quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Os Atributos Comunicáveis

(Deus como Espírito Pessoal) Se os atributos discutidos no capítulo anterior salientam o absoluto Ser de Deus, os que restam considerar acentuam a Sua natureza pessoal. É nos atributos comunicáveis que Deus se posiciona como Ser moral, consciente, inteligente livre, como Ser pessoal no mais elevado sentido da palavra. A questão se uma existência pessoal combina com as idéias do absoluto se há muito prendeu a atenção dos filósofos, e ainda é objeto de debate. A resposta depende em grande medida do sentido que se atribua à palavra “absoluto”. Na filosofia a palavra tem sido empregada em três sentidos diversos, que podem ser denominados sentidos agnóstico, lógico e causal. Quanto ao sentido agnóstico, o Absoluto é o irrelacionado do qual nada se pode conhecer, uma vez que só se conhecem as coisas em suas relações. E se não se pode conhecer nada dele, não se lhe pode atribuir personalidade. Além disso, desde que não se pode pensar em personalidade desvinculada de relações, não pode ser identificada com um Absoluto que em sua própria essência é o irrelacionado. No Absoluto lógico o individual está subordinado ao universal, e o universal mais elevado é a realidade última. Deste modo é a substância absoluta de Spinoza, como também o espírito absoluto de Hegel. Pode expressar-se no finito e por ele, mas nada que seja finito pode expressar a sua natureza essencial. Atribuir-lhe personalidade seria limitá-lo a um modo de ser, e destruiria o seu caráter absoluto. De fato, tal absoluto ou realidade última é apenas um conceito abstrato e vazio, sem conteúdo nenhum. O conceito causal do Absoluto apresenta-o como o fundamento último de todas as coisas. Não depende de nada que lhe seja alheio, mas faz todas as coisas dependerem dele. Ademais, ele não é necessária e completamente irrelacionado, mas pode entrar em várias relações com as criaturas finitas. Tal concepção do Absoluto não é incoerente com a idéia de personalidade. Além disso, devemos ter em mente que, em sua argumentação, os filósofos sempre estiveram operando com a idéia de personalidade como concretizada no homem, e não viam que, em Deus, a personalidade pode ser infinitamente mais perfeito. Na verdade, personalidade perfeita só se acha em Deus, e o que vemos no homem é apenas uma cópia finita do original. Ainda mais, há uma tripersonalidade em Deus, da qual não se acha analogia alguma nos seres humanos. Para provar a personalidade de Deus têm sido apresentadas provas naturais muito parecidas com as citadas em prol da existência de Deus. (1) A personalidade humana requer um Deus pessoal para sua explicação. O homem não é um ser auto-existente e eterno, mas u ser finito, com princípio e fim. A causa pressuposta deve ser suficiente para explicar totalmente o efeito. Visto que o homem é um produto pessoal, o poder que originou também deve ser pessoal. Doutro modo, existe no efeito alguma coisa superior ao que quer que se ache na causa; e isto seria completamente impossível. (2) O mundo em geral dá testemunho da personalidade de Deus. Em toda a sua estrutura e constituição ele revela os mais claros sinais de uma inteligência infinita, das emoções mais profundas, mais elevadas e mais ternas, e de uma vontade todo-poderosa. Conseqüentemente, somos constrangidos a subir do mundo para o Criador do mundo como um Ser com inteligência, sensibilidade e vontade, isto é, como uma pessoa. (3) A natureza moral e religiosa do homem também aponta para a personalidade de Deus. A Sua natureza Lhe impõe um senso de obrigação de fazer o que é reto, isto implica necessariamente a existência de um Legislador supremo. Além disso, a sua natureza religiosa constantemente o incita a procurar comunhão pessoal com algum Ser superior; e todos os elementos e atividades da religião requerem um Deus pessoal como seu objeto e fim último. Mesmo as religiões panteístas, assim chamadas, muitas vezes testificam inconscientemente de crença num Deus pessoal. O fato é que coisas como penitência, fé e obediência, comunhão e amor, lealdade no servir e sacrifício, confiança na vida e na morte, não tem sentido, a menos que encontrem seu objeto apropriado num Deus Pessoal. Mas, conquanto todas estas considerações sejam verdadeiras e tenham valor como testimonia, não são as provas de que a teologia depende em sua doutrina da personalidade de Deus. Ela busca prova na revelação que Deus faz de Si na Escritura. O termo “pessoa” não é aplicado a Deus na Bíblia, se bem que há vocábulos, como o hebraico panim e o grego prosopon, que chegam bem perto de expressar a idéia. Ao mesmo tempo, a Escritura atesta a personalidade de Deus de diversas maneiras. A presença de Deus, como descrita pelos escritores do Velho e do Novo Testamentos, é uma, é uma presença claramente pessoal. E as representações antropomórficas e antropopáticas de Deus na Escritura, embora devem ser interpretadas de modo que não militem contra a pura espiritualidade e santidade de Deus, só podem justificar-se com o pressuposto de que o Ser a quem se aplicam é uma pessoa real, com atributos pessoais, muito embora sem limitações humanas. De capa a capa Deus é apresentado como um Deus pessoal, com quem os homens têm capacidade e permissão de conversar, em quem podem confiar, que os sustenta nas suas provações, e enche os seus corações da alegria da libertação e vitória. E finalmente, a mais alta revelação de Deus de que a Bíblia dá testemunho é uma revelação pessoal. Jesus Cristo revela o Pai de maneira tão perfeita que pôde dizer a Filipe: “Quem me vê a mim, vê o Pai”, Jo 14.9. provas mais pormenorizadas aparecerão na discussão dos atributos comunicáveis. A. A Espiritualidade de Deus. A Bíblia não nos dá uma definição de Deus. O que mais se aproxima disso é a palavra dita por Jesus à mulher samaritana: “Deus é Espírito”, Jo 4.24. Trata-se, ao menos, de uma declaração que visa a dizer-nos numa única palavra o que Deus é. O Senhor não diz meramente que Deus é um espírito, mas que Ele é Espírito. E devido a esta clara declaração, é simplesmente próprio discutir primeiro a espiritualidade de Deus. Pelo ensino da espiritualidade de Deus, a teologia salienta o fato de que Deus tem um Ser substancial exclusivamente Seu e distinto do mundo, e que este Ser substancial é imaterial, invisível, e sem composição nem extensão. A espiritualidade de Deus inclui o pensamento de que todas as qualidades que pertencem à perfeita idéia de Espírito se acham nele: que Ele é um Ser auto-consciente e auto-determinante. Desde que Ele é Espírito no sentido mais absoluto e mais puro da palavra, não há nele nenhuma composição de partes. A idéia de espiritualidade exclui necessariamente a atribuição de qualquer coisa semelhante a corporalidade a Deus e, assim, condena as fantasias de alguns antigos gnósticos e dos místicos que a Bíblia fala de mãos e pés, olhos e ouvidos, boca e narinas de Deus, mas, ao fazê-lo, está falando antropomórfica ou figuradamente daquele que, de longe, transcende o nosso conhecimento humano, e de quem só podemos falar aos gaguejos, à maneira dos homens. Atribuindo espiritualidade a Deus, podemos afirmar que Ele não tem nenhuma das propriedades pertencentes à matéria, e que os sentidos corporais não O podem discernir. Paulo fala dele como o “Rei eterno, imortal, invisível” (1 Tm 1.17), e como “o Rei dos reis e Senhor dos senhores; o único que possui imortalidade, que habita em luz inacessível, a quem homem algum jamais viu, nem é capaz de ver. A ele honra e poder eterno. Amém”. (1 Tim 6. 15, 16). (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 59)

