), onde os santos do Velho Testamento estavam aguardando a revelação e aplicação da Sua obra redentora, pregou-lhes o Evangelho e os levou para o céu. (2) Os luteranos consideram a descida ao hades como o primeiro estágio da exaltação de Cristo. Cristo foi ao mundo inferior para revelar e consumar a Sua vitória sobre Satanás e sobre os poderes das trevas, e para pronunciar a sentença de condenação deles. Alguns luteranos localizam essa marcha triunfal entre a morte de Cristo e Sua ressurreição; outros, após a ressurreição. (3) A Igreja da Inglaterra sustenta que, enquanto o corpo de Cristo estava no túmulo, a alma foi ao hades, mais particularmente ao paraíso, a habitação das almas dos justos, e lhes fez uma exposição mais completa da verdade. (4) Calvino interpreta a frase metaforicamente, entendendo que se refere aos sofrimentos penais de Cristo na cruz, onde Ele sofreu realmente as angústias do inferno. A interpretação do catecismo de Heidelberg é parecida. Segundo a posição reformada (calvinista) usual, as palavras se referem não somente aos sofrimentos de Cristo na cruz, mas também às agonias do Getsêmani. (5) A Escritura certamente não ensina uma descida literal ao inferno. Além disso, há sérias objeções a esse conceito. Ele não pode ter descido ao inferno quanto ao corpo, pois este se achava no sepulcro. Se Ele desceu realmente ao inferno, só pode ter sido quanto à Sua alma, o que significaria que somente a metade da Sua natureza humana teve participação nesse estágio da Sua humilhação (ou exaltação). Ademais, enquanto Cristo não ressurgisse dos mortos, não teria chegado ainda a ocasião para a marcha triunfal, como os luteranos supõem. E, finalmente, na hora da Sua morte Cristo encomendou Seu espírito ao Seu Pai. Isto parece indicar que Ele esteve passivo, e não ativo, desde a hora da Sua morte até quando saiu do túmulo. De modo geral, parece melhor combinar dois pensamentos: (a) que Cristo sofreu as angústias do inferno antes da Sua morte, no Getsêmani e na cruz; e (b) que Ele adentrou a mais profunda humilhação do estado de morte. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Como o estado e a condição se relacionavam reciprocamente, no caso de Adão, quando ele caiu? 2. E no caso do verbo fazendo-se carne? 3. Como eles se relacionam, na redenção dos pecadores? 4. O estado e a condição da pessoa sempre se correspondem um ao outro? 5. Como se deve definir o estado de humilhação? 6. O que Kuyper quer dizer quando distingue entre status generis e o status modi (os estados de espécie e de dimensão)? 7. Que estágios ele distingue no estado de humilhação? 8. Há alguma prova bíblica do nascimento virginal, excluindo-se os evangelhos segundo Mateus e Lucas? 9. Quais são os sustentáculos doutrinários desta doutrina? 10. As teorias da origem mítica da idéia do nascimento virginal foram considerados adequadas? 11. Que entendemos pela sujeição de Cristo à lei? 12. Em que relação legal fica Ele como Mediador durante a Sua humilhação? 13. A natureza humana de Cristo era inerentemente sujeita à lei da morte? 14. A morte eterna, no caso de Cristo, inclui todos os elementos que estão incluídos na morte eterna, no caso de Cristo, incluiu todos os elementos que estão incluídos na morte eterna dos pecadores? 15. Como se pode conceber o sepultamento do Salvador, como prova de que Ele realmente morreu? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA:Bavinck, Geref. Dogm.III, p. 455-469; Kuyper, Dict. Dogm., De Christo II, p. 59-108; ibid., De Vleeschowording des Woordes; Hodge, Syst. Theol, II, p. 612-625; Shedd, Dogm. Theol., p. 330-348; McPherson, Chr. Dogm., p. 321-326; Litton, Introd. To Dogm. Theol.,p. 175-191; Pieper, Christl. Dogm.II, p. 358-378; Schimid., Doct. Theol. Of the Ev. Luth.Church., p.383-406; Valentine, Chr. Theol. II, p. 88-95; Heppe, Dogm. Der ev. – ref. Kirche, p. 351-356; Ebrard, Christl. Dogm. II, p. 189-226; Mastricht, Godgeleerdheit II, p. 601-795; Synopsis Purioris, p. 262-272; Turrentino, Opera, Locus XIII, perg. IX-XVI; Marchen, The Virgin Birth of Christ; Orr, The Virgin Birth of Chist; Sweet, The Birth and Infancy of Jesus Christ; Cooke, Did Paul Konow the Virgin Birth? Knowling, The Virgin Birth; Barth, Credo, p. 62-94; Brunner, The Mediator, p. 303-376. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 338)

