sexta-feira, 30 de agosto de 2013

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Providência

O teísmo cristão opõe-se tanto a uma deísta separação entre Deus e o mundo como a uma confusão panteísta de Deus com o mundo. Daí, a doutrina da criação é seguida imediatamente pela da providência, na qual se define claramente o conceito bíblico da relação de Deus com o mundo. Apesar de não se achar o termo “providência” na Escritura, a doutrina da providência, não obstante, é eminentemente escriturística. A palavra é derivada do termo latino providentia, que corresponde ao grego pronoia. Estas palavras significam primariamente presciência ou previsão, mas gradativamente adquiriram outros sentidos. A previsão é, de um lado, associada a planos para o futuro e, de outro, à realização concreta desses planos. Assim, a palavra “providência” veio a significar a provisão que Deus faz para os fins do Seu governo, bem como a preservação e governo de todas as suas criaturas. É este o sentido em que em geral é usada atualmente na teologia, mas não é o único sentido em que os teólogos a têm empregado. Turretino define o termo em seu sentido mais amplo, como denotando (1) presciência (pré-conhecimento), (2) predestinação (pré-ordenação), e (3) a eficaz administração das coisas decretadas. No uso geral, porém, hoje se restringe geralmente ao último sentido. Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 158)

A Providência em Geral

1. HISTÓRIA DA DOUTRINA DA PROVIDÊNCIA. Com a sua doutrina da providência a igreja tomou posição contra a noção dos epicureus de que o mundo é governado pelo acaso, e contra a idéia estóica de que ele é governado pelo destino. Desde o início os teólogos assumiram a posição de que Deus preserva e governa o mundo. Contudo, nem sempre tiveram eles uma concepção igualmente absoluta do domínio divino sobre todas as coisas. Devido à estreita conexão em ambas, a história da doutrina da providência segue, no essencial, a da doutrina da predestinação. Os primeiros”pais da igreja”não apresentam idéias definidas sobre o assunto. Em oposição à doutrina estóica do destino e em seu desejo de proteger a santidade de Deus, às vezes eles exageravam na ênfase ao livre arbítrio do homem, e nesse ponto manifestavam a tendência de negar o absoluto governo providencial de Deus com relação às ações pecaminosas. Agostinho tomou a dianteira no desenvolvimento desta doutrina. Contra as doutrinas do destino e do acaso, ele dava ênfase ao fato de que todas as coisas são preservadas e governadas pela soberana, sábia e bondosa vontade de Deus, mas afirmava o domínio de Deus igualmente sobre o bem e sobre o mal que há no mundo. Com a defesa da realidade das causas secundárias, ele salvaguardava a santidade de Deus e mantinha a responsabilidade do homem. Durante a Idade Média houve pouca controvérsia sobre o tema da providência divina. Nem um só concílio expressou-se sobre esta doutrina. O conceito predominante era o de Agostinho, que sujeitava tudo à vontade de Deus. Não significa, porém, que não havia idéias divergentes. O pelagianismo limitava a providência à vida natural, e excluía a vida ética. E os semipelagianos seguiam na mesma direção, conquanto nem todos fossem igualmente longe. Alguns dos escolásticos consideravam a conservação feita por Deus como uma continuação da Sua atividade criadora, enquanto outros faziam uma real distinção entre ambas. Em Tomaz de Aquino a doutrina da providência divina segue em geral a de Agostinho, e sustenta que a vontade de Deus, como determina pelas Suas perfeições, preserva e governa todas as coisas; ao passo que Duns Scotus e nominalistas como Biel e Occam declaravam que tudo depende da vontade arbitrária de Deus. Isso oi uma virtual introdução do governo do acaso. Em geral os reformadores subscreveram a doutrina agostiniana da providência divina, embora diferissem um tanto nos pormenores. Conquanto Lutero cresse na providência geral, ele não dava ênfase à preservação e ao governo divino do mundo em geral, como o fazia Calvino. Ele considerava a doutrina primordialmente em seus suportes soteriológicos. Os socinianos e os arminianos, embora não no mesmo grau, limitavam a providência de Deus salientando o poder independente do homem de tomar a iniciativa na ação e, assim, controlar a sua vida. O domínio do mundo realmente foi tirado das mãos de Deus e dado às mãos do homem. Nos séculos dezoito e dezenove a providência foi virtualmente eliminada por um deísmo que descrevia Deus como tendo-se afastado do mundo após a obra da criação; e por um panteísmo que identificava Deus com o mundo, obliterava a distinção entre a criação e a providência e negava a realidade das causas secundárias. E embora o deísmo possa hoje ser considerado uma coisa do passado, seu conceito do domínio e direção do mundo tem continuidade na posição das ciências naturais, de que o mundo é dominado e dirigido por um férreo sistema de leis. E a teologia liberal moderna, com a sua concepção panteísta da imanência de Deus, também tende a eliminar a doutrina d providência divina. (Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 159)

A IDÉIA DA PROVIDÊNCIA

Pode-se definir a providência como o permanente exercício a energia divina, pelo qual o Criador preserva todas as Suas criaturas, opera em tudo que se passa no mundo e dirige todas as coisas para o seu determinado fim. Esta definição indica que há três elementos na providência, a saber, a preservação (conservatio, sustentatio), a concorrência ou cooperação (concursus, co-operatio), e o governo (gubernatio). Calvino, o Catecismo de Heidelberg e alguns dos dogmáticos mais recentes (Dabney, os Hodge, Dick, Shedd, McPherson) falam de dois elementos apenas, a saber, da preservação e do governo. Não quer dizer, porém, que eles queiram excluir o elemento da concorrência, mas somente que o consideram incluído nos outros dois, indicando a maneira pela qual Deus preserva e governa e mundo. McPherson parece pensar que só alguns dos grandes teólogos luteranos adotaram a divisão tríplice; mas nisto se engana, pois a referida divisão é muito comum nas obras dos dogmáticos holandeses desde o século dezessete (Mastricht, à Marck, De Moor, Brakel, Francken, Kuyper, Bavinck, Vos, Honig). Eles abandonaram a divisão mais antiga porque desejavam dar maior proeminência ao elemento da concorrência, para proteger-se dos perigos do deísmo e do panteísmo. Mas, conquanto distingamos três elementos na providência, devemos lembrar que estes três nunca estão separados, na obra de Deus. Embora a preservação se refira à existência, a concorrência à atividade e ao governo à direção de todas as coisas, jamais se deve entender isso num sentido exclusivo. Na preservação há também um elemento de governo, no governo um elemento de concurso, e no concurso em elemento de preservação. O panteísmo não distingue entre a criação e a providência, mas o teísmo acentua uma dupla distinção: (a) A criação é o chamamento à existência daquilo que antes não existia, enquanto que a providência continua ou faz continuar aquilo que já foi chamado à existência. (b) na criação não pode haver cooperação da criatura com o Criador, mas na providência concorrem a Causa primeira e causas secundárias. A Escritura sempre distingue ambas. (Teologia Sistemática - louis Berkhof. Pg. 160)

CONCEITOS ERRÔNEOS CONCERNENTES À NATUREZA DA PROVIDÊNCIA

a. O erro de limita-la à presciência ou à presciência mais predestinação. Esta limitação acha-se nalguns dos primeiros “pais da Igreja”. Contudo, a verdade é que, quando falamos da providência de Deus, em geral não temos em mente nem Sua presciência nem a predestinação, mas simplesmente a Sua contínua atividade no mundo para a realização do Seu plano. Compreendemos que esta não pode separa-se do Seu decreto eterno, mas também percebemos que se pode e se deve distinguir entre ambos. Muitas vezes têm sido distinguidos como providência imanente e providência transeunte. b. o conceito deísta da providência divina. Segundo o deísmo, o interesse de Deus pelo mundo não é universal, especial e perpétuo, mas tão somente de natureza geral. Ao tempo da criação, Ele infundiu em todas as Suas criaturas certas propriedades inalienáveis, colocou-as sob leis inalteráveis e deixou que cumprissem o seu destino pelos seus próprios poderes inerentes. Entrementes, Ele exerce apenas uma supervisão geral, não dos elementos específicos que aparecem em cena, mas das leis gerais que Ele estabeleceu. O mundo é uma simples máquina que Deus acionou, e de modo nenhum uma nave que Ele pilota dia após dia. Esta concepção deísta da providência é característica do pelagianismo, foi adotada por vários teólogos católicos romanos, foi esposada pelo socinianismo e foi apenas um dos erros fundamentais do arminianismo. Recebeu garbosas vestes filosóficas das mãos deístas do século dezoito e apareceu com novas formas no século dezenove, sob a influência da hipótese evolucionista e das ciências naturais, com sua forte ênfase à uniformidade da natureza como controlada por um inflexível sistema de leis férreas. c. A idéia panteísta da providência divina. O panteísmo não reconhece a distinção que há entre Deus e o mundo. Ou faz absorver-se idealisticamente o mundo em Deus, ou materialisticamente Deus no mundo. Num ou noutro caso, não deixa lugar para a criação e também elimina a providência, no sentido próprio da palavra É verdade que os panteístas falam de providência, mas a sua providência, assim chamada, é simplesmente idêntica ao curso da natureza, e este não é nada mais nada menos que a auto-revelação de Deus, uma auto-revelação que não deixa lugar para a independente operação das causas secundárias, em qualquer sentido da palavra. Segundo este ponto de vista, o sobrenatural é impossível, ou melhor, o natural e o sobrenatural são idênticos, a consciência de livre autodeterminação do homem é uma ilusão, a responsabilidade moral é uma fantasia da imaginação, e a oração e o serviço religioso são supertições. A teologia sempre teve muito cuidado em guardar-se dos perigos do panteísmo, mas durante o século passado esse erro conseguiu entrincheirar-se em muita teologia liberal moderna com disfarce da doutrina da imanência de Deus. (Teologa Sistemática - Louis Berkhof. Pg 161)