Atributos Intelectuais

Na Escritura Deus é apresentado como Luz e, portanto, como perfeito em Sua vida intelectual. Esta categoria compreende duas perfeições divinas, a saber, o conhecimento e a sabedoria de Deus. 1. O CONHECIMENTO DE DEUS. Pode-se definir o conhecimento de Deus como a perfeição de Deus pela qual Ele, de maneira inteiramente única, conhece-se a Si próprio e a todas as coisas possíveis e reais num só ato eterno e simples. A Bíblia atesta abundantemente o conhecimento, como, por exemplo, em 1 Sm 2.3; Jó 12.13; Sl 94.9; 147.4; Is 29.15; 40.27, 28. Em conexão com o conhecimento de Deus, vários pontos pedem consideração. a. Sua natureza. O conhecimento de Deus difere do dos homens nalguns pontos importantes. É arquetípico, o que significa que Ele conhece o universo como ele existe em Sua própria idéia anterior à sua existência como realidade finita no tempo e no espaço; e esse conhecimento não é obtido de fora, como o nosso. É um conhecimento caracterizado por perfeição absoluta. Como tal, é intuitivo, antes que demonstrativo ou discursivo. É inato e imediato, e não resulta de observação ou de um processo de raciocínio. Sendo perfeito, é também simultâneo e não sucessivo, de modo que Ele vê as coisas de uma vez em sua totalidade, e não fragmentadas uma após a outra. Além disso, é completo e plenamente consciente, enquanto que o conhecimento do homem é sempre parcial, freqüentemente indistinto, e muitas vezes não consegue ascender à clara luz da consciência. Faz-se distinção entre o conhecimento necessário e o livre conhecimento de Deus. O primeiro é o conhecimento que Deus tem de Si mesmo e de todas as coisas possíveis, um conhecimento que repousa na consciência de Sua onipotência. É chamado necessário porque não é determinado por uma ação da vontade divina. Também é conhecido como conhecimento de simples inteligência, em vista do fato de que é pura e simplesmente um ato do intelecto divino, sem nenhuma ação concomitante da vontade divina. O livre conhecimento de Deus é aquele que Ele tem de todas as coisas reais, isto é, das coisas que existiram no passado, que existem no presente ou que existirão no futuro. Funda-se no conhecimento infinito que Deus tem do Seu propósito eterno, totalmente abrangente e imutável, e é chamado livre conhecimento porque é determinado por um ato concomitante da vontade. Também é denominado scientia visionis, conhecimento de vista. b. Sua extensão. O conhecimento de Deus não é perfeito somente em sua natureza, mas também em sua abrangência. É chamado onisciência, porque é absolutamente compreensivo. Para uma adequada avaliação desse atributo, podemos particularizá-lo como segue: Deus se conhece a Si próprio e em Si próprio todas as coisas que dele provêm (conhecimento interno). Ele conhece todas as coisas como realmente se dão, passadas, presentes e futuras, e as conhece em suas reais relações. Ele conhece a essência oculta das coisas, em que o conhecimento do homem não pode penetrar. Ele não vê como vê o homem, que só observava as manifestações externas da vida, mas penetra as profundezas do coração humano. Além disso, Ele conhece o que é possível, como conhece o que existe concretamente; todas as coisas que poderiam ocorrer em certas circunstâncias são atuais para a Sua mente. Diversas passagens da Escritura ensinam claramente a onisciência de Deus. Ele é perfeito em conhecimento, Jó 37.16, não olha para a aparência exterior, mas para o coração, 1 Sm 16.7; 1 Cr 28.9, 17; Sl 1.6; 119.168, conhece o lugar da sua habitação, Sl 33.13, e os dias da sua vida, Sl 37.18. É preciso defender esta doutrina do conhecimento de Deus contra todas as tendências panteístas de apresentar Deus como base inconsciente do mundo fenomenológico, e daqueles que, como Márcion, Socino e todos quantos acreditam num Deus finito, só atribuem a Ele um conhecimento limitado. Contudo, há uma questão que requer discussão especial. Refere-se à presciência de Deus quanto às livres ações dos homens e, portanto, dos eventos condicionais. Podemos entender como Deus pode Ter conhecimento prévio onde a necessidade domina, mas achamos difícil conceber um conhecimento prévio de ações que o homem origina livremente. A dificuldade deste problema levou alguns a negarem a presciência das ações livres e outros a negarem a liberdade humana. É perfeitamente evidente que a Escritura ensina a presciência divina de eventos contingentes, 1 Sm 23.10-13; 2 Rs 13.19; Sl 81.14, 15; Is 42.18; Jr 2.2, 3; 38.17-20; Ez 3.6; Mt 11.21. Além disso, ela não nos deixa em dúvida quanto à liberdade do homem. O certo é que ela não permite a negação de nenhum dos dois termos do problema. É nos levantado um problema aqui, que não podemos resolver plenamente, conquanto seja possível aproximar-nos de uma solução. Deus decretou todas as coisas, e as decretou com as suas causas e condições na exata ordem em que ocorrem; e a Sua presciência das coisas e também dos eventos contingentes apóia-se em Seu decreto. Isto soluciona o problema no que se refere à presciência de Deus. Mas agora surge a questão: A predeterminação das coisas é coerente com o livre arbítrio do homem? E a resposta certamente é que não é, se se considerar a liberdade da vontade como indifferentia (arbitrariedade), mas não há base segura para esta concepção da liberdade do homem. A vontade humana não é uma coisa inteiramente indeterminada, uma coisa solta no ar. E que pode pender arbitrariamente numa ou noutra direção. Ao invés disso é uma coisa arraigada em nossa natureza, ligada aos nossos mais profundos instintos e emoções, e determinada por nossas considerações intelectuais e por nosso próprio caráter. E se concebemos a nossa liberdade humana como lubentia rationalis (auto-determinação racional), não temos base suficiente para dizer que é incoerente com a presciência divina. Diz o dr. Orr: “Há uma solução para este problema, embora as nossas mentes não consigam captá-la. Provavelmente ela está, em parte, não em negar a liberdade, mas numa concepção revista da liberdade. Pois, afinal de contas, liberdade não é arbitrariedade. Em toda ação racional há um porquê para agir – uma razão que decide a ação. O homem verdadeiramente livre não é o homem incerto e imprevisível, mas o homem seguro, confiável. Em resumo, a liberdade tem suas leis – leis espirituais – e a Mente onisciente sabe quais são. Mas, deve-se reconhecer, permanece um elemento de mistério”. Teólogos jesuítas, luteranos e arminianos sugeriram a scientia media, assim chamada, como solução do problema. O nome indica o fato de que ela ocupa o ponto intermediário entre o conhecimento necessário de Deus e o livre. Difere daquele em que seu objeto não são todas as coisas possíveis, mas uma classe especial de coisas realmente futuras; e deste em que a sua base não é o eterno propósito de Deus, mas a livre ação da criatura como simplesmente prevista. Chamam-lhe média, diz Dabney, “porque supõem que Deus chega a esse conhecimento, não diretamente, conhecendo o Seu propósito de efetua-la, mas indiretamente, pela Sua infinita compreensão da maneira pela qual a causa secundária e contingente atuará, em dadas circunstâncias externas, previstas ou produzidas por Deus”. Isto, porém, não é solução de problema, absolutamente. É uma tentativa de conciliar duas coisas que logicamente se excluem uma à outra, a saber, a liberdade de ação no sentido pelagiano e uma certa presciência dessa ação. Ações que de maneira nenhuma são determinadas por Deus, direta ou indiretamente, mas que são totalmente dependentes da vontade arbitrária do homem, dificilmente podem ser objeto do pré-conhecimento divino. Ademais, é objetável, porque torna o conhecimento divino dependente da escolha do homem, virtualmente anula a certeza do conhecimento dos eventos futuros e, assim, nega implicitamente a onisciência de Deus. Também é contrária a passagens da Escritura como At 2.23; Rm 9.16; Ef 1.11; Fp 2.13. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg 61) 2. A SABEDORIA DE DEUS. Pode-se considerar a sabedoria de Deus como um aspecto do Seu conhecimento. É evidente que conhecimento e sabedoria não são a mesma coisa, conquanto estreitamente relacionados. Nem sempre vão juntos. Um homem sem instrução formal pode ser superior em sabedoria a um erudito. O conhecimento é adquirido pelo estudo, mas a sabedoria resulta de uma compreensão intuitiva das coisas. Aquele é teórico, enquanto que esta é prática, tornando o conhecimento subserviente a algum propósito específico. Ambos são imperfeitos no homem, mas em Deus são caracterizados por absoluta perfeição. A sabedoria de Deus é a Sua inteligência como manifestada na adaptação de meios e fins. Ela indica o fato de que Ele sempre busca os melhores fins possíveis, e escolhe os melhores meios para a consecução dos Seus propósitos. H. B. Smith define a sabedoria divina como “o atributo de Deus pelo qual Ele produz os melhores resultados possíveis com os melhores meios possíveis”. Podemos ser um pouco mais específicos e chamar-lhe a perfeição de Deus pela qual ele aplica o Seu conhecimento à consecução dos Seus fins de um modo que O glorifica o máximo. Implica um fim último ao qual todos os fins secundários estão subordinados; e, segundo a Escritura, este fim último é a glória de Deus, Rm 11.33; 14.7, 8; Ef 1.11, 12; Cl 1.16. A Escritura se refere à sabedoria de Deus em muitas passagens, e até a apresenta como personificada em Provérbios 8. Vê-se esta sabedoria particularmente na criação, Sl 19.1-7; 104.1-34; na providência, Sl 33. 10,11; Rm 8.28; e na redenção, Rm 11.33; 1 Co 2.7; Ef 3.10. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 62) 3. A VERACIDADE DE DEUS. A Escritura utiliza várias palavras para expressar a veracidade de Deus: no Velho testamento ‘emeth, ‘amunah, e ‘amen, e no Novo Testamento alethes (aletheia), alethinos, e pistis. Isto já indica o fato de que ela inclui diversas idéias, como verdade, fidedignidade, e fidelidade. Quando se diz que Deus é a verdade, esta deve ser entendida em seu sentido mais abrangente. Primeiramente, Ele é a verdade num sentido metafísico, isto é, nele a idéia da Divindade se concretiza perfeitamente; Ele é tudo que como Deus deveria ser e, como tal, distingue-se de todos os deuses, assim chamados, os quais são chamados ídolos, nulidades e mentiras, Sl 96.5; 97.7; 115.4-8; Is 44.9, 10. Ele é também a verdade num sentido ético e, como tal, revela-se como realmente é, de modo que a Sua revelação é absolutamente confiável, Nm 23.19; Rm 3.4; Hb 6.18. Finalmente, Ele é também a verdade num sentido lógico e, em virtude disto, conhece as coisas como realmente são, e constitui de tal modo a mente do homem que este pode conhecer não apenas a aparência, mas também a realidade das coisas. Assim, a verdade de Deus é o alicerce de todo conhecimento. Deve-se ter em mente, ademais, que esses três sentidos são apenas diferentes aspectos da verdade, que é única em Deus. Em vista do precedente, podemos definir a veracidade ou verdade de Deus como a perfeição de Deus em virtude da qual Ele responde plenamente à idéia da Divindade, é perfeitamente confiável em sua revelação, e vê as coisas como realmente são. É devido a esta perfeição que Ele é a fonte de toda verdade, não somente na esfera moral e da religião, mas também em todos os campos da atividade científica. A Escritura é muito enfática em suas referências a Deus como verdade, Êx 34.6; Nm 23.19; Dt 32.4; Sl 25.10; 31.6; Is 65.16; Jr 10.8, 10, 11; Jo 14.6; 17.3; Tt 1.2; Hb 6.18; 1 Jo 5.20,21. Há ainda outro aspecto desta perfeição divina, e um aspecto sempre considerado da maior importância. Geralmente se lhe chama fidelidade, em virtude da qual Ele está sempre atento à Sua aliança e cumpre todas as promessas que fez ao Seu povo. Esta fidelidade de Deus é de máxima significação prática para o povo de Deus. É a base da sua confiança, o fundamento da sua esperança, e a causa do seu regozijo. Ela os salva do desespero ao qual a sua própria infidelidade facilmente os poderia levar, dá-lhes coragem para prosseguirem, a despeito de todos os seus fracassos, e enche os seus corações de jubilosas antecipações, mesmo quando estão profundamente cônscios do fato de que perderam o direito a todas as bênçãos de Deus. Nm 23.19; Dt 7.9; Sl 89.33; Is 49.7; 1 Co 1.9; 2 Tm 2.13; Hb 6.17, 18; 10.23. (Teologia Sistemática – Louis berkhof. Pg. 63)