Diferentes interpretações da expressão do Credo

(1) A Igreja Católica Romana a entende no sentido de que, após a Sua morte, Cristo foi para o Limbus Patrum (Limbo dos pais), onde os santos do Velho Testamento estavam aguardando a revelação e aplicação da Sua obra redentora, pregou-lhes o Evangelho e os levou para o céu. (2) Os luteranos consideram a descida ao hades como o primeiro estágio da exaltação de Cristo. Cristo foi ao mundo inferior para revelar e consumar a Sua vitória sobre Satanás e sobre os poderes das trevas, e para pronunciar a sentença de condenação deles. Alguns luteranos localizam essa marcha triunfal entre a morte de Cristo e Sua ressurreição; outros, após a ressurreição. (3) A Igreja da Inglaterra sustenta que, enquanto o corpo de Cristo estava no túmulo, a alma foi ao hades, mais particularmente ao paraíso, a habitação das almas dos justos, e lhes fez uma exposição mais completa da verdade. (4) Calvino interpreta a frase metaforicamente, entendendo que se refere aos sofrimentos penais de Cristo na cruz, onde Ele sofreu realmente as angústias do inferno. A interpretação do catecismo de Heidelberg é parecida. Segundo a posição reformada (calvinista) usual, as palavras se referem não somente aos sofrimentos de Cristo na cruz, mas também às agonias do Getsêmani. (5) A Escritura certamente não ensina uma descida literal ao inferno. Além disso, há sérias objeções a esse conceito. Ele não pode ter descido ao inferno quanto ao corpo, pois este se achava no sepulcro. Se Ele desceu realmente ao inferno, só pode ter sido quanto à Sua alma, o que significaria que somente a metade da Sua natureza humana teve participação nesse estágio da Sua humilhação (ou exaltação). Ademais, enquanto Cristo não ressurgisse dos mortos, não teria chegado ainda a ocasião para a marcha triunfal, como os luteranos supõem. E, finalmente, na hora da Sua morte Cristo encomendou Seu espírito ao Seu Pai. Isto parece indicar que Ele esteve passivo, e não ativo, desde a hora da Sua morte até quando saiu do túmulo. De modo geral, parece melhor combinar dois pensamentos: (a) que Cristo sofreu as angústias do inferno antes da Sua morte, no Getsêmani e na cruz; e (b) que Ele adentrou a mais profunda humilhação do estado de morte. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Como o estado e a condição se relacionavam reciprocamente, no caso de Adão, quando ele caiu? 2. E no caso do verbo fazendo-se carne? 3. Como eles se relacionam, na redenção dos pecadores? 4. O estado e a condição da pessoa sempre se correspondem um ao outro? 5. Como se deve definir o estado de humilhação? 6. O que Kuyper quer dizer quando distingue entre status generis e o status modi (os estados de espécie e de dimensão)? 7. Que estágios ele distingue no estado de humilhação? 8. Há alguma prova bíblica do nascimento virginal, excluindo-se os evangelhos segundo Mateus e Lucas? 9. Quais são os sustentáculos doutrinários desta doutrina? 10. As teorias da origem mítica da idéia do nascimento virginal foram considerados adequadas? 11. Que entendemos pela sujeição de Cristo à lei? 12. Em que relação legal fica Ele como Mediador durante a Sua humilhação? 13. A natureza humana de Cristo era inerentemente sujeita à lei da morte? 14. A morte eterna, no caso de Cristo, inclui todos os elementos que estão incluídos na morte eterna, no caso de Cristo, incluiu todos os elementos que estão incluídos na morte eterna dos pecadores? 15. Como se pode conceber o sepultamento do Salvador, como prova de que Ele realmente morreu? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA:Bavinck, Geref. Dogm.III, p. 455-469; Kuyper, Dict. Dogm., De Christo II, p. 59-108; ibid., De Vleeschowording des Woordes; Hodge, Syst. Theol, II, p. 612-625; Shedd, Dogm. Theol., p. 330-348; McPherson, Chr. Dogm., p. 321-326; Litton, Introd. To Dogm. Theol.,p. 175-191; Pieper, Christl. Dogm.II, p. 358-378; Schimid., Doct. Theol. Of the Ev. Luth.Church., p.383-406; Valentine, Chr. Theol. II, p. 88-95; Heppe, Dogm. Der ev. – ref. Kirche, p. 351-356; Ebrard, Christl. Dogm. II, p. 189-226; Mastricht, Godgeleerdheit II, p. 601-795; Synopsis Purioris, p. 262-272; Turrentino, Opera, Locus XIII, perg. IX-XVI; Marchen, The Virgin Birth of Christ; Orr, The Virgin Birth of Chist; Sweet, The Birth and Infancy of Jesus Christ; Cooke, Did Paul Konow the Virgin Birth? Knowling, The Virgin Birth; Barth, Credo, p. 62-94; Brunner, The Mediator, p. 303-376. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 338)