OBJETOS DA PROVIDÊNCIA DIVINA

a. Os ensinamentos da Escritura sobre este ponto. A Bíblia ensina claramente o governo providencial de Deus (1) sobre o universo em geral, Sl 103.19; Dn 5.35; Ef 1.11; (2) sobre o mundo físico, Jó 37.5; Sl 104.14; 135.6; Mt 5.45; (3) sobre a criação inferior, Sl 104.21, 28; Mt 6.26; 10.29; (4) sobre os negócios das nações, Jó 12.23; Sl 22.28; 66.7; At 17.26; (5) sobre o nascimento do homem e sua sorte na vida, 1 Sm 16.1; Sl 139. 16; Is 45.5; Gl 1.15, 16; (6) sobre as vitórias e fracassos que sobrevêm às vidas dos homens, Sl 75.6, 7; Lc 1.52; (7) sobre coisas aparentemente acidentais ou insignificantes, Pv 16.33; Mt 10.30; (8) na proteção dos justos, Sl 4.8; 5.12; 63.8; 121.3; Rm 8.23; (9) no suprimento das necessidades do povo de Deus, Gn 22.8, 14; Dt 8.3; Fp 4.19; (10) nas respostas à oração, 1 Sm 1.19; Is 20.5, 6; 2 Cr 33.13; Sl 65.2; Mt 7.7; Lc 18.7, 8; e (11) no desmascaramento e castigo dos ímpios, Sl 7.12, 13; 11.6. b. Providência geral e especial. Geralmente os teólogos distinguem entre providência geral e especial, a primeira indicando o governo de Deus sobre o universo todo, e a última, Seu cuidado de cada parte dele em relação ao todo. Não são duas espécies de providência, mas a mesma providência exercida em duas diferentes relações. Contudo, a expressão “providência especial” pode ter uma conotação mais específica, e nalguns casos se refere ao cuidado especial de Deus por Suas criaturas racionais. Alguns falam até mesmo de uma providência muito especial (providentia especialissima), com referência aos que estão na relação especial de filiação a Deus. Providências especiais são combinações especiais feitas na ordem dos eventos, como na resposta à oração, na libertação de dificuldades, e em todos os casos em que a graça e o socorro vêm, em circunstâncias críticas. c. negação da providência especial. Há os que estão dispostos a admitir uma providência geral, uma administração do mundo sob um sistema fixo de leis gerais, mas negam que haja também uma providência especial segundo a qual Deus se interessa pelos pormenores da história, pelos assuntos da vida humana e particularmente pelas experiências dos justos. Alguns afirmam que Deus é grande demais para interessar-se pelas coisas menores da vida, enquanto outros sustentam que Ele simplesmente não pode faze-lo, desde que as leis da natureza Lhe amarram as mãos e, daí, sorriem significativamente quando ouvem dizer que Deus responde as orações. Agora, não há necessidade de negar a ralação da providência especial com as leis uniformes da natureza constitui um problema. Ao mesmo tempo, é preciso dizer que envolve um conceito muito pobre, superficial e antibíblico de Deus afirmar que Ele se interessa nem pode interessar-se pelos pormenores da vida, não pode responder as orações, nem prestar ajuda em emergências, nem interferir miraculosamente em favor do homem. Um governante que apenas baixasse certos princípios gerais e não desse atenção a particularidades, ou um homem de negócio que não examinasse os pormenores do seu negócio, logo estaria arruinado. A Bíblia ensina que mesmo as menores minúcias da vida pertencem à ordenação de Deus. Em conexão com a questão, se podemos harmonizar a operação das leis gerais da natureza com a providência geral, só podemos indicar o seguinte: (1) As leis da natureza não devem ser descritas como poderes da natureza a governarem absolutamente todos os fenômenos e operações. Elas na verdade não são mais que a descrição humana, por vezes deficiente, da uniformidade na variedade descoberta no modo pelo qual operam as forças da natureza. (2) A concepção materialista das leis da natureza como um sistema entrelaçado e fechado, agindo independentemente de Deus e realmente O impossibilitando de intervir no curso do mundo, é absolutamente errônea. O universo tem uma base pessoal. E a uniformidade da natureza é simplesmente o método ordenado por um ser pessoal em ação. (3) As leis da natureza, assim chamadas, só produzem os mesmos efeitos se todas as condições são as mesmas. Geralmente os efeitos não são resultados de uma força única, mas de uma combinação de forças naturais. Até um homem pode variar os efeitos combinando uma força da natureza com outra ou outras forças, e entretanto cada uma destas forças opera em estrita harmonia com suas leis. E se isto é possível para o homem, é infinitamente mais possível para Deus. Com todos os tipos de combinação, Ele pode levar a efeito os mais variados resultados. (Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 162)

Preservação

1. BASE DA DOUTRINA DA PRESERVAÇÃO. A prova da doutrina da preservação é direta e por dedução. a. Prova direta. A divina preservação de todas as coisas é clara e explicitamente ensinada em diversas passagens da Escritura. As seguintes passagens são apenas algumas das muitas que poderiam ser mencionadas: Dt 33.12, 25-28; 1 Sm 2.9; Ne 9.6; Sl 107.9; 127.1; 145.14, 15; Mt 10.29; At 7.28; Cl 1.17; Hb 1.3. Muito numerosas são as passagens que falam do Senhor preservando o Seu povo. Exemplos: Gn 28.15; 49.24; ex 14.29, 30; Dt 1.30, 31; 2 Cr 20.15, 17; Jó 1,10; 36.7; Sl 31.20; 32.6; 34.15, 17; 37.15, 17, 19, 20; 91.1, 3, 4, 7, 9, 10, 14; 121.3, 4, 7, 8; 125.1, 2; Is 40.11; 43.2; 63.9; Jr 30.7, 8, 11; Ez 34.11, 12, 15, 16; Dn 12.1; Zc 2.5: Lc 21.18; 1 Co 10.13; 1 Pe 3.12; Ap 3.10. b. Prova por dedução. A idéia da preservação divina interfere-se da doutrina da soberania de Deus. Esta só se pode conceber como absoluta; não seria absoluta, porém, se existisse ou acontecesse alguma coisa independentemente da Sua vontade. Só pode ser sustentada com a condição de que todo o universo e tudo que nele há é em seu ser e em sua ação absolutamente dependente de Deus. Infere-se também do caráter dependente da criatura. Uma característica de tudo quanto é criatura é que não pode permanecer existindo em virtude do seu poder inerente. O fundamento do seu ser e da continuidade da sua existência é a vontade do seu Criador. Somente Aquele que criou o mundo pela palavra do Seu poder, pode sustentá-lo por Sua onipotência. (Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 164)

O CORRETO CONCEITO DA PRESERVAÇÃO DIVINA

A doutrina da preservação parte do pressuposto de que todas as substâncias criadas, quer espirituais quer materiais, têm existência real e permanente, distinta da existência de Deus, e só possuem propriedades ativas e passivas derivadas de Deus; e de que os seus ativos têm eficiência real, e não meramente aparente, como causas secundárias, de modo que podem produzir os efeitos que lhe são próprios. Assim, a doutrina protege-se do panteísmo, com a sua idéia de uma criação contínua, que virtualmente, se nem sempre expressamente, nega a existência distinta do mundo e faz de Deus o único agente do universo. Mas não considera essas substâncias criadas como auto-existentes, desde que a auto-existência é propriedade exclusiva de Deus, e todas as criaturas têm o fundamento da sua existência continuada nele, e não em si mesmas. Daí, segue-se que continuam a existir, e não em virtude de um ato meramente negativo de Deus, mas em virtude do exercício positivo e contínuo do poder divino. O poder de Deus acionado para a sustentação de todas as coisas é tão positivo como o poder exercido na criação. A precisa natureza da Sua obra na sustentação de todas as coisas, tanto no ser como no agir é um mistério, embora se possa dizer que, em Suas operações providenciais, Ele se acomoda à natureza das Suas criaturas. Dizemos com Shedd: “No mundo material, Deus age imediatamente nas propriedades e leis materiais e por meio delas. A preservação jamais contra a criação. Deus não viola na providência o que estabeleceu na criação”. A preservação pode ser definida como a obra contínua de Deus pela qual Ele mantém as coisas que criou, juntamente com as propriedades e poderes de que as dotou. (Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 163)