A SABEDORIA DE DEUS

Pode-se considerar a sabedoria de Deus como um aspecto do Seu conhecimento. É evidente que conhecimento e sabedoria não são a mesma coisa, conquanto estreitamente relacionados. Nem sempre vão juntos. Um homem sem instrução formal pode ser superior em sabedoria a um erudito. O conhecimento é adquirido pelo estudo, mas a sabedoria resulta de uma compreensão intuitiva das coisas. Aquele é teórico, enquanto que esta é prática, tornando o conhecimento subserviente a algum propósito específico. Ambos são imperfeitos no homem, mas em Deus são caracterizados por absoluta perfeição. A sabedoria de Deus é a Sua inteligência como manifestada na adaptação de meios e fins. Ela indica o fato de que Ele sempre busca os melhores fins possíveis, e escolhe os melhores meios para a consecução dos Seus propósitos. H. B. Smith define a sabedoria divina como “o atributo de Deus pelo qual Ele produz os melhores resultados possíveis com os melhores meios possíveis”. Podemos ser um pouco mais específicos e chamar-lhe a perfeição de Deus pela qual ele aplica o Seu conhecimento à consecução dos Seus fins de um modo que O glorifica o máximo. Implica um fim último ao qual todos os fins secundários estão subordinados; e, segundo a Escritura, este fim último é a glória de Deus, Rm 11.33; 14.7, 8; Ef 1.11, 12; Cl 1.16. A Escritura se refere à sabedoria de Deus em muitas passagens, e até a apresenta como personificada em Provérbios 8. Vê-se esta sabedoria particularmente na criação, Sl 19.1-7; 104.1-34; na providência, Sl 33. 10,11; Rm 8.28; e na redenção, Rm 11.33; 1 Co 2.7; Ef 3.10. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 62)