O SUJEITO E A NATUREZA DO ESTADO DE EXALTAÇÃO

Como já foi indicado anteriormente, há diferença de opinião entre a teologia luterana e a reformada (calvinista) sobre o sujeito dos estados de Cristo Aquela nega que o Logos seja o sujeito dos estados de humilhação e de exaltação, e afirma que a natureza humana de Cristo o é. Daí, os luteranos excluem a encarnação da humilhação de Cristo, e sustentam que a humilhação consiste em “que Cristo, por algum tempo, renunciou (verdadeira e realmente, mas livremente) ao exercício pleno da majestade divina, que a Sua natureza humana tinha adquirido na união pessoal, e, como um homem de baixa condição, suportou o que estava muito abaixo da majestade divina (para que pudesse sofrer e morrer pro amor do mundo)”. Eles afirmam que o estado de exaltação se tornou manifesto primeiramente ao mundo inferior, na descida ao hades, e depois a este mundo, na ressurreição e na ascensão, completando-se com o assentar-se às destra de Deus. A exaltação consiste, pois, em que a natureza humana assumiu o pleno exercício dos atributos divinos que lhe foram comunicados na encarnação, mas que foram usados só ocasional ou secretamente. A teologia reformada, por outro lado, considera a pessoa do mediador, isto é, o Deus e homem, como o sujeito da exaltação, mas acentua o fato de que, naturalmente, foi na natureza humana que se realizou a exaltação. A natureza divina não é passível de humilhação ou exaltação. A natureza divina não é passível de humilhação ou exaltação. Na exaltação o homem, Jesus Cristo, (a) retirou-se de sob a lei em seus aspectos federais e penais, e, conseqüentemente, de sob o fardo da lei como condição da aliança das obras, e de sob a maldição da lei; (b) permutou a relação penal com a lei pela relação justa, e como Mediador entrou na posse das bênçãos da salvação que Ele mereceu para os pecadores; e (c) foi coroado com a correspondente honra e glória. Tinha que aparecer também em Sua condição que a maldição do pecado foi suspensa. Sua exaltação foi também Sua glorificação. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 339)

A EXALTAÇÃO DE CRISTO, ESCRITURÍSTICA E RACIONAL

Há abundantes provas escriturísticas da exaltação de Cristo. A narrativa dos evangelhos nos mostra claramente que a humilhação de Cristo foi seguida por Sua exaltação. A passagem clássica que prova a última acha-se em Fp 2.9-11: “pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para a glória de Deus pai”. Mas, em acréscimo, a esta, há várias outras, como , Mc 16.19; Lc 24.26; Jo 7.39; At 2.33; 5.31; Rm 8.17, 34; Ef 1.20; 4.10; 1 Tm 3.16; Hb 1.3; 2.9; 10.12. Há uma estreita relação entre os dois estados. O estado de exaltação deve ser considerado como resultado judicial do estado de humilhação. Em Sua capacidade de mediador, Cristo satisfez as exigências da lei, em seus aspectos federal e penal, cumprindo a pena do pecado e merecendo a vida eterna. Portanto, tinha que seguir-se a Sua justificação e tinha quer Lhe ser dada posse da recompensa. Visto que Ele foi uma pessoa pública e realizou a Sua obra publicamente, a justiça exigia que a exaltação também fosse matéria pública. A exaltação de Cristo tem tríplice significação. Cada um dos estágios foi uma virtual declaração de Deus, de que Cristo satisfez as exigências da lei e, portanto, fez jus à Sua recompensa. Os dois primeiros estágios tiveram ainda um sentido exemplar, visto que simbolizavam o que sucederia na vida dos crentes. E, finalmente, todos os quatro estágios estavam destinados a servir de meios conducentes à perfeita glorificação dos crentes. (Berkhof, L – Teologia Sistemática pg. 340)