CONCEITOS ERRÔNEOS DA PRESERVAÇÃO DIVINA

A natureza desta obra de Deus nem sempre é compreendida acertadamente. Há duas maneiras de vê-la que devem ser evitadas: (a) Que é puramente negativa. Segundo o deísmo, a preservação divina consiste nisto: que Deus não destrói a obra das Suas mãos. Em virtude da criação, Deus dotou a matéria de certas propriedades, colocou-a sob leis inalteráveis e depois a deixou mover-se por si mesma, independentemente de todo suporte ou direção de fora. Esta é uma representação irracional, irreligiosa e antibíblica. É irracional porque implica que Deus comunicou auto-subsistência à criatura, quando a auto-existência e auto-sustentação são propriedades incomunicáveis, que caracterizam unicamente o Criador. A criatura jamais pode ser auto-sustentadora, mas precisa ser mantida dia a dia pelo poder absoluto do Criador. Daí, não se exigiria um ato positivo de onipotência da parte de Deus para aniquilar existências criadas. Uma simples retirada de suporte naturalmente redundaria em destruição. – Este conceito é irreligioso porque afasta Deus para Tão longe da Sua criação que a comunhão com Ele vem a ser uma impossibilidade prática. A história atesta claramente o fato de que ele invariavelmente quer a morte da religião. – Também é antibíblico, visto que pretende colocar Deus totalmente fora da Sua criação, ao passo que a Bíblia nos ensina em muitas passagens que Ele não é somente transcendente, mas também é imanente nas obras das Suas mãos. (b) Que é uma criação contínua. O panteísmo descreve a preservação como uma criação contínua, de modo que as criaturas ou causas secundárias são entendidas como não tendo existência real ou contínua, mas como emanando em cada momento sucessivo daquele misterioso Absoluto que é a base oculta de todas as coisas. Alguns não panteístas tinham uma idéia parecida da preservação. Descartes lançou as bases para essa concepção, e Malebranche a levou para o mais distante extremo coerente com o teísmo. Até Jonathan Edwards a ensina incidentalmente em sua obra sobre o pecado Original, e assim, perigosamente, quase chega a ensinar panteísmo. Esse modo de entender a preservação não dá lugar às causa secundárias e, portanto, leva necessariamente ao panteísmo. É contrário às nossas intuições originais e necessárias, que nos asseguram que somos causas de ação reais e auto-determinantes e, conseqüentemente, agentes morais. Além disso, fere a raiz mesma da ação livre, da responsabilidade moral, do governo moral e, portanto, da própria religião. Alguns teólogos reformados (calvinistas) também empregam a expressão “criação contínua”, mas com isso não ensinam a errônea doutrina que estamos focalizando. Desejam simplesmente acentuar o fato de que o mundo é mantido pelo mesmo poder que o criou. Em vista do fato de que a expressão está sujeita a ser mal entendida, é melhor evitá-la.(Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 164)

A IDÉIA DA CONCORRÊNCIA DIVINA E SUA PROVA BÍBLICA

a. Definição e explicação. Pode-se definir a concorrência como a cooperação do poder divino com todos os poderes subordinados, em harmonia com as leis pré-estabelecidas de sua operação, fazendo-os agir precisamente como agem. Alguns tendem a limitar a operação da concorrência, no que se refere ao homem, às ações humanas moralmente boas e, portanto, recomendáveis; outros, mais logicamente, estendem-na ações de toda sorte. Deve-se notar logo de início que esta doutrina implica duas coisas: (1) Que as forças da natureza não agem por si mesmas, isto é, simplesmente por seu próprio poder inerente, mas Deus exerce operação imediata em cada ato da criatura. Deve-se sustentar esta verdade em oposição à posição deísta. (2) Que as causas secundárias são reais, e não devem ser consideradas apenas como o poder operativo e Deus. É só com a condição de que as causas secundárias sejam reais que podemos falar com propriedade de uma concorrência ou cooperação da Causa Primeira com as causas secundárias. Deve-se dar ênfase a isto, contra a idéia panteísta de que Deus é o único agente em ação no mundo. b. prova bíblica da concorrência divina. A Bíblia ensina claramente que a providência de Deus pertence, não somente à existência, mas também às ações ou operações da criatura. A verdade geral de que os homens não agem independentemente, mas são governados pela vontade de Deus, transparece em diversas passagens da Escritura. Em Gn 45.5 diz José que foi Deus, e não seus irmãos, que o enviara para o Egito. Em Ex. 4.11, 12 diz o Senhor que Ele será com a boca de Moisés e lhe ensinará o que dizer; e em Js 11.6 Ele dá a Josué a certeza de que o livrará dos inimigos de Israel. Provérbios 21.1 ensina-nos que “assim é o coração do rei na mão do Senhor; este segundo o seu quere, o inclina”; e Esdras 6.22, que o Senhor tinha mudado “o coração do rei da Assíria” para com Israel. Em Dt 8.18 traz-se à memória de Israel o fato de que foi Jeová que lhe deu capacidade para conseguir riqueza. Mais particularmente, a escritura evidencia também que há uma espécie de cooperação divina naquilo que é mau. Conforme 2 Sm 16.11, Jeová mandou Simei amaldiçoar a Davi. Também o Senhor chama à Assíria “cetro da minha ira”, e diz: “A vara em sua mão é o instrumento do meu furo”, Is 10.5. Além disso, Ele pôs um espírito mentiroso na boca dos profetas de Acabe, 1 Rs 22.20-23. 2. ERROS QUE DEVEM DER EVITADOS. Há vários erros contra os quais devemos guardar-nos, em conexão com esta doutrina. a. Que ela consiste meramente numa comunicação geral de poder, sem determinar de forma alguma a ação específica. Os jesuítas, os socinianos e os arminianos sustentam que a concorrência divina é apenas uma cooperação geral e indiferente, de modo que é a causa secundária que dirige a ação ao seu fim particular. Essa cooperação é igualmente comum a todas as causas, estimulando-as à ação, mas de modo inteiramente indeterminado. Embora ative a causa secundária, deixa que esta determine o seu particular tipo e modo de ação. Fosse. Porém, esta situação, estaria no poder do homem frustrar o plano de Deus, e a causa primeira seria subserviente à causa secundária. O homem estaria de posse do governo, e não haveria providência divina. b. Que é de natureza tal, que o homem realiza parte da obra, e Deus realiza também uma parte dela. Às vezes se descreve a cooperação de Deus e o homem como se fosse algo como os esforços conjuntos de um grupo de cavalos tirando juntos, cada qual fazendo a sua parte. Esta é uma visão equívoca da distribuição da obra. De fato, cada realização é, em sua inteireza, tanto uma realização de Deus como da criatura. É uma realização de Deus no sentido de que não há nada que independa da vontade divina, e no sentido de que é determinada, momento a momento, pela vontade de Deus. E é uma realização do homem no sentido de que Deus a leva a efeito por meio da atividade própria da criatura. Há uma interpretação aí, mas nenhuma limitação mútua. c. Que a obra de Deus e a da criatura, na concorrência, são coordenadas. Isto já está excluído, pelo que foi dito no item anterior. A obra de Deus sempre tem prioridade, pois o homem depende de Deus em tudo que faz. A afirmação de Cristo na Escritura: “sem mim nada podeis fazer” aplica-se em todos os campos do esforço humano. A relação exata de ambos fica mais bem demonstrada nas seguintes características da concorrência divina. 3. CARACTERÍSTICAS DA CONCORRÊNCIA DIVINA. a. É prévia e predeterminante, não num sentido temporal, mas, sim, num sentido lógico. Na criatura não há nenhum princípio de atividade autônoma à qual simplesmente juntasse a Sua atividade. Em cada caso, o impulso para a ação e movimento procede de Deus. Tem que haver uma influência da energia divina antes de poder agir a criatura. Deve-se notar particularmente que esta influência não termina na atividade da criatura, mas na criatura mesma. Tudo que há na natureza Deus faz agir e mover-se na direção de um fim predeterminado. Assim, Deus capacita e ajuda as Suas criaturas racionais, como causas secundárias, a funcionar, e isso não apenas dotando-as de energia, de maneira geral, mas dando-lhes energia para certos atos específicos. Ele opera tudo em todos, 1 Co 12.6, e também neste caso, opera tudo conforme o conselho da sua vontade, Ef 1.11. Ele deu a Israel a capacidade de obter riqueza, Dt 8.18, e opera nos crentes tanto o querer como o realizar, segundo a Sua boa vontade, Fp 2.13. Os pelagianos e semipelagianos de todo tipo geralmente se dispõem a admitir que a criatura não pode agir sem um influxo do poder divino, mas sustentam que este não é tão específico que chegue a determinar o caráter da ação de algum modo. b. É também uma concorrência simultânea. Depois de iniciada a atividade da criatura, a vontade eficaz de Deus terá que acompanha-la a todo momento, se é que a referida atividade deva continuar. Não há um só momento em que a criatura aja independentemente da vontade e do poder de Deus. É só nele que vivemos e nos movemos e existimos, At 17.28. Esta atividade divina acompanha a acaso do homem em todo e qualquer ponto, mas sem privar o homem, um ato pelo qual ele é responsabilizado. Esta concorrência simultânea não redunda numa identificação da causa prima com a causa secunda Num sentido muito real, a operação é o produto de ambas as causas. O homem é e continua sendo o verdadeiro sujeito da ação. Bavinck ilustra isto indicando o fato de que a madeira queima, que somente Deus a faz queimar, mas que formalmente esta queima não pode ser atribuída a Deus, mas unicamente à madeira como sujeito da ação de queimar. É evidente que esta ação simultânea não pode ser separada da concorrência prévia e determinante, mas deve ser distinguida dela. Estritamente falando, diversamente da concorrência prévia, a ação simultânea termina, não na criatura, mas em sua atividade. Desde que não termina na criatura, pode, no abstrato, ser interpretada como não tendo quaisquer suportes éticos. Isto explica por que alguns teólogos reformados (calvinistas) limitavam a concorrência prévia às boas ações dos homens, e quanto ao restante, contentavam-se em ensinar uma concordância simultânea. c. Finalmente, é uma concorrência imediata. Em seu governo do mundo, Deus emprega toda sorte de meios para a consecução dos Seus fins; mas não opera deste modo na concorrência divina. Quando destruiu com fogo as cidades da planície, praticou um ato de governo divino sem empregar meios ativos. Mas, ao mesmo tempo, esse ato constituiu Sua concorrência imediata, pela qual habilitou o fogo a cair, queimar e destruir. Assim, também Deus opera no homem, dotando-o de poder, determinando as suas ações e sustentando as suas atividades o tempo todo. 4. A CONCORRÊNCIA DIVINA E O PECADO. Os pelagianos, os semipelagianos e os arminianos levantam séria objeção a esta doutrina da providência. Sustentam eles que uma concorrência prévia, que não seja meramente geral, mas que predetermine o homem a ações específicas, faz de Deus o autor do pecado, por este responsável. Os teólogos reformados (calvinistas) estão bem cientes da dificuldade que aqui se apresenta, mas não se sentem livres para iludi-la negando o absoluto domínio de Deus sobre as livres ações das Suas criaturas morais, visto que a Escritura o ensina claramente, Gn 45.5; 50.19, 20; Êx 10.1, 20; 2 Sm 16.10, 11; Is 10. 5-7; At 2.23; 4.27, 28. Eles se sentem constrangidos a ensinar: (a) que os atos pecaminosos estão sob o governo divino e ocorrem de acordo com a predeterminação e o propósito de Deus, mas somente pela permissão divina, de modo que Ele não leva eficientemente os homens a pecarem, Gn 45.5; 50.20; Êx 14.17; Is 66.4; Rm 9.22; 2 Ts 2.11; (b) que Deus muitas vezes reprime as obras pecaminosas do pecador, Gn 3.6; Jó 1.12; 2.6; Sl 76.10; Is 10.15; At 7.51; e (c) que Deus, no interesse do Seu propósito, dirige o mal para o bem, Gn 50.20; Sl 76.10; At 3.13. Não significa, porém, que todos eles concordam na resposta à questão, se há uma direta, imediata dinamização do poder ativo da criatura, dispondo-a e predeterminando-a eficazmente ao ato específico, e também capacitando-a para praticar aquele ato. Dabney, por exemplo, embora admitindo uma concorrência física na criação inferior, nega-a com relação aos agentes livres. Contudo, a grande maioria a defende também no caso dos seres morais livres. Mesmo Dabney concorda que o governo de Deus sobre todos os atos das Suas criaturas é certo, soberano e eficaz; e, daí, ele tem que enfrentar, juntamente com todos os demais, a questão quanto à responsabilidade de Deus pelo pecado. Dá ele sua conclusão coma seguintes palavras: “É esta, pois, a minha descrição da evolução do propósito de Deus quanto aos atos pecaminosos; de tal modo dispõe e agrupa eventos e objetos em torno de agentes livres por Sua multiforme sabedoria e poder, que cada alma, em cada fase, é posta na presença das circunstâncias que, Ele sabe, serão um induzimento suficiente para que ela se realize, por sua própria atividade natural e livre, exatamente aquilo que se chama plano de Deus. Assim, o ato é somente do homem, conquanto a sua ocorrência seja eficazmente assegurada por Deus. E o pecado é somente do homem. O interesse de Deus pelo pecado é santo, primeiro, porque toda a Sua ação pessoal nos acertos para assegurar a sua ocorrência foi santa; e segundo, os Seus fins e propósitos são santos. Deus não quer o pecado do ato por sua pecaminosidade; mas somente quer o resultado para o qual o pecado é apenas um meio, e esse resultado é sempre digno da Sua santidade”. Contudo, a imensa maioria dos teólogos reformados (calvinistas) sustenta o concurso em questão, e busca a solução da dificuldade fazendo distinção entre a matéria e a forma* do ato pecaminoso, e atribuindo a última exclusivamente ao homem. O concurso divino dinamiza o homem e o determina eficazmente ao ato específico, mas é o homem que dá ao ato a sua qualidade formal e que, portanto, é responsável por seu caráter pecaminoso. De nenhuma destas soluções se pode dizer que satisfaz inteiram,ente, de modo que o problema da relação de Deus com o pecado continua sendo um mistério. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 168)