O CONHECIMENTO DE DEUS

Pode-se definir o conhecimento de Deus como a perfeição de Deus pela qual Ele, de maneira inteiramente única, conhece-se a Si próprio e a todas as coisas possíveis e reais num só ato eterno e simples. A Bíblia atesta abundantemente o conhecimento, como, por exemplo, em 1 Sm 2.3; Jó 12.13; Sl 94.9; 147.4; Is 29.15; 40.27, 28. Em conexão com o conhecimento de Deus, vários pontos pedem consideração. a. Sua natureza. O conhecimento de Deus difere do dos homens nalguns pontos importantes. É arquetípico, o que significa que Ele conhece o universo como ele existe em Sua própria idéia anterior à sua existência como realidade finita no tempo e no espaço; e esse conhecimento não é obtido de fora, como o nosso. É um conhecimento caracterizado por perfeição absoluta. Como tal, é intuitivo, antes que demonstrativo ou discursivo. É inato e imediato, e não resulta de observação ou de um processo de raciocínio. Sendo perfeito, é também simultâneo e não sucessivo, de modo que Ele vê as coisas de uma vez em sua totalidade, e não fragmentadas uma após a outra. Além disso, é completo e plenamente consciente, enquanto que o conhecimento do homem é sempre parcial, freqüentemente indistinto, e muitas vezes não consegue ascender à clara luz da consciência. Faz-se distinção entre o conhecimento necessário e o livre conhecimento de Deus. O primeiro é o conhecimento que Deus tem de Si mesmo e de todas as coisas possíveis, um conhecimento que repousa na consciência de Sua onipotência. É chamado necessário porque não é determinado por uma ação da vontade divina. Também é conhecido como conhecimento de simples inteligência, em vista do fato de que é pura e simplesmente um ato do intelecto divino, sem nenhuma ação concomitante da vontade divina. O livre conhecimento de Deus é aquele que Ele tem de todas as coisas reais, isto é, das coisas que existiram no passado, que existem no presente ou que existirão no futuro. Funda-se no conhecimento infinito que Deus tem do Seu propósito eterno, totalmente abrangente e imutável, e é chamado livre conhecimento porque é determinado por um ato concomitante da vontade. Também é denominado scientia visionis, conhecimento de vista. b. Sua extensão. O conhecimento de Deus não é perfeito somente em sua natureza, mas também em sua abrangência. É chamado onisciência, porque é absolutamente compreensivo. Para uma adequada avaliação desse atributo, podemos particularizá-lo como segue: Deus se conhece a Si próprio e em Si próprio todas as coisas que dele provêm (conhecimento interno). Ele conhece todas as coisas como realmente se dão, passadas, presentes e futuras, e as conhece em suas reais relações. Ele conhece a essência oculta das coisas, em que o conhecimento do homem não pode penetrar. Ele não vê como vê o homem, que só observava as manifestações externas da vida, mas penetra as profundezas do coração humano. Além disso, Ele conhece o que é possível, como conhece o que existe concretamente; todas as coisas que poderiam ocorrer em certas circunstâncias são atuais para a Sua mente. Diversas passagens da Escritura ensinam claramente a onisciência de Deus. Ele é perfeito em conhecimento, Jó 37.16, não olha para a aparência exterior, mas para o coração, 1 Sm 16.7; 1 Cr 28.9, 17; Sl 1.6; 119.168, conhece o lugar da sua habitação, Sl 33.13, e os dias da sua vida, Sl 37.18. É preciso defender esta doutrina do conhecimento de Deus contra todas as tendências panteístas de apresentar Deus como base inconsciente do mundo fenomenológico, e daqueles que, como Márcion, Socino e todos quantos acreditam num Deus finito, só atribuem a Ele um conhecimento limitado. Contudo, há uma questão que requer discussão especial. Refere-se à presciência de Deus quanto às livres ações dos homens e, portanto, dos eventos condicionais. Podemos entender como Deus pode Ter conhecimento prévio onde a necessidade domina, mas achamos difícil conceber um conhecimento prévio de ações que o homem origina livremente. A dificuldade deste problema levou alguns a negarem a presciência das ações livres e outros a negarem a liberdade humana. É perfeitamente evidente que a Escritura ensina a presciência divina de eventos contingentes, 1 Sm 23.10-13; 2 Rs 13.19; Sl 81.14, 15; Is 42.18; Jr 2.2, 3; 38.17-20; Ez 3.6; Mt 11.21. Além disso, ela não nos deixa em dúvida quanto à liberdade do homem. O certo é que ela não permite a negação de nenhum dos dois termos do problema. É nos levantado um problema aqui, que não podemos resolver plenamente, conquanto seja possível aproximar-nos de uma solução. Deus decretou todas as coisas, e as decretou com as suas causas e condições na exata ordem em que ocorrem; e a Sua presciência das coisas e também dos eventos contingentes apóia-se em Seu decreto. Isto soluciona o problema no que se refere à presciência de Deus. Mas agora surge a questão: A predeterminação das coisas é coerente com o livre arbítrio do homem? E a resposta certamente é que não é, se se considerar a liberdade da vontade como indifferentia (arbitrariedade), mas não há base segura para esta concepção da liberdade do homem. A vontade humana não é uma coisa inteiramente indeterminada, uma coisa solta no ar. E que pode pender arbitrariamente numa ou noutra direção. Ao invés disso é uma coisa arraigada em nossa natureza, ligada aos nossos mais profundos instintos e emoções, e determinada por nossas considerações intelectuais e por nosso próprio caráter. E se concebemos a nossa liberdade humana como lubentia rationalis (auto-determinação racional), não temos base suficiente para dizer que é incoerente com a presciência divina. Diz o dr. Orr: “Há uma solução para este problema, embora as nossas mentes não consigam captá-la. Provavelmente ela está, em parte, não em negar a liberdade, mas numa concepção revista da liberdade. Pois, afinal de contas, liberdade não é arbitrariedade. Em toda ação racional há um porquê para agir – uma razão que decide a ação. O homem verdadeiramente livre não é o homem incerto e imprevisível, mas o homem seguro, confiável. Em resumo, a liberdade tem suas leis – leis espirituais – e a Mente onisciente sabe quais são. Mas, deve-se reconhecer, permanece um elemento de mistério”. Teólogos jesuítas, luteranos e arminianos sugeriram a scientia media, assim chamada, como solução do problema. O nome indica o fato de que ela ocupa o ponto intermediário entre o conhecimento necessário de Deus e o livre. Difere daquele em que seu objeto não são todas as coisas possíveis, mas uma classe especial de coisas realmente futuras; e deste em que a sua base não é o eterno propósito de Deus, mas a livre ação da criatura como simplesmente prevista. Chamam-lhe média, diz Dabney, “porque supõem que Deus chega a esse conhecimento, não diretamente, conhecendo o Seu propósito de efetua-la, mas indiretamente, pela Sua infinita compreensão da maneira pela qual a causa secundária e contingente atuará, em dadas circunstâncias externas, previstas ou produzidas por Deus”. Isto, porém, não é solução de problema, absolutamente. É uma tentativa de conciliar duas coisas que logicamente se excluem uma à outra, a saber, a liberdade de ação no sentido pelagiano e uma certa presciência dessa ação. Ações que de maneira nenhuma são determinadas por Deus, direta ou indiretamente, mas que são totalmente dependentes da vontade arbitrária do homem, dificilmente podem ser objeto do pré-conhecimento divino. Ademais, é objetável, porque torna o conhecimento divino dependente da escolha do homem, virtualmente anula a certeza do conhecimento dos eventos futuros e, assim, nega implicitamente a onisciência de Deus. Também é contrária a passagens da Escritura como At 2.23; Rm 9.16; Ef 1.11; Fp 2.13. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg 61)