domingo, 17 de fevereiro de 2013

O ESTADO DE EXALTAÇÃO NA TEOLOGIA LIBERAL MODERNISTA

Naturalmente,teologia liberal modernista não toma conhecimento de nenhum estado de exaltação na vida de Cristo. Não somente rejeita completamente a idéia legal dos estados de Cristo, mas também repudia todo o sobrenatural da vida do Salvador. Rauschenbusch encerra a sua Teologia para o Evangelho Social (Theology for the Social Gospel) com uma discussão sobre a morte de Cristo. Diz Macintosch que “as dificuldades para a aceitação da noção tradicional comum da ‘ressurreição’ de Jesus como uma reanimação do corpo morto, sua transformação miraculosa e sua final ascensão ao ‘céu’ são, para o hábito de pensamento científico, praticamente insuperáveis... Um peso de prova não aliviado, ainda está sobre os que afirmam que ele (o corpo de Cristo) não sofreu desintegração, como os corpos de todos os outros que morreram”. Beckwith admite que a Bíblia, particularmente Paulo, fala da exaltação de Cristo, mas diz: “se traduzirmos a noção que Paulo tinha da exaltação para o seu equivalente moderno, vê-lo-emos dizendo que Cristo é superior a todas as forças do universo e a todas as ordens conhecidas de seres racionais, mesmo as mais elevadas, executando-se unicamente o Pai”. E George Burman Foster declara francamente: “segundo a ortodoxia, o Filho de Deus pôs de lado sua glória divina e depois a retomou; ele alienou de si mesmo certas qualidades divinas, e depois as reintegrou. O que significa no fundo é bom, a saber, que o grande e misericordioso Seus nos serve, e não é demasiado bom para ser o nosso alimento diário. Talvez a forma ortodoxa da doutrina tenha sido necessária quando a doutrina foi excogitada, mas esse ser terrível, o homem moderno, nada pode fazer com ela”. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 340)

NATUREZA DA RESSURREIÇÃO DE CRISTO

A ressurreição de Cristo não constituiu no mero fato de que Ele retornou à vida, dando-se a reunião do corpo e a alma. Se isso fosse tudo que ela envolveu, Cristo não poderia ser chamado “as primícias dos que dormem”, 1 Co 15.20, nem “o primogênito de entre os mortos”, Cl 1.18; Ap 1.5, dando que outros foram devolvidos à vida antes dele. Sua ressurreição consistiu, antes, em que nele a natureza humana, o corpo e a alma, foi restaurada à sua prístina força e perfeição e até mesmo elevada a um nível superior, enquanto que o corpo e a alma foram reunidos num organismo vivo. Da analogia da mudança que, de acordo com a escritura, ocorre no corpo de cada crente na ressurreição geral, podemos deduzir algo quanto à transformação que deve ter-se dado com Cristo. Diz-nos Paulo em 1 Co 15.42-44 que os corpos futuros dos crentes serão incorruptíveis, isto é, não terão possibilidade de sofrer decadência; gloriosos,o que significa que esplenderão de fulgor celestial; poderosos,isto é, cheios de energia e, talvez, de novas faculdades; e espirituais, o que não significa imateriais ou etéreos, mas adaptados aos seus respectivos espíritos, cada corpo sendo um perfeito instrumento do espírito. Da narrativa dos evangelhos, aprendemos que o corpo de Jesus passou por notável mudança, de modo que Ele não podia ser facilmente reconhecido e podia aparecer e desaparecer de repente, de maneira surpreendente, Lc 24.31; 36; Jo 20.13, 19; 21.7; mas era, não obstante, um corpo material e muito real, Lc 24.39. Isto não entra em conflito com 1 Co 15.50, pois “carne e sangue” é uma descrição da natureza em seu atual estado material, mortal e corruptível. Mas a mudança que se dá nos crentes não é somente corpórea, mas também espiritual. Semelhantemente, não houve apenas uma mudança física em Cristo, mas também uma mudança psíquica. Não podemos dizer que ocorreu nele alguma mudança religiosa ou ética; mas Ele foi revestido de novas qualidades, perfeitamente ajustadas ao Seu futuro ambiente celestial. Por intermédio da ressurreição, Ele se tornou o espírito vivificante, 1 Co 15.15. A ressurreição de Cristo tem significação tríplice: (1) Constituiu uma declaração do pai de que o último inimigo tinha sido vencido, a pena tinha sido cumprida, e tinha sido satisfeita a condição em que a vida fora prometida; 2) Foi um símbolo daquilo que estava destinado a suceder aos membros do corpo místico de Cristo em sua justificação, em seu nascimento espiritual e em sua bendita ressurreição futura, Rm 6.4, 5, 9; 8.11; 1 Co 6.14; 15.20-22; 2 Co 4.10, 11, 14; Cl 2.12; 1 Ts 4.14; (3) relacionou-se também instrumentalmente com a justificação, a regeneração e a ressurreição final dos crentes, Rm 4.25; 5.10; Ef 1.20; Fp 3.10; 1 Pe 1.3. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 341)