NATUREZA DO GOVERNO DIVINO

Pode-se definir o governo divino como a continua atividade de Deus pela qual Ele rege todas as coisas teleologicamente a fim de garantir a realização do propósito divino. Este governo não é uma simples parte da providencia divina, mas, como no caso da preservação e da concorrência, é toda ela, mas agora considera sob o ponto de vista do fim para o qual Deus guia todas as coisas da criação, a saber, a gloria do Seu nome. a. É o governo de Deus como o Rei do universo. Nos dias presentes muitos consideram a idéia de Deus como Rei uma noção antiquada do Velho Testamento, e a querem substituir pela idéia neotestamentária de Deus como Pai. A idéia da soberania divina deve dar lugar à do amor divino. Julgar-se que esta se harmoniza com a idéia progressiva de Deus na Escritura. Mas é um erro pensar que a revelação divina, conforme se eleva a níveis mais altos, tenciona fazer com que nos desapeguemos aos poucos da idéia de Deus como de Deus como Rei e a substituamos pela idéia de Deus como Pai. Já vai contra isso a proeminência da idéia do reino de Deus nos ensinos de Jesus. E se se disser que isto envolve apenas a idéia de uma especial e limitada realeza de Deus, pode-se replicar que a idéia da paternidade de Deus nos evangelhos está sujeita às mesmas restrições e limitações. Jesus não ensina uma paternidade universal de Deus. Além disso, o Novo Testamento também ensina a realeza universal de Deus em passagens como Mt 11.25; At 17.24; 1 Tm 1.17; 6.15; Ap 1.6; 19.6. Ele é igualmente Rei e Pai, e é a fonte de toda autoridade no céu e na terra, o Rei dos reis e Senhor dos senhores. b. É um governo adaptado à natureza das criaturas que Ele governa. No mundo físico Ele estabeleceu as leis da natureza, e é por meio dessas leis que Ele exerce o governo do universo físico. No mundo mental Ele exerce o Seu governo mediatamente, por meio das propriedades e leis da mente, e imediatamente, pela direta operação do Espírito Santo. No governo e domínio dos agentes morais Ele faz uso de toda classe de influência moral, como as circunstâncias, os motivos, a instrução, a persuasão e o exemplo, mas também age diretamente, pela operação pessoal do Espírito Santo no intelecto, na vontade e no coração. 2. A EXTENSÃO DESTE GOVERNO. A Escritura declara explicitamente que este governo divino é universal, Sl 22.28, 29; 103.17-19; Dn 4.34, 35; 1 Tm 6.15. É realmente a execução do Seu propósito eterno, abrangendo todas as Suas obras, desde o princípio, tudo que foi, é e será para sempre. Mas, embora geral, desce também a particularidades. As coisas de maior significação, Mt 10.29-31, aquilo que é aparentemente acidental, Pv 16.33, as boas ações dos homens, Fp 2.13, como também as suas más ações, At 14.16 – tudo está sob o governo e direção de Deus. Deus é o Rei de Israel, Is 33.22, mas Ele também domina entre as nações, Sl 47.9. nada pode escapar ao Seu governo. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 169)