A VERACIDADE DE DEUS

A Escritura utiliza várias palavras para expressar a veracidade de Deus: no Velho testamento ‘emeth, ‘amunah, e ‘amen, e no Novo Testamento alethes (aletheia), alethinos, e pistis. Isto já indica o fato de que ela inclui diversas idéias, como verdade, fidedignidade, e fidelidade. Quando se diz que Deus é a verdade, esta deve ser entendida em seu sentido mais abrangente. Primeiramente, Ele é a verdade num sentido metafísico, isto é, nele a idéia da Divindade se concretiza perfeitamente; Ele é tudo que como Deus deveria ser e, como tal, distingue-se de todos os deuses, assim chamados, os quais são chamados ídolos, nulidades e mentiras, Sl 96.5; 97.7; 115.4-8; Is 44.9, 10. Ele é também a verdade num sentido ético e, como tal, revela-se como realmente é, de modo que a Sua revelação é absolutamente confiável, Nm 23.19; Rm 3.4; Hb 6.18. Finalmente, Ele é também a verdade num sentido lógico e, em virtude disto, conhece as coisas como realmente são, e constitui de tal modo a mente do homem que este pode conhecer não apenas a aparência, mas também a realidade das coisas. Assim, a verdade de Deus é o alicerce de todo conhecimento. Deve-se ter em mente, ademais, que esses três sentidos são apenas diferentes aspectos da verdade, que é única em Deus. Em vista do precedente, podemos definir a veracidade ou verdade de Deus como a perfeição de Deus em virtude da qual Ele responde plenamente à idéia da Divindade, é perfeitamente confiável em sua revelação, e vê as coisas como realmente são. É devido a esta perfeição que Ele é a fonte de toda verdade, não somente na esfera moral e da religião, mas também em todos os campos da atividade científica. A Escritura é muito enfática em suas referências a Deus como verdade, Êx 34.6; Nm 23.19; Dt 32.4; Sl 25.10; 31.6; Is 65.16; Jr 10.8, 10, 11; Jo 14.6; 17.3; Tt 1.2; Hb 6.18; 1 Jo 5.20,21. Há ainda outro aspecto desta perfeição divina, e um aspecto sempre considerado da maior importância. Geralmente se lhe chama fidelidade, em virtude da qual Ele está sempre atento à Sua aliança e cumpre todas as promessas que fez ao Seu povo. Esta fidelidade de Deus é de máxima significação prática para o povo de Deus. É a base da sua confiança, o fundamento da sua esperança, e a causa do seu regozijo. Ela os salva do desespero ao qual a sua própria infidelidade facilmente os poderia levar, dá-lhes coragem para prosseguirem, a despeito de todos os seus fracassos, e enche os seus corações de jubilosas antecipações, mesmo quando estão profundamente cônscios do fato de que perderam o direito a todas as bênçãos de Deus. Nm 23.19; Dt 7.9; Sl 89.33; Is 49.7; 1 Co 1.9; 2 Tm 2.13; Hb 6.17, 18; 10.23. (Teologia Sistemática – Louis berkhof. Pg. 63)

A bondade de Deus para com Suas criaturas em geral

Esta pode ser definida como a perfeição de Deus que O leva a tratar benévola e generosamente todas as Suas criaturas. É a afeição que o Criador sente para com as Suas criaturas dotadas de sensibilidade consciente como tais. O salmista a exalta com as bem conhecidas palavras: “O Senhor é bom para todos, e as suas ternas misericórdias permeiam todas as suas obras... Em ti esperam os olhos de todos, e tu, a seu tempo, lhes dás o alimento. Abres a tua mão e satisfazes de benevolência a todo vivente”, Sl 145.9, 15, 16. Este benévolo interesse de Deus é revelado em Seu cuidado pelo bem-estar da criatura e corresponde à natureza e às circunstâncias da criatura. Varia naturalmente em grau, de acordo com a capacidade que os seus objetos têm de recebe-lo. E embora não se restrinja aos crentes, somente estes manifestam apropriada apreciação das bênçãos que dela provêm, desejo de usa-las no serviço do seu Deus e, assim, desfrutam-na em medida mais rica e mais completa. A Bíblia refere-se a esta bondade de Deus em muitas passagens, como Sl 36.6; 104.21; Mt 5.45; 6.26; Lc 6.35; At 14.17. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 64)

A BONDADE DE DEUS

Esta geralmente é tratada como uma concepção genérica, incluindo diversas variedades que se distinguem de acordo com os seus objetos. Não se deve confundir a bondade de Deus com Sua benevolência, que é um conceito mais restrito. Falamos que uma coisa é boa quando ela corresponde em todas as suas partes ao ideal. Daí, em nossa atribuição de bondade de Deus, a idéia fundamental é que Ele é, em todos os aspectos e por todos os modos, tudo aquilo que deve ser como Deus, e, portanto, corresponde perfeitamente ao ideal expresso pela palavra “Deus”. Ele é bom na acepção metafísica da palavra, é perfeição absoluta e felicidade perfeita em Si mesmo. É neste sentido que Jesus disse ao homem de posição: “Ninguém é bom senão um só, que é Deus”, Mc 10.18; Lc 18.18, 19. Mas, desde que Deus é bom em Si mesmo, é também bom para as Suas criaturas e, portanto, pode ser chamado a fons omnium bonorum. Ele é a fonte de todo bem, e assim é apresentado de várias maneiras na Bíblia toda. O poeta canta: “Pois em ti está o manancial da vida; na tua luz vemos a luz”, Sl 36.9. Todas as boas coisas que as criaturas fruem no presente e esperam no futuro, fluem para elas deste manancial inexaurível. E não somente isso, mas Deus é também o summum bonum, o sumo bem, para todas as Suas criaturas, embora em diferentes graus e na medida em que correspondem ao propósito da sua existência. Na presente conexão, naturalmente damos ênfase à bondade ética de Deus e a seus diferentes aspectos, como determinados pela natureza dos seus objetos. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 63)

O amor de Deus

Quando a bondade de Deus é exercida para com as Suas criaturas racionais, assume o caráter mais elevado de amor, e ainda se pode distinguir este amor de acordo com os objetos aos quais se limita. Em distinção da bondade de Deus em geral, o Seu amor pode ser definido como a perfeição de Deus pela qual Ele é movido eternamente à Sua própria comunicação. Desde que Deus é absolutamente bom em Si mesmo, Seu amor não pode achar completa satisfação em nenhum objeto falto de perfeição absoluta. Ele ama as Suas criaturas racionais por amor a Si mesmo, ou, para expressá-lo doutra forma, neles Ele se ama a Si mesmo, Suas virtudes, Sua obra e Seus dons. Ele nem mesmo retira completamente o Seu amor do pecador em seu estado pecaminoso atual, apesar de que o pecado deste é uma abominação para Ele, visto que, mesmo no pecador, Ele reconhece um portador da Sua imagem. Jo 3.16; Mt 5.44, 45. Ao mesmo tempo, Ele ama os crentes com amor especial, dado que os vê como Seus filhos espirituais em Cristo. É a estes que Ele se comunica no sentido mais rico e mais completo, com toda a plenitude da Sua graça e misericórdia. Jo 16.27; Rm 5.8; 1 Jo 3.1. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.64)