O AUTOR DA RESSURREIÇÃO

Em distinção dos outros que ressuscitaram dos mortos, Cristo ressurgiu por Seu próprio poder. Ele falou de Si mesmo como a ressurreição e a vida, Jo 11.25, declarou que tinha o poder de entregar a Sua vida e de retoma-la, Jo 10.18, e até predisse que reedificaria o templo do Seu corpo, Jo 2.19-21. Mas a ressurreição não foi uma realização unicamente de Cristo; freqüentemente é atribuída, na escritura, ao poder de Deus em geral, At 2.24; 32; 3.26; 5.30; 1 Co 6.14; Ef 1.20, ou mais particularmente, ao pai, Rm 6.4; Gl 1.1; 1 Pe 1.3. E se a ressurreição pode ser chamada obra de Deus, segue-se que o Espírito Santo também agiu nela, pois todas as opera ad extra (obras divinas externas à Trindade) são obras do Trino Deus. Ademais, em Rm 8.11 isso também está implícito. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 341)

OBJEÇÕES À DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO

Uma grande objeção à doutrina da ressurreição física de Cristo é que após a morte o corpo se desintegra, e as várias partículas das quais se compõe entram na composição doutros corpos – vegetais, animais e humanos. Daí é impossível devolver essas partículas a todos os corpos dos quais, no transcurso do tempo, fizeram parte. Macintosh pergunta: “Que houve com os átomos de carbono, oxigênio, nitrogênio, hidrogênio e outros elementos que compunham o corpo de Jesus?” Ora, admitimos que a ressurreição desafia a sua explicação. É um milagre. Mas, ao mesmo tempo, devemos ter em mente que a identidade de um corpo ressurreto com o corpo que descera à tumba não exige que ambos sejam compostos exatamente das mesmas partículas. A composição dos nossos corpos muda constantemente, e, todavia eles, conservam a sua identidade. Paulo, e, 1 Co 15, sustentava a identidade essencial do corpo que desce à sepultura com aquele que ressuscita, mas também declara enfaticamente que a forma sofre mudança. O que semeia no solo passa por um processo de morte, e depois é vivificado; mas, quanto à forma, o grão que ele enterra não é o mesmo que ele vem a colher no devido tempo. Deus dá a cada semente um corpo que lhe é próprio. É assim também na ressurreição dos mortos. Pode ser que haja algum núcleo, algum germe, que constitui a essência do corpo e preserva a sua identidade. A argumentação de Paulo em 1 Co 15.35-38 parece implicar algo dessa ordem. Deve-se ter em mente que a real, a fundamental objeção à ressurreição, é o caráter sobrenatural desta. O que se interpõe no caminho da sua aceitação não é a falta de prova, mas sim, o dogma fundamental de que os milagres não podem acontecer. Mesmo eruditos modernistas admitem que nenhum fato tem melhor atestado que a ressurreição de Cristo – embora, naturalmente, outros o neguem. Diz o dr. Rasdall: “Fosse o testemunho cinqüenta vezes mais forte do que é, qualquer hipótese seria mais possível do que essa”. Contudo, no presente, muitos cientistas eminentes declaram que não se acham em condições de dizer que os milagres não podem acontecer. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 342)