Providências Extraordinárias ou Milagres

1. NATUREZA DOS MILAGRES. Usualmente se faz distinção entre providentia ordinária e providentia extraordinária. Na primeira, Deus age por meio de causas secundárias em estrito acordo com as leis da natureza, embora possam variar os resultados, com diferentes combinações. Mas na última Ele age imediatamente ou sem a mediação de causa secundárias, em sua operação ordinária. Diz Mcpherson: “Milagres é uma coisa feita sem se recorrer aos meios ordinários de produção, um resultado produzido diretamente pela Causa Primeira, sem a mediação, pelo menos do modo habitual, das causas secundárias”. A coisa distintamente característica do feito miraculoso é que ele resulta do exercício do poder sobrenatural de Deus. E, naturalmente, isto significa que o referido feito não é ocasionado por causas secundárias que operam segundo as leis da natureza. Se fosse, não seria sobrenatural (acima da natureza), isto é, não seria milagre. Se Deus, na realização de um milagre, algumas vezes utilizou forças que estavam presentes na natureza, utilizou-as de maneira inteiramente distantes do ordinário, para produzir resultados não esperados pelo homem, e foi justamente isso que constitui o milagre. Todo milagre está acima da ordem estabelecida da natureza, mas podemos distinguir diferentes classes, conquanto não graus, de milagres. Há milagres que estão absolutamente acima da natureza, de modo que não estão ligados, de modo algum, a quaisquer meios. Mas também há milagres que são contra media, nos quais os meios são empregados, mas de modo tal, que o resultado é uma coisa completamente diversa do resultado habitual daqueles meios. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 169)

POSSIBILIDADE DE MILAGRES

Há objeções aos milagres, principalmente com base em que eles implicam uma violação das leis da natureza. Alguns procuram fugir à dificuldade presumindo, com Agostinho, que eles são simples exceções da natureza, como a conhecemos, implicando que, se tivéssemos um conhecimento mais completo da natureza, poderíamos explica-los de maneira perfeitamente natural. Mas esta posição é insustentável, desde que pressupõe duas ordens da natureza, mutuamente contrárias. Conforme a primeira, o azeite de botija diminuiria, mas conforme a outra, não diminui; conforme a primeira, os pães foram consumidos gradativamente, mas conforme a outra, multiplicaram-se. É preciso supor, ademais, que um sistema é superior ao outro, pois, se não fosse, haveria tão somente uma colisão e nada resultaria; mas, se o fosse, o que parece é que a ordem inferior aos poucos seria dominada e desapareceria. Além disso, esse conceito priva o milagre do seu caráter excepcional, sendo que os milagres mostram-se como eventos excepcionais da Escritura. Há sem dúvida, uma certa uniformidade na natureza; há leis que governam a operação das causas secundárias no mundo físico. Lembremo-nos, porém, de que elas representam meramente o método usual pelo qual Deus age na natureza. É Sua boa vontade agir de maneira ordenada e por intermédio de causas secundárias. Mas isto não significa que Ele não possa deixar de lado a ordem estabelecida, e não possa produzir um efeito extraordinário, que não resulte de causa naturais, por um ato único de volição, se o julgar desejável para o fim em vista. Quando Deus opera milagres, produz efeitos extraordinários de maneira extraordinária. Quer dizer que os milagres estão acima da natureza. Diríamos também que são contrários à natureza? Houve teólogos reformados (calvinistas) mais antigos que não hesitavam em falar deles como uma ruptura ou uma violação das leis da natureza. Às vezes diziam que, ocorrendo um milagre, a ordem da natureza era suspensa temporariamente, O dr. Bruin acha correta essa maneira dever, e o afirma em sua obra intitulada Het Christelijk Geloof em de Beoefening der Natuurwetenschap, e faz objeção às idéias de Woltjer, Dennert e Bavinck. Mas o acerto dessa terminologia mais antiga pode muito bem ser posta em dúvida. Quando se realiza um milagre, as leis da natureza não são violadas, mas são superadas num determinado ponto por uma superior manifestação da vontade de Deus. As forças da natureza não são anuladas ou suspensas, mas são apenas neutralizadas, num ponto particular, por um poder superior a elas. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 170)

PROPÓSITO DOS MILAGRES DA ESCRITURA.

Pode-se presumir que os milagres da Escritura não foram realizados arbitrariamente, mas, sim, com um propósito definido. Não são meras maravilhas e exibições de poder, destinadas a provocar admiração, mas têm significação revelacional. A entrada do pecado no mundo torna necessária a intervenção sobrenatural de Deus no curso dos eventos, para a destruição do pecado e para a renovação da criação. Foi mediante milagre que Deus nos deu a Sua revelação especial e verbal na escritura, bem como a Sua revelação suprema e fatual em Jesus Cristo. Os milagres estão relacionados com a economia da redenção, uma redenção que com freqüência eles prefiguram e simbolizam. Não visam a uma violação, mas, antes, a uma restauração da obra criadora de Deus. Daí, vemos ciclos de milagres ligados a períodos especiais da história da redenção, e especialmente durante a época do ministério público de Cristo e da fundação da igreja. Estes milagres ainda não resultaram na restauração do universo físico. Mas, no fim dos tempos, haverá outra série de milagres, que redundarão na renovação da natureza, para a glória de Deus – o estabelecimento final do reino de Deus em novo céu e nova terra. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. A doutrina da providência é um articulus purus ou um articulus mixtus? 2. qual foi o primeiro “pai da igreja” a desenvolver esta doutrina? 3. Como diferem Lutero e Calvino, em sua concepção da providência divina? 4. O que explica o fato de que os arminianos aceitam a posição dos socinianos sobre este ponto? 5. Como devemos julgar a asserção de alguns teólogos reformados (calvinistas) de que Deus é a causa única a atuar no mundo? 6. Que são as causas secundárias, e por que é importante sustentar que são causa reais? 7. A doutrina do concurso divino é antagônica à livre ação do homem? 8. Qual a concepção agostiniana dos milagres? 9. Por que é importante afirmar a realidade do miraculoso? 10. Os milagres admitem uma explicação natural? 11. Implicam eles uma suspensão das leis da natureza? 12. Qual a significação especial dos milagres da Bíblia? 13. Poderiam acontecer milagres hoje? 14. Acontecem de fato? 15. que quer dizer dos milagres da Igreja Católica Romana? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. II, p.635-670; Kuyper, Dict. Dogm., De Providentia, p.3-246; Vos, Geref. Dogm. I, De Voorzienigheid; Hodge, Syst. Theol. I, p. 575-636; Shedd, Dogm. Theol. I, p. 527-545; Dabney, Syst. and Polem. Theol., p.276-291; McPherson, Chr. Dogm., p. 174-184; Drummond. Studies in Chr. Doct., p. 187-202; Pope, Chr. Theol. I, p. 437-456; Raymond, Syst. Theol. I, p. 497-527; Valentine, Chr. Theol., p. 363-382; Pieper, Christl. Dogm. I, p. 587-600; Schmidt. Doct. Theol. Of the Ev. Luth. Church, p. 179-201; Dijk, De Voorzienigheid Gods; Mozley, On Miracles; Thomson, The Christian Miracles and the Conclusions of Science; Mead, Supernatural Revelation; Harris, God, Creator and Lord of All, I, p. 519-579; Bruin, Het Christelijke Geloof en de Beoefening der Natuurwetensschap, p. 108-138. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 171)

A Origem do Homem

A. A doutrina do Homem na Dogmática. A transição da teologia para a antropologia, isto é, do estudo de Deus para o estudo do homem, é natural. O homem não é somente a coroa da criação, mas também é objeto de um especial cuidado de Deus. E a revelação de Deis na Escritura é uma revelação dada não somente ao homem, mas na qual o homem é de interesse vital. Não é uma revelação de Deus no abstrato, mas uma revelação de Deus em rela’;cão às Suas criaturas, e particularmente em relação ao homem. É um registro dos procedimentos de Deus par com a raça humana, e especialmente uma revelação da redenção que Deus preparou para o homem e para a qual Deus procura preparar o homem. Isto explica por que o homem ocupa um lugar de central de importância na escritura, e por que o conhecimento do homem em relação a Deus é essencial para entende-la adequadamente. A doutrina do homem deve seguir-se imediatamente à de Deus, dado que o conhecimento dela é pressuposto em todos os subseqüentes loci da dogmática. Não confundamos o presente tema de estudo com a antropologia geral ou ciência da humanidade, que inclui todas as ciências que têm os homens como o objeto de estudo. Estas ciências ocupam-se da origem e história da humanidade, da estrutura fisiológica e das características psíquicas do homem em geral e das várias raças da humanidade em particular, com o seu desenvolvimento etnológico, lingüístico, cultural e religioso, e assim – por diante. A antropologia teológica ocupa-se unicamente do que a Bíblia diz a respeito do homem e da relação em que ele está e deve estar com Deus. Ela só reconhece a Escritura como a sua fonte, e examina os ensinamentos da experiência humana à luz da palavra de Deus. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 172)