A graça de Deus

A significativa palavra “graça” é uma tradução do termo hebraico chanan e do grego charis. Segundo a Escritura, é manifestada não só por Deus, mas também pelos homens, caso em que denota o favor de um homem a outro, Gn 33.8, 10, 18; 39.4; 47.25; Rt 2.2; 1 Sm 1.18; 16.22. Nestes casos não implica necessariamente que o favor é imerecido. Em geral se pode dizer, porém, que a graça é a concessão de bondade a alguém que não tem nenhum direito a ela. É este particularmente o caso em que a graça a que se faz referência é a graça de Deus. Seu amor ao ser humano é sempre imerecido e, quando mostrado a pecadores, estes são até privados dele. A Bíblia geralmente emprega apalavra para indicar a imerecida bondade ou amor de Deus aos que perderam o direito a ela e, por natureza, estão sob a sentença de condenação. A graça de Deus é a fonte de todas as bênçãos espirituais concedidas aos pecadores. Como tal, lemos a seu respeito em Ef 1. 6.7; 2.7-9; Tt 2.11; 3.4-7. Embora a Bíblia fale muitas vezes da graça de Deus como graça salvadora, também faz menção dela num sentido mais amplo, como em Is 26.10; Jr 16.13. A graça de Deus é da maior significação prática para os pecadores. É pela graça que o caminho da redenção foi aberto para eles, Rm 3.24; 2 Co 8.9, e que a mensagem da redenção foi levada ao mundo, At 14.3. pela graça os pecadores recebem o dom de Deus em Jesus Cristo, At 18.27; Ef 2.8. Pela graça eles são justificados, Rm 3.24; 4.16; Tt 3.7, são enriquecidos de bênçãos espirituais, Jo 1,16; 2 Co 8.9; 2 Ts 2.16, e finalmente herdam a salvação, Ef 2.8; Tt 2.11. Vendo-se absolutamente sem méritos próprios ficam na total dependência da graça de Deus em Cristo. No modernismo teológico, com sua crença na bondade inerente do homem e em sua capacidade de bastar-se a si próprio, a doutrina da salvação pela graça tornou-se praticamente um “acorde perdido”, e mesmo a palavra “graça” foi esvaziada de toda significação espiritual e desapareceu dos discursos religiosos. Só foi conservada no sentido de “graciosidade”, coisa inteiramente externa. Felizmente há algumas evidências de uma renovada ênfase ao pecado, e de uma recém-despertada consciência da necessidade da graça divina. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 65)

A misericórdia de Deus.

Outro importante aspecto da bondade e amor de Deus é a Sua misericórdia ou terna compaixão. A palavra hebraica mais geralmente empregada para esta perfeição é chesed. Há outra palavra, porém, que expressa uma terna e profunda compaixão, a saber, a palavra racham, às vezes lindamente traduzida por “terna misericórdia”. A Septuaginta e o Novo Testamento empregam a palavra grega eleos para designar a misericórdia de Deus. Se a graça de Deus vê o homem como culpado diante de Deus e, portanto, necessitado de perdão, a misericórdia de Deus o vê como um ser que está suportando as conseqüências do pecado, que se acha em lastimável condição, e que, portanto, necessita do socorro divino. Pode-se definir a misericórdia divina como a bondade ou amor de Deus demonstrado para com os que se acham na miséria ou na desgraça, independentemente dos seus méritos. Em Sua misericórdia Deus se revela um Deus compassivo, que tem pena dos que se acham na miséria e está sempre pronto a aliviar a sua desgraça. Esta misericórdia é generosa, Dt 5.10; Sl 57.10; 86.5, e os poetas de Israel se dedicam em entoar canções descrevendo-a como duradoura e eterna, 1 Cr 16.34; 2 Cr 7.6; Sl 136; Ed 3.11. No Novo Testamento é muitas vezes mencionada ao lado da graça de Deus, especialmente nas saudações, 1 Tm 1.2; 2 Tm 1.1; Tt 1.4. Repetidamente se nos diz que essa perfeição divina é demonstrada para com os que temem a Deus, ex 20.2; Dt 7.9; Sl 86.5; Lc 1.50. Não significa, porém, que se limita a eles, conquanto a desfrutem em medida especial. As ternas misericórdias de Deus estão sobre todas as Suas obras, Sl 145.9, e até os que não O temem compartilham delas, Ez 18.23, 32; 33.11; Lc 6.35, 36. Não se pode apresentar a misericórdia de Deus como oposta à Sua justiça. Ela é exercida somente em harmonia com a mais estrita justiça de Deus, em vista dos méritos de Jesus Cristo. Outros termos empregados para expressar a misericórdia de Deus são “piedade”, “compaixão”, “benignidade”. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.65)

A longanimidade de Deus

A longanimidade de Deus é ainda outro aspecto da Sua grande bondade ou amor. O hebraico emprega a expressão ‘erek ‘aph, que significa literalmente “grande de rosto” e daí também “lento para a ira”, enquanto que o grego expressa a mesma idéia com a palavra makrothymia. É o aspecto da bondade ou amor de Deus em virtude do qual Ele tolera os rebeldes e maus, a despeito da sua prolongada desobediência. No exercício deste atributo o pecador é visto como permanecendo em pecado, não obstante as admoestações e advertências que lhe vêm. Revela-se no adiantamento do merecido julgamento. A Escritura fala da longanimidade de Deus em Êx 34.6; Sl 86.15; Rm 2.4; 1 Pe 3.20; 2 Pe 3.15. Um termo sinônimo, com uma conotação ligeiramente diversa, é a palavra “paciência”. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.66)