TENTATIVAS DE EXPLICAR O FATO DA RESSURREIÇÃO, NEGANDO-A

Em sua negação, os anti-supernaturalistas sempre vão contra a narrativa da ressurreição nos evangelhos. A narrativa do túmulo vazio e das aparições de Jesus após a ressurreição apresenta-lhes um desafio, e eles o aceitam e tentam explicar esses fatos sem aceitar o fato da ressurreição. Eis algumas das mais importantes tentativas: (1) Teoria da falsidade. Pretende que os discípulos praticaram fraude deliberada, roubando o corpo do túmulo e depois declarando que o Senhor ressuscitara. Os soldados que vigiavam o sepulcro foram instruídos para fazer circular aquela história, e Celso já recorreu a ela para explicar o túmulo vazio. É claro que esta teoria impugna a veracidade das primeiras testemunhas – os apóstolos, as mulheres, os quinhentos irmãos, e outros. Mas é extremamente improvável que os desanimados discípulos tivesses a coragem de impingir tal falsidade ao mundo hostil. É impossível acreditar que tivessem perseverando em meio aos sofrimentos, com uma crua falsidade como essa. Além disso, só o fato da ressurreição de Cristo. Estas considerações logo levaram ao abandono dessa idéia. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 343)

TEORIA DO DESMAIO

Segundo essa teoria, Jesus não morreu de fato, mas apenas desfaleceu, conquanto se pensasse que Ele estava realmente morto. Mas, naturalmente isto levanta diversas perguntas difíceis de responder. Como se pode explicar que tanta gente se enganou, e que o golpe da lança não matou Jesus? Como é que Jesus, em Seu estado de exaustão, pôde fazer rolar a pedra que tapava o túmulo e depois ir de Jerusalém a Emaús e voltar? Como se explica que os discípulos não O trataram como uma pessoa doente, mas viram nele o poderoso Príncipe da vida? E o que foi feito de Jesus depois disso? Se se eliminar a ressurreição, naturalmente a ascensão também será eliminada. Terá Ele voltado para algum lugar desconhecido, passando em segredo o resto d Sua vida? Tantas são as improbabilidades que pesam sobre essa teoria, que o próprio Strauss a ridicularizava. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 343)

TEORIA DA VISÃO

Esta se apresenta em duas formas: (a) Alguns falam de visões puramente subjetivas. Na excitação do seu estado mental, os discípulos se fixavam tanto no Salvador e na possibilidade do Seu retorno a eles, que por fim pensaram realmente que O viram. A faísca foi lançada pela temperamental e excitável Maria Madalena, e logo a chama se acendeu e se espalhou. Faz tempo que essa teoria vem sendo a favorita, mas ela também está prenhe de dificuldades. Como poderiam surgir essas visões, se os discípulos não esperavam a ressurreição? Como podiam aparecer, quando os discípulos estavam empenhados em suas ocupações comuns, e não estavam entregues à oração ou à mediação? Seria possível o rapto ou êxtase requerido para a produção de visões subjetivas ter começado logo no terceiro dia? Em tais visões, os discípulos não teriam visto Jesus circundando por um halo de glória celestial, ou então exatamente como O tinham conhecido, e desejoso de reatar o companheirismo com eles? Será que alguma vez as visões subjetivas se apresentam simultaneamente a várias pessoas? Como explicar as conversas visionárias? (b) Em vista da extrema fraqueza dessa teoria, alguns eruditos apresentaram uma versão diferente dela. Alegam que os discípulos tiveram visões objetivas reais, miraculosamente enviadas por Deus, para persuadi-los a ir avante com a pregação do Evangelho. Isto de fato evita algumas das dificuldades apresentadas, mas se defronta com outras. Admite o sobrenatural; e, se isso é necessário, pro que não concede a ressurreição, que certamente explica todos os fatos? Além disso, essa teoria nos pede que acreditemos que estas visões enviadas por Deus foram tais, que enganaram os apóstolos. Será que Deus procura realizar os Seus fins por meio de ilusões? (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 343)