Relato Bíblico da Origem do Homem

A Escritura nos oferece um duplo relato da criação do homem, um em Gn 1.26, 27, e outro em Gn 2.7, 21-23. A alta crítica é de opinião que o escritor de Gênesis juntou duas narrativas da criação, a primeira, de Gn 1.1-2. 3, e a segunda, de Gn 2.4-25; e que as duas são independentes e contraditórias. Em sua obra sobre a Doutrina Bíblica do Homem (The Doctrine of Man), Laidlaw dispõe-se a admitir que o autor de Gênesis fez uso de duas fontes, mas se recusa a ver aí dois diferentes relatos da criação. Com muita propriedade, nega que no capítulo dois temos “um diferente relato da criação, pela simples razão de que este não leva em conta a criação em geral”. De fato, as palavras introdutórias da narrativa que começa em Gn 2.4, “Estas são as gerações dos céus e da terra, quando foram criados”,* vistas à luz do repetido uso das palavras, “estas são as gerações” no Livro de Gênesis, indicam o fato de que temos aí algo completamente diverso. A expressão indica invariavelmente, não a origem ou o princípio das pessoas mencionadas, mas a sua história familial. A primeira narrativa contém o relato da criação de todas as coisas na ordem em que ocorreu, enquanto que a segunda agrupa as coisas em sua relação com o homem, sem nada implicar com respeito à ordem cronológica do aparecimento do homem na obra criadora de Deus, e indica claramente que tudo que o precedeu serviu para preparar uma adequada habitação para o homem como o rei da criação. Ela nos mostra como o homem foi colocado na criação, rodeado pelo mundo vegetal e animal, e como ele iniciou a sua história. Há certas particularidades nas quais a criação do homem sobressai, em distinção da dos outros seres vivos:1. A CRIAÇÃO DO HOMEM FOI PRECEDIDA POR UM SOLENE CONSELHO DIVINO. Antes de registrar a criação do homem, o escritor inspirado nos leva de volta, por assim dizer, ao conselho de Deus, pondo-nos em conhecimento do decreto divino com as palavras: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”, Gn 1.26. Geralmente a igreja tem interpretado o plural com base na existência trinitária de Deus. Entretanto, alguns eruditos o consideram como plural de majestade; outros, como plural de comunicação, no qual Deus inclui os anjos juntamente com Ele; e ainda outros, como plural de auto-exortação. Destas três sugestões, a primeira é muito improvável, visto que o plural de majestade originou-se em data muito posterior; a segunda é impossível, porque implicaria que os anjos foram co-criadores com Deus, e que o homem foi criado à imagem dos anjos também, o que é uma idéia antibíblica; e a terceira é uma pressuposição inteiramente gratuita, à qual não se pode atribuir nenhuma razão. Por que uma auto-exortação como essa haveria de ser plural, senão porque há uma pluralidade em Deus? 2. A CRIAÇÃO DO HOMEM FOI, NO SENTIDO MAIS ESTRITO DA PALAVRA, UM ATO IMEDIATO DE DEUS. Algumas das expressões utilizadas na narrativa anterior à da criação do homem, indicam criação mediata, nalgum sentido da palavra. Notem-se as seguintes expressões: “E disse: Produza a terra relva, ervas que dêem semente, e árvores frutíferas que dêem fruto segundo a sua espécie” – “Povoem-se as águas de enxames de seres viventes” – “Produza a terra seres viventes, conforme a sua espécie”, e comparem-se com a simples declaração: “Criou Deus, pois o homem”. Seja qual for a indicação de mediação na obra da criação, contida nas primeiras expressões, falta por completo na última. Evidentemente, a obra de Deus na criação do homem não foi mediata, em nenhum sentido da palavra. Ele fez uso de material preexistente na formação do corpo humano, mas, já na criação da alma, isto foi excluído. 3. EM DISTINÇÃO DAS CRIATURAS INFERIORES, O HOMEM FOI CRIADO CONFORME UM TIPO DIVINO. No que diz respeito aos peixes, às aves e aos animais, lemos que Deus os criou segundo a sua espécie, numa forma típica da deles próprios. O homem, porém, não foi criado assim, e muito menos segundo o tipo de uma criatura inferior. Quanto a ele, disse Deus: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”. Veremos o que isto implica quando discutirmos a condição original do homem, e aqui apenas chamamos a atenção para isso com o fim de expor o fato de que, na narrativa da criação, a criação do homem sobressai como uma coisa distintamente característica. 4. DISTINGUEM-SE CLARAMENTE OS DOIS DIFERENTES ELEMENTOS DA NATUREZA HUMANA. Em Gn 2.7 faz-se clara distinção entre a origem do corpo e a da alma. O corpo foi formado do pó da terra; na sua produção Deus fez uso de material preexistente. Na criação da alma, porém, não houve modelagem de materiais preexistentes, mas a produção de uma nova substância. A alma do homem foi uma nova produção de Deus, no sentido estrito da palavra, Jeová “lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente”. Com estas simples palavras afirma-se a dupla natureza do homem, e o que elas nos ensinam é corroborado por outras passagens da Escritura, como Ec 12.7; Mt 10.28; Lc 8.55; 2 Co 5.1-8; Fp 1.22-24; Hb 12.9. Os dois elementos são o corpo e o sopro ou espírito de vida nele soprado por Deus, e com a combinação dos dois o homem se tornou “alma vivente”, o que neste contexto significa simplesmente “ser vivo”. 5. O HOMEM É IMEDIATAMENTE COLOCADO NUMA POSIÇÃO EXALTADA. O homem é descrito como alguém que está no ápice de todas as ordens criadas. Foi coroado como rei da criação inferior e recebeu domínio sobre todas as criaturas inferiores. Como tal, foi seu dever e privilégio tornar toda natureza e todos os seres criados, que foram colocados sob seu governo, subservientes à sua vontade a o seu propósito, para que ele e todos os seus gloriosos domínios magnificassem o onipotente Criador e Senhor do universo, Gn 1.28; Sl 8.4-9. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 174)