Atributos Morais de Deus

Os atributos morais de Deus são geralmente considerados como as perfeições divinas mais gloriosas. Não que um atributo de Deus seja em si mesmo mais perfeito e mais glorioso que outro, mas, relativamente ao homem, as perfeições morais de Deus refulgem com um esplendor todo seu. Geralmente são discutidos sob três títulos: (1) a bondade de Deus; (2) a santidade de Deus; e (3) a justiça de Deus. 1. A BONDADE DE DEUS. Esta geralmente é tratada como uma concepção genérica, incluindo diversas variedades que se distinguem de acordo com os seus objetos. Não se deve confundir a bondade de Deus com Sua benevolência, que é um conceito mais restrito. Falamos que uma coisa é boa quando ela corresponde em todas as suas partes ao ideal. Daí, em nossa atribuição de bondade de Deus, a idéia fundamental é que Ele é, em todos os aspectos e por todos os modos, tudo aquilo que deve ser como Deus, e, portanto, corresponde perfeitamente ao ideal expresso pela palavra “Deus”. Ele é bom na acepção metafísica da palavra, é perfeição absoluta e felicidade perfeita em Si mesmo. É neste sentido que Jesus disse ao homem de posição: “Ninguém é bom senão um só, que é Deus”, Mc 10.18; Lc 18.18, 19. Mas, desde que Deus é bom em Si mesmo, é também bom para as Suas criaturas e, portanto, pode ser chamado a fons omnium bonorum. Ele é a fonte de todo bem, e assim é apresentado de várias maneiras na Bíblia toda. O poeta canta: “Pois em ti está o manancial da vida; na tua luz vemos a luz”, Sl 36.9. Todas as boas coisas que as criaturas fruem no presente e esperam no futuro, fluem para elas deste manancial inexaurível. E não somente isso, mas Deus é também o summum bonum, o sumo bem, para todas as Suas criaturas, embora em diferentes graus e na medida em que correspondem ao propósito da sua existência. Na presente conexão, naturalmente damos ênfase à bondade ética de Deus e a seus diferentes aspectos, como determinados pela natureza dos seus objetos. a. A bondade de Deus para com Suas criaturas em geral. Esta pode ser definida como a perfeição de Deus que O leva a tratar benévola e generosamente todas as Suas criaturas. É a afeição que o Criador sente para com as Suas criaturas dotadas de sensibilidade consciente como tais. O salmista a exalta com as bem conhecidas palavras: “O Senhor é bom para todos, e as suas ternas misericórdias permeiam todas as suas obras... Em ti esperam os olhos de todos, e tu, a seu tempo, lhes dás o alimento. Abres a tua mão e satisfazes de benevolência a todo vivente”, Sl 145.9, 15, 16. Este benévolo interesse de Deus é revelado em Seu cuidado pelo bem-estar da criatura e corresponde à natureza e às circunstâncias da criatura. Varia naturalmente em grau, de acordo com a capacidade que os seus objetos têm de recebe-lo. E embora não se restrinja aos crentes, somente estes manifestam apropriada apreciação das bênçãos que dela provêm, desejo de usa-las no serviço do seu Deus e, assim, desfrutam-na em medida mais rica e mais completa. A Bíblia refere-se a esta bondade de Deus em muitas passagens, como Sl 36.6; 104.21; Mt 5.45; 6.26; Lc 6.35; At 14.17. b. O amor de Deus. Quando a bondade de Deus é exercida para com as Suas criaturas racionais, assume o caráter mais elevado de amor, e ainda se pode distinguir este amor de acordo com os objetos aos quais se limita. Em distinção da bondade de Deus em geral, o Seu amor pode ser definido como a perfeição de Deus pela qual Ele é movido eternamente à Sua própria comunicação. Desde que Deus é absolutamente bom em Si mesmo, Seu amor não pode achar completa satisfação em nenhum objeto falto de perfeição absoluta. Ele ama as Suas criaturas racionais por amor a Si mesmo, ou, para expressá-lo doutra forma, neles Ele se ama a Si mesmo, Suas virtudes, Sua obra e Seus dons. Ele nem mesmo retira completamente o Seu amor do pecador em seu estado pecaminoso atual, apesar de que o pecado deste é uma abominação para Ele, visto que, mesmo no pecador, Ele reconhece um portador da Sua imagem. Jo 3.16; Mt 5.44, 45. Ao mesmo tempo, Ele ama os crentes com amor especial, dado que os vê como Seus filhos espirituais em Cristo. É a estes que Ele se comunica no sentido mais rico e mais completo, com toda a plenitude da Sua graça e misericórdia. Jo 16.27; Rm 5.8; 1 Jo 3.1. c. A graça de Deus. A significativa palavra “graça” é uma tradução do termo hebraico chanan e do grego charis. Segundo a Escritura, é manifestada não só por Deus, mas também pelos homens, caso em que denota o favor de um homem a outro, Gn 33.8, 10, 18; 39.4; 47.25; Rt 2.2; 1 Sm 1.18; 16.22. Nestes casos não implica necessariamente que o favor é imerecido. Em geral se pode dizer, porém, que a graça é a concessão de bondade a alguém que não tem nenhum direito a ela. É este particularmente o caso em que a graça a que se faz referência é a graça de Deus. Seu amor ao ser humano é sempre imerecido e, quando mostrado a pecadores, estes são até privados dele. A Bíblia geralmente emprega apalavra para indicar a imerecida bondade ou amor de Deus aos que perderam o direito a ela e, por natureza, estão sob a sentença de condenação. A graça de Deus é a fonte de todas as bênçãos espirituais concedidas aos pecadores. Como tal, lemos a seu respeito em Ef 1. 6.7; 2.7-9; Tt 2.11; 3.4-7. Embora a Bíblia fale muitas vezes da graça de Deus como graça salvadora, também faz menção dela num sentido mais amplo, como em Is 26.10; Jr 16.13. A graça de Deus é da maior significação prática para os pecadores. É pela graça que o caminho da redenção foi aberto para eles, Rm 3.24; 2 Co 8.9, e que a mensagem da redenção foi levada ao mundo, At 14.3. pela graça os pecadores recebem o dom de Deus em Jesus Cristo, At 18.27; Ef 2.8. Pela graça eles são justificados, Rm 3.24; 4.16; Tt 3.7, são enriquecidos de bênçãos espirituais, Jo 1,16; 2 Co 8.9; 2 Ts 2.16, e finalmente herdam a salvação, Ef 2.8; Tt 2.11. Vendo-se absolutamente sem méritos próprios ficam na total dependência da graça de Deus em Cristo. No modernismo teológico, com sua crença na bondade inerente do homem e em sua capacidade de bastar-se a si próprio, a doutrina da salvação pela graça tornou-se praticamente um “acorde perdido”, e mesmo a palavra “graça” foi esvaziada de toda significação espiritual e desapareceu dos discursos religiosos. Só foi conservada no sentido de “graciosidade”, coisa inteiramente externa. Felizmente há algumas evidências de uma renovada ênfase ao pecado, e de uma recém-despertada consciência da necessidade da graça divina. d. A misericórdia de Deus. Outro importante aspecto da bondade e amor de Deus é a Sua misericórdia ou terna compaixão. A palavra hebraica mais geralmente empregada para esta perfeição é chesed. Há outra palavra, porém, que expressa uma terna e profunda compaixão, a saber, a palavra racham, às vezes lindamente traduzida por “terna misericórdia”. A Septuaginta e o Novo Testamento empregam a palavra grega eleos para designar a misericórdia de Deus. Se a graça de Deus vê o homem como culpado diante de Deus e, portanto, necessitado de perdão, a misericórdia de Deus o vê como um ser que está suportando as conseqüências do pecado, que se acha em lastimável condição, e que, portanto, necessita do socorro divino. Pode-se definir a misericórdia divina como a bondade ou amor de Deus demonstrado para com os que se acham na miséria ou na desgraça, independentemente dos seus méritos. Em Sua misericórdia Deus se revela um Deus compassivo, que tem pena dos que se acham na miséria e está sempre pronto a aliviar a sua desgraça. Esta misericórdia é generosa, Dt 5.10; Sl 57.10; 86.5, e os poetas de Israel se dedicam em entoar canções descrevendo-a como duradoura e eterna, 1 Cr 16.34; 2 Cr 7.6; Sl 136; Ed 3.11. No Novo Testamento é muitas vezes mencionada ao lado da graça de Deus, especialmente nas saudações, 1 Tm 1.2; 2 Tm 1.1; Tt 1.4. Repetidamente se nos diz que essa perfeição divina é demonstrada para com os que temem a Deus, ex 20.2; Dt 7.9; Sl 86.5; Lc 1.50. Não significa, porém, que se limita a eles, conquanto a desfrutem em medida especial. As ternas misericórdias de Deus estão sobre todas as Suas obras, Sl 145.9, e até os que não O temem compartilham delas, Ez 18.23, 32; 33.11; Lc 6.35, 36. Não se pode apresentar a misericórdia de Deus como oposta à Sua justiça. Ela é exercida somente em harmonia com a mais estrita justiça de Deus, em vista dos méritos de Jesus Cristo. Outros termos empregados para expressar a misericórdia de Deus são “piedade”, “compaixão”, “benignidade”. e. A longanimidade de Deus. A longanimidade de Deus é ainda outro aspecto da Sua grande bondade ou amor. O hebraico emprega a expressão ‘erek ‘aph, que significa literalmente “grande de rosto” e daí também “lento para a ira”, enquanto que o grego expressa a mesma idéia com a palavra makrothymia. É o aspecto da bondade ou amor de Deus em virtude do qual Ele tolera os rebeldes e maus, a despeito da sua prolongada desobediência. No exercício deste atributo o pecador é visto como permanecendo em pecado, não obstante as admoestações e advertências que lhe vêm. Revela-se no adiantamento do merecido julgamento. A Escritura fala da longanimidade de Deus em Êx 34.6; Sl 86.15; Rm 2.4; 1 Pe 3.20; 2 Pe 3.15. Um termo sinônimo, com uma conotação ligeiramente diversa, é a palavra “paciência”. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.66)