TEORIAS MÍTICAS DA RESSURREIÇÃO DE CRISTO

Passou a existir uma nova escola mítica que descarta, ou ao menos dispensa, as teorias da visão e da aparição, e procura explicar a “: lenda” da ressurreição com o auxílio de concepções importadas da babilônia e doutros países orientais pelo judaísmo. Essa escola alega, na somente que a mitologia das antigas religiões orientais contém analogias da narrativa da ressurreição, mas também que essa narrativa é realmente oriunda de mitos pagãos. Essa teoria foi elaborada em várias formas, mas é igualmente infundada, em todas as suas formas. É caracterizada por uma grande arbitrariedade em forjar uma relação da narrativa dos evangelhos com mitos pagãos, e não teve êxito em juntá-los. Além disso, demonstra extrema desconsideração para com os fatos, como se acham na escritura. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 344)

SUPORTE DOUTRINÁRIO DA RESSURREIÇÃO DE CRISTO

Surge a questão: Fará alguma diferença crer na ressurreição física de Cristo ou apenas numa ressurreição ideal? Para a teologia modernista, a ressurreição de Jesus não tem nenhuma importância real para a fé cristã, exceto no sentido de uma sobrevivência espiritual.A crença na ressurreição corporal não é essencial, e pode muito bem ser retirada sem afetar a religião cristã. Barth e Brunner são de diferente opinião. Eles crêem no fato histórico da ressurreição, mas sustentam que, como tal, é matéria da história apenas, com a qual o historiador pode lidar com o máximo da sua capacidade, e não como matéria de fé. O elemento importante é que, na ressurreição, o divino irrompe no curso da história, que nela o incógnito de Jesus é retirado, e Deus se revela. O historiador não pode descrever isto, mas o crente o aceita pela fé. É indubitável que a ressurreição tem suportes doutrinários. Não podemos negar a ressurreição física de Cristo sem impugnar a veracidade dos escritores da escritura, visto que, sem dúvida, eles a descreve como um fato. Quer dizer que afeta a nossa crença na fidedignidade da Escritura. Além disso, a ressurreição de Cristo é descrita como tendo valor de prova. É a prova culminante de que Cristo foi um mestre enviado por Deus (o sinal de Jonas), e de que Ele é o verdadeiro Filho de Deus, Rm 1.4. É também o supremo atestado do fato da imortalidade. Mais importante ainda, a ressurreição entra como um elemento constitutivo da própria essência da obra de redenção e, portanto, do Evangelho. É uma das grandes pedras do alicerce d igreja de Deus. Se, afinal, a obra expiatória de Cristo devia ser eficaz, tinha que terminar, não na morte, mas na vida. Ademais, foi o selo do pai aplicado à obra consumada de Cristo, foi a declaração de que Ele a aceitou. Nela, Cristo saiu de sob a lei. Finalmente, foi Seu ingresso numa nova vida, como ressurreta e exaltada Cabeça da igreja e Senhor universal. Isto O habilitou a fazer aplicação dos frutos da Sua obra redentora. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 344)

A ASSENÇÃO DE CRISTO

A ascensão não aparece nas páginas da escritura de maneira tão patente como se dá com a ressurreição. Deve-se isto provavelmente ao fato de que a ressurreição foi o verdadeiro ponto decisivo da vida de Jesus, e não a ascensão. Em certo sentido pode-se dizer que a ascensão foi o complemento e a consumação da ressurreição. A transição de Cristo para a vida superior na glória começou na ressurreição e foi aperfeiçoada na ascensão. Não significa que a ascensão é destituída de significado independente. Mas, embora as provas bíblicas da ascensão não sejam tão abundantes como as da ressurreição, são mais que suficientes. Lucas a relata duas vezes, Lc 24.50-53 e At 1.6-11. Marcos se refere a ela em 16.19, mas esta passagem é contestada. Jesus falou muitas vezes dela, antes da Sua morte, Jo 6.62; 14.2, 12; 16.5, 10, 17, 28; 17.5; 20.17. Paulo se refere repetidamente a ela, Ef 1.20; 4.8-10; 1 Tm 3.16; e a Epístola aos Hebreus chama a atenção para os eu significado, 1.3; 4.14; 9.24. (Berkhor, L – Teologia Sistemática pg 345)