A Teoria Evolucionista da Origem do Homem

Entre as várias teorias que têm sido aventadas para explicar a origem do homem, acha-se atualmente em campo a teoria evolucionista e, portanto, merece breve consideração. 1. EXPOSIÇÃO DA TEORIA. Nem sempre a teoria evolucionistas é exposta da mesma forma. Às vezes é descrita como se o homem fosse um descendente direto de uma das espécies de macacos antropóides atualmente em existência, e então, ainda, como se o homem e os macacos mais desenvolvidos tivessem uma ascendência comum. Mas, qualquer que seja a diferença de opinião existe sobre este ponto, o certo é que, de acordo com o evolucionismo naturalista do momento, o homem descende de animais inferiores, corpo e alma, por um processo completamente natural, dirigido inteiramente por forças inerentes. Um dos princípios mais importantes da teoria é o da rigorosa continuidade entre o mundo animal e o homem. Ela não pode admitir qualquer descontinuidade em nenhum ponto ao longo do curso da evolução, pois toda e qualquer ruptura é fatal para a teoria. Nada que seja absolutamente novo e imprevisível tem que ter estado potencialmente no germe originário, do qual todas as coisas se desenvolveram. E o processo todo tem que ser dirigido, do começo ao fim, por forças inerentes. O evolucionismo teísta, que parece mais aceitável a muitos teólogos, simplesmente considera a evolução como o método de ação de Deus. Às vezes é apresentado numa forma em que Deus é apenas chamado para servir de ponte sobre as lacunas que há entre a criação inorgânica e a orgânica, e entre a criação irracional e racional. Mas, na medida em que se presume uma operação especial de Deus, admite-se a existência de lacunas que a evolução não pode cobrir, e alguma coisa nova é trazida à existência, naturalmente a teoria deixa de ser uma pura teoria evolucionista. Às vezes se afirma que só o corpo humano foi originado por um processo de evolução dos animais inferiores, e que Deus dotou esse corpo de uma alma racional. Esta idéia recebe muito apoio nos círculos católico-romanos. 2. OBJEÇÕES À TEORIA. Várias objeções podem ser levantadas contra a teoria de que o homem descende evolutivamente dos animais inferiores. a. Do ponto de vista do fôlego, a maior objeção a esta teoria é, naturalmente, que é contrária aos explícitos ensinamentos da palavra de Deus. Dificilmente a Bíblia poderia ensinar com mais clareza do que o faz, que o homem é produto de um direto e especial ato criador de Deus, e não de um processo de desenvolvimento de um tronco simiesco de animais. Ela assevera que Deus formou do pó da terra, Gn 2.7. Alguns teólogos, em seu anseio por harmonizar os ensinos da Escritura com a teoria evolucionista, sugerem que isto se interprete no sentido de que Deus formou o corpo do homem do corpo dos animais que, depois de tudo, não passa de pó. Mas isto não tem base nenhuma, visto que não há razão pela qual a expressão geral “do pó da terra” fosse usada depois que o escritor já tinha descrito a criação dos animais e, daí, tornasse mais específica a afirmação. Além disso, esta interpretação também é excluída pela declaração de Gn 3.19, “No suor do rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado: porque tu és pó e ao pó tornarás”.Certamente não significa que o homem retornará ao seu estado animal anterior. Animal e homem igualmente voltarão ao pó, Ec 3.19, 20. Finalmente, em 1.Co 15.39 se diz explicitamente que, “nem toda carne é a mesma; porém uma é a carne dos homens, outra a dos animais”. Quanto ao espírito do homem, a Bíblia ensina explicitamente que ele veio diferentemente de Deus, Gn 2.7, e, portanto, não pode ser considerado como um desenvolvimento natural de alguma substância previamente existente. Em perfeita harmonia com isto, diz Eliú: “O Espírito de Deus me fez; e o sopro do Todo-poderoso me dá vida”, Jó 33.4. Ademais, a Escritura ensina também que o homem ficou de imediato separado da criação inferior por um grande abismo. De imediato fora elevado nível intelectual, moral e religioso, criado que fora à imagem de Deus, e lhe foi dado o domínio sobre a criação inferior, Gn 1.26, 27, 31; 2.19, 20; Sl 8.5-8. Contudo por sua queda, decaiu do seu elevado estado e ficou sujeito a um processo de degeneração que às vezes redunda em bestialidade. Isso é exatamente o oposto do que nos ensina a hipótese evolucionista. Segundo esta, o homem estava no nível mais baixo, ao início da sua carreira, mas ligeiramente afastado dos animais, e desde esse tempo vem subindo a níveis mais altos. b. A segunda grande objeção é que a teoria não tem adequada base em fatos bem estabelecidos. Deve-se ter em mente que, como foi indicado anteriormente, a teoria evolucionista em geral, conquanto muitas vezes apresentada como doutrina firmada, até o presente não passa de uma hipótese em desenvolvimento e não comprovada, uma hipótese que ainda não recebeu nenhuma promessa de sucesso na demonstração daquilo que se propõe provar. Muitos dos mais proeminentes evolucionistas admitem francamente o caráter hipotético da sua teoria. Ainda se confessam firmes crentes na doutrina da linhagem animal do homem, mas não hesitam em dizer que não podem falar com segurança do método de operação da sua hipótese. Quando Darwin publicou as suas obras, pensou-se que afinal fora encontrada a chave do processo, mas ao transcorrer do tempo se viu que a chave não servia na fechadura. Na verdade, Darwin dizia que a sua teoria dependia inteiramente da possibilidade de transmissão dos caracteres adquiridos, e logo veio a ser uma das pedras angulares da teoria biológica de Weissmann que os caracteres adquiridos não são herdados. Sua opinião recebeu abundante confirmação graças aos estudos posteriores da genética. Com base na suposta transmissão de caracteres adquiridos, Darwin falava com grande segurança da transmutação da espécie e vislumbrava uma contínua linha de desenvolvimento da célula primordial ao homem; mas as experiências de De Vries, Mendel e outros tendiam a desacreditar o seu conceito. As mudanças graduais e imperceptíveis de Darwin deram lugar às repentinas e inesperadas mutações de De Vries. Enquanto que Darwin pressupunha variação interminável em diversas direções, Mendel demonstrou que as variações ou mutações nunca retiram o organismo da espécie e estão sujeitas a uma lei definida. E a citologia moderna, em seu estudo da célula, com os seus genes e cromossomos como veículos dos caracteres herdados, confirmou esta idéia. Provou-se que as novas espécies dos evolucionistas, assim chamadas, não eram de modo nenhum espécies verdadeiras, mas apenas espécies alteradas, ou seja, variedades da mesma espécie. Nordenskioeld, em sua História da Biologia (History of Biology), cita a seguinte sentença de um relato popular dos resultados da pesquisa da hereditariedade, como refletindo o verdadeiro estado da questão: “Justamente em razão do grande número de fatos que a moderna pesquisa da hereditariedade trouxe à luz, prevalece atualmente o caos, no que diz respeito aos conceitos sobre a formação de espécies”, p.613. Proeminentes evolucionistas admitem francamente agora, que a origem das espécies é um completo mistério para eles. E, sendo assim, eles não têm muita probabilidade de explicar a origem do homem. Em sua maneira de provar que o homem descende de uma espécie de macacos antropóides, Darwin apoiou-se, (1) no argumento derivado da similaridade estrutural entre o homem e os animais de categoria superior; (2) no argumento embriológico; e (3) no argumento dos órgãos rudimentares. A esses três foram acrescentados posteriormente, (4) o argumento derivado dos testes de sangue; e (5) o argumento paleontológico. Mas nem um só desses argumentos dá a prova desejada. O argumento da semelhança estrutural presume, sem base, que a similaridade soe pode ser explicada de um modo. Todavia, pode muito bem ser explicada pela admissão de que Deus, ao criar o mundo animal, fez certas formas típicas básicas completas, de maneira que se obtivesse unidade na variedade, precisamente como um grande musicista constrói a sua vigorosa composição sobre um único tema, que por vezes é repetido, e a cada repetição introduz novas variações. O princípio da pré-formação* dá uma adequada explicação das variações em foco. A similaridade embriológica, como tal, pode ser explicada com base no mesmo princípio. Além disso, estudos biológicos recentes parecem indicar que o parentesco ou a descendência não pode ser provada por nenhuma similaridade estrutural, mas somente por uma relação genética. No que se refere aos órgãos rudimentares, mais de um cientista expressaram dúvida quanto ao seu valor como testemunhas de vestígios. Em vez de serem restos inúteis de órgãos animais, pode muito bem ser que sirvam a um propósito definido no organismo humano. Os testes de sangue, em sua forma original, embora indicando certa semelhança entre o sangue dos animais e o do homem, não provam que haja uma relação genética, desde que nesses testes só por parte do sangue, o soro estéril, que não contém matéria viva, foi usado, embora seja um fato comprovado que a porção sólida do sangue, que contém matéria viva, foi usado, embora seja um fato comprovado que a porção sólida do sangue, que contém as células vermelhas e brancas, é o veículo dos fatores hereditários. Testes posteriores, em que foi posto em uso o espectroscópio e foi examinado o sangue completo, provaram conclusivamente que há uma diferença essencial entre o sangue dos animais e o do homem. O argumento paleontológico é igualmente inconcluso. Se o homem realmente descende dos macacos antropóides, poder-se-ia esperar que as formas intermediárias ainda existiriam nalgum lugar. Mas Darwin não pôde encontrar esse elo perdido, como também, não pôde achar os milhares de elos perdidos, entre as varias espécies de animais. O que nos dizem é que os primitivos progenitores do homem de há muito desapareceram. Sendo assim, seria possível ainda acha-los entre os fosseis. E de fato alguns cientistas alegam que encontraram alguns ossos de homens muito antigos. Eles reconstituíram para nós esses homens, e podemos divertir-nos olhando as fotos imaginarias do homem de Java reconstituído (Pithecanthropus erectus), do homem de Heidelberg (Homo Hidelbergenis), do homem de Neandertal (Homo Neanderthalensis), do homem de Cro-Magno, do homem de Piltdown, e outros. Parece que essas reconstituições são levadas a serio por alguns, mas realmente elas têm pouco valor. Visto que só foram achados uns poucos ossos de cada um dos referidos homens, e mesmo estes estavam espalhados, nalguns casos, de modo que não há certeza de que pertençam ao mesmo corpo, eles apenas testificam a engenhosidade dos cientistas que os reconstituíram. Casos há em que os especialistas não estão de acordo quanto a se os ossos em questão pertenciam a um homem ou a um animal. O dr. Wood, professor de anatomia da Universidade de Londres, diz num opúsculo sobre a Ascendência do Homem (Ancestry of Man): “Não vejo ocupação menos digna da ciência da antropologia do que a rara atividade de modelar, pintar ou desenhar essas figuras de pesadelo da imaginação, e de lhes emprestar, no processo, um valor completamente falso da realidade evidente”. Fleming, um dos mais proeminentes cientistas dos dias atuais, diz: “A conclusão disso tudo é que não podemos pôr em ordem todos os conhecimentos fósseis do suposto ‘homem’ numa seqüência linear gradualmente progredindo no tipo ou na forma, a partir da forma ou tipo de algum macaco antropóide, ou de outro mamífero, até aos tipos modernos e atualmente existentes do homem verdadeiro. Qualquer suposição ou afirmação de que se pode fazer isso, e de que é verdadeiro, sem duvida é incorreta. É certamente enganoso e indizivelmente pernicioso expor em revistas populares ou noutras publicações lidas por crianças, figuras de gorilas ou chimpanzés rotuladas de ‘primo do homem’ ou ‘parente mais próximo do homem’, ou publicar desenhos inteiramente imaginários e grotescos de um suposto ‘homem de Java’ com rosto selvagem como sendo um antepassado do homem moderno, como ocasionalmente se faz. Os que fazem tais coisas são culpados de ignorância ou de deturpação deliberada dos fatos. Tampouco se justifica que os pregadores nos púlpitos digam às suas igrejas que há acordo geral entre os cientistas quanto à explicação evolucionista da origem do homem, como procedente de um antepassado animal”. Mas não é o corpo humano que apresenta as maiores dificuldades ao evolucionista. Esta surgem da consideração do elemento espiritual do homem, ou daquilo que geralmente se denomina “origem da mente”.É neste ponto que a sua debilidade se torna mais dolorosamente visível. A despeito de todas as suas tentativas, tem falhado notavelmente, não conseguindo dar uma explicação plausível da origem da mente humana, ou da inteligência (progressividade), da língua, da consciência e da religião. Isto poderia ser exposto minuciosamente, mas não o achamos necessário. Há muitos que, como Dennert e Bateson, ainda professam fé na doutrina da descendência humana pela evolução, mas repudiam o método darwiniano de evolução e o consideram pouco menos que um completo fracasso. Todavia, não sabem de nenhum outro método que lhe pudesse tomar o lugar. Quer dizer que, para eles, o evolucionismo deixou de ser uma ciência e passou a ser, uma vez mais, uma simples teoria filosofia. Disse Bateson: “Lemos o seu esquema evolucionista (de Darwin) como leríamos os de Lucrecio e Lamarck. ...Estamos no mesmo ponto em que Boyle estava, no século dezessete”. O testemunho do Dr. D. H. Scott é muito parecido. Num discurso presidencial ante a Associação Inglesa para o Progresso da Ciência (British Association for The Advancemente of Science), ele fez as seguintes declarações: “Tudo está de novo no cadinho. ...Então, será que a evolução não é um fato cientificamente comprovado? Não, não é... É um ato de fé – porque não há alternativa”. Nem se pensa na criação, é claro. Disse ele mais, que há nas ciências naturais “um retorno ao caos pré-darwiniano”. O dr. Flechmann, de Erlangen, escreve: “A teoria darwiniana não tem nem um só fato em que se apoiar...é puro produto da imaginação”. Ainda mais forte é a afirmação do dr, B, Kidd: “O darwinismo é um composto de espantosa presunção e incomparável ignorância”. Cientistas como Fleming, Dawson, Kelly e Price não hesitam em rejeitar a teoria evolucionista e em aceitar a doutrina da criação. A respeito da origem do homem, diz Sir William Dawson: “Nada sei da origem do homem, exceto o que me diz a Escritura – que Deus o criou. Nada sei alem disso, e não conheço ninguém que o saiba”. Diz Fleming: “Tudo que no presente a ciência pode dizer à luz do conhecimento humano limitado, e definitivamente afirmado, é que não sabe como, onde e quando foi originado o homem. Se nos há de chegar algum conhecimento disso, haverá de vir de alguma outra fonte que não a antropologia moderna”. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 179)