A SANTIDADE DE DEUS

A palavra hebraica para “ser santo”, qadash, deriva da raiz qad, que significa cortar ou separar. É uma das palavras religiosas mais proeminentes do Velho Testamento, e é aplicada primariamente a Deus. A mesma idéia é comunicada pelas palavras hagiazo e hagios, no Novo Testamento. Disto já se vê que não é correto pensar na santidade primariamente como uma qualidade moral ou religiosa, como geralmente se faz. Sua idéia fundamental é a de uma posição ou relação existente entre Deus e uma pessoa ou coisa. a. Sua natureza. A idéia escriturística da santidade de Deus é dupla. Em sentido original denota que Ele é absolutamente distinto de todas as Suas criaturas, e é exaltado acima delas em majestade infinita. Assim entendida, a santidade de Deus é um dos Seus atributos transcendentais e às vezes é mencionada como a Sua perfeição central e suprema. Não parece próprio falar de um atributo de Deus como sendo mais central e mais fundamental que outro; mas, se fosse permissível isto, a ênfase da Escritura à santidade de Deus pareceria justificar a sua escolha. Contudo, é evidente que, neste sentido da palavra, a santidade não é realmente um atributo moral, que possa ser coordenado com outros, como o amor, a graça e a misericórdia, mas é antes uma coisa de amplitude igual à de todos os predicados de Deus e a eles aplicável. Ele é santo em tudo aquilo que O revela, em Sua graça e bondade como também em Sua ira e justiça. Pode-se-lhe chamar “majestade-santidade” de Deus e passagens como ex 15.11; 1 Sm 2.2; Is 57.15 e Os 11.9 se referem a ela. É a santidade de Deus que Otto, em sua importante obra sobre o Santo (Das Heilige), considera como aquilo que é mais essencial em Deus, e que ele designa como “o numinoso”. Ele a considera como parte do não-racional em Deus, em que não se pode pensar conceptualmente, e que inclui idéias como “inacessibilidade absoluta” e “domínio absoluto” ou “majestade temível”. Desperta no homem um sentimento de nulidade absoluta, uma “consciência” ou “sentimento de condição de criatura” que leva a um auto-rebaixamento absoluto. Mas a santidade de Deus tem também um aspecto especificamente ético na Escritura, e é neste seu aspecto que estamos mais interessados nesta conexão. A idéia ética da santidade divina não pode ser dissociada da idéia da majestade-santidade de Deus. Aquela desenvolve-se a partir desta. A idéia fundamental da santidade ética de Deus também é a de separação, mas, neste caso, a separação é do mal moral, isto é, do pecado. Em virtude da sua santidade, Deus não pode ter comunhão com o pecado, Jô 34.10; Hc 1.13. Empregada neste sentido, a palavra “santidade” indica a pureza majestosa de Deus, ou a Sua majestade ética. Mas a idéia de santidade não é meramente negativa (separação do pecado); tem igualmente um conteúdo positivo, a saber, o de excelência moral, ou perfeição ética. Se o homem reage à santidade majestosa de Deus com um sentimento de completa insignificância e temor, sua reação à santidade ética revela-se num senso de impureza, numa consciência de pecado, Is 6.5. Otto reconhece também este elemento na santidade de Deus, embora acentue o outro, e a respeito da resposta ele diz: “O simples temor, a simples necessidade de refúgio face ao ‘tremendum’, elevou-se aqui ao sentimento de que o homem, em sua condição de ‘profano’, não é digno de ficar na presença do Santo, e de que a sua inteira indignidade pessoal poderia contaminar até mesmo a própria santidade”. Esta santidade ética de Deus pode ser definida como a perfeição de Deus, em virtude da qual Ele eternamente quer manter e mantém a Sua excelência moral, aborrece o pecado, e exige pureza moral em Suas criaturas. b. Sua manifestação. A santidade de Deus é revelada na lei moral implantada no coração do homem e que fala por meio da consciência e, mais particularmente, na revelação especial de Deus. Expressa-se proeminentemente na lei dada a Israel. Essa lei, em todos os seus aspectos, foi planejada para imprimir em Israel a idéia da santidade de Deus, e para leva-lo a sentir fortemente a necessidade de levar vida santa. A este propósito atendem símbolos e tipos como a nação, a terra santa, a cidade santa, o lugar santo e o sacerdócio santo. Além disso, foi revelada na maneira como Deus recompensava a observância da lei e visitava os transgressores com terríveis punições. A suprema revelação da santidade de Deus foi dada em Jesus Cristo, que é chamado “o Santo e o Justo”, At 3.14. Ele refletiu em Sua vida a perfeita santidade de Deus. Finalmente, a santidade de Deus é também revelada na Igreja como o corpo de Cristo. É um fato notável, para o qual muitas vezes se chama a atenção, que se atribui santidade a Deus com muito maior freqüência no Velho Testamento que no Novo, conquanto isto seja feito ocasionalmente no Novo Testamento, Jo 17.11; 1 Pe 1.16; Ap 4.8; 6.10. Isto se deve provavelmente ao fato de que o Novo Testamento destina mais particularmente o termo para qualificar a terceira Pessoa da Trindade Santa como Aquele cuja tarefa especial, na economia da redenção, consiste em comunicar santidade ao Seu povo. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 67)

A JUSTIÇA DE DEUS

Este atributo relaciona-se estreitamente com o da santidade de Deus. Shedd fala da justiça de Deus como “um modo de Sua santidade”, e Strong lhe chama simplesmente “santidade transitiva”. Contudo, estes termos só se aplicam à geralmente denominada justiça relativa de Deus, em distinção de Sua justiça absoluta. a. A idéia fundamental de justiça. A idéia fundamental de justiça é a de estrito apego à lei. Entre os homens ela pressupõe que há uma lei à qual eles devem ajustar-se. Às vezes se diz que não podemos falar de justiça em Deus, porque não há lei à qual Ele esteja sujeito. Mas, embora não haja lei acima de Deus, certamente há uma lei na própria natureza de Deus, e esta constitui o mais elevado padrão possível, pelo qual todas as outras leis são julgadas. Geralmente se faz distinção entre a justiça absoluta de Deus e a relativa. Aquela é a retidão da natureza divina, em virtude da qual Deus é infinitamente reto em Si mesmo, enquanto que esta é a perfeição de Deus pela qual Ele se mantém contra toda violação da Sua santidade e mostra, em tudo e por tudo, que Ele é Santo. É a esta retidão que o termo “justiça” se aplica mais particularmente. A justiça se manifesta especialmente em dar a cada homem o que lhe é devido, em trata-lo de acordo com os seus merecimentos. A inerente retidão de Deus é naturalmente básica para a retidão que Ele revela no trato de Suas criaturas, mas é especialmente esta última, também denominada justiça de Deus, que requer especial consideração aqui. Os termos hebraicos para “justo” e “justiça” são tsaddik, tsedhek e tsedhakah, e os termos gregos correspondentes são dikaios e dikaiosyne, todos os quais contêm a idéia de conformidade a um padrão. Esta perfeição é repetidamente atribuída a Deus na Escritura, Ed 9.15; Ne 9.8; Sl 119.137; 145.17; Jr 12.1; Lm 1.18, Dn 9.14; Jo 17.25; 2 Tm 4.8; 1 Jo 2.29; 3.7; Ap 16.5. b. Distinções aplicadas à justiça de Deus. Há em primeiro lugar uma justiça rectoral de Deus. Esta justiça, como está implícito no nome, é a retidão que Deus manifesta como o Governador que exerce domínio tanto sobre o bem como sobre o mal. Em virtude de Sua justiça rectoral, Deus instituiu um governo moral no mundo, e impôs ao homem uma lei justa, com promessas de recompensa ao obediente e ameaças de punição ao transgressor. No Velho Testamento Deus sobressai proeminentemente como o Legislador de Israel, Is 33.11, e do povo em geral, Tg 4.12, e Suas leis são justas, Dt 4.8. A Bíblia refere-se a esta obra rectoral de Deus também em Sl 99.4 e Rm 1.32. Estreitamente relacionada com a justiça rectoral de Deus está