A Origem do Homem e a Unidade da Raça

1. TESTEMUNHO ESCRITURÍSTICOS DA UNIDADE DA RAÇA. A Escritura ensina que a humanidade toda descente de um único par. Este é o sentido óbvio dos capítulos iniciais de Gênesis. Deus criou Adão e Eva como os iniciantes da espécie humana, e lhes ordenou que fossem fecundos e se multiplicassem e enchessem a terra. Alem disso, a narrativa subseqüente em Gênesis mostra claramente que as gerações seguintes, até ao tempo do dilúvio, estiveram em ininterrupta relação genética com o primeiro casal, de sorte que araçá humana constitui, não somente uma unidade especifica, uma unidade no sentido de que todos os homens compartem a mesma natureza humana, mas também uma unidade genética ou genealógica. Isso é ensinado também por Paulo em At 17.26, “de um só fez toda raça humana para habitar sobre a face da terra”. A mesma verdade é básica para a unidade orgânica da raça humana na primeira transgressão, e da provisão para a salvação da raça em Cristo, Rm 5.12, 19; 1 Co 15.21, 22. Não se deve entender esta unidade de raça realisticamente, como o faz Shedd, que diz: “A natureza humana é uma substância especifica ou geral criada nos primeiros indivíduos de uma espécie humana e com eles, não ainda individualizada, mas, pela geração ordinária, subdividida em partes, formando estas partes distintas e separados indivíduos da espécie. A substancia una e especifica é, pela programação, metamorfoseada em milhões de substâncias individuais, ou pessoas. Um indivíduo é uma parte fracionaria da natureza humana separada da massa comum e constitui uma pessoa particular, tendo todas as propriedades essenciais da natureza humana”. As objeções a esse conceito serão noutro contexto. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 179)

TESTEMUNHO DA CIÊNCIA EM FAVOR DA UNIDADE DA RAÇA

De varias maneiras a ciência confirma o testemunho da Escritura em prol da unidade da raça humana. Nem sempre os homens de mentalidade cientifica acreditam nisto. Os antigos gregos tinham a sua teoria do autoctonismo, segundo a qual os homens brotaram da terra por uma espécie de geração espontânea, uma teoria que não tem nenhum suporte sólido, visto que a espécie de geração espontânea jamais foi comprovada, mas, antes, desacreditada. Agassiz propôs a teoria dos coadamitas, que presume que houve diferentes centros de criação. Já em 1655 Peyrerius* desenvolve teoria dos pré-adamitas, que parte do pressuposto de que havia homens antes de Adão ser criado. Essa teoria foi revivida por Winchell, que não negava a unidade da raça, mas considerava Adão como o primeiro antepassado dos judeus, e não chefe da raça humana. Em anos recentes, Fleming, sem ser dogmático na matéria, disse haver razoes para supor-se que existiam raças de homens inferiores antes de Adão aparecer em cena por volta de 5500 a.C. Embora inferiores aos adamitas, já tinham capacidades diferentes das dos animais. O homem adâmico posterior foi dotado de capacidades maiores e mais nobres, e provavelmente foi destinado a levar toda a outra humanidade existente à obediência ao Criador. Ele fracassou, não preservando a sua própria fidelidade a Deus e, portanto, Deus providenciou a vinda de um descendente humano e, contudo, muito mais que humano, para que pudesse realizar o que Adão não conseguiu. O conceito que Fleming foi levado a defender é “que o ramo inquestionavelmente caucasiano é tão somente a derivação, pela geração normal, da raça adâmica, a saber, dos membros da raça adâmica que serviam a Deus e que sobreviveram ao dilúvio – Noé e seus filhos e filhas”. Mas essas teorias, todas e cada uma delas, não acham apoio na Escritura, e são contrárias a At 17.26 e a tudo quanto a Bíblia ensina com referência à apostasia e à libertação do homem. Além disso, a ciência apresenta diversos argumentos em favor da unidade da raça humana, como os seguintes: a. O argumento da história. As tradições da raça dos homens apontam decisivamente para uma origem e uma linhagem comuns na Ásia Central. A historia das migrações do homem tende a mostrar que houve uma distribuição partindo de um único centro. b. O argumento da filosofia. O estudo das línguas da humanidade indica uma origem comum. As línguas indo-germânicas* têm em suas raízes um idioma primitivo comum, um velho remanescente do qual ainda existe no sânscrito. Alem disso, há prova que mostra que o antigo idioma egípcio é o elo de ligação entre a língua indo-européia e a semítica. c. O argumento da psicologia. A alma é a parte mais importante da natureza constitucional do homem, e a psicologia revela claramente o fato de que as almas dos homens, quaisquer que sejam as tribos ou nações a que pertençam, são essencialmente idênticas. Têm em comum os mesmos apetites, instintos e paixões animais, as mesmas tendências e capacidade, e, acima de tudo, as mesmas qualidades superiores, as características morais e mentais que pertencem exclusivamente ao homem. d. O argumento das ciências naturais ou da fisiologia. É agora opinião comum dos especialistas em fisiologia comparada, que a raça humana constitui tão somente uma única espécie. As diferenças que existem entre as varias famílias da humanidade são consideradas simplesmente como variedades dessa espécie única. A ciência não assevera positivamente que a raça humana descende de um único par, mas, não obstante, demonstra que pode muito bem ter sido este o caso, e que provavelmente é. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. O que se pode dizer contra a idéia de que temos em Gn 1 e 2 dois diferentes e mais ou menos contraditórios relatos da criação? 2. Parece razoável pensar que o mundo já existia milhões de anos antes do aparecimento do homem em cena? 3. A hipótese do teísmo evolucionista está em harmonia com o relato escriturístico da origem do homem? 4. A noção de que ao menos o corpo do homem provém dos animais é sustentável à luz da Escritura? 5. O evolucionismo comprova os seus argumentos sobre este ponto? 6. O que provou com referencia à questão muito mais difícil da derivação da alma humana? 7. O que acontece com a doutrina da Queda, na teoria evolucionista? 8. Qual o significado teológico da doutrina da unidade da raça humana? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. II, p. 543-565; Hodge, Syst. Theol. II, p. 3-41; Litton, Introd. to Dogm. Theol., p. 107-113; Miley, Syst. Theol. I, p. 355-392; Alexander, Syst. of Bibl. Theol. I, p.156-167; Laidlaw, The Bible Doctrine of man, p. 24-46; Darwin, Descente of man; Drummond, The Ascent of Man; Fleming, The Origen of Mankind; O’Toole, The Case Against Evolution, Parte II, Capítulos II e III. Cf. ainda as obras sobre o evolucionismo mencionadas no capitulo anterior. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 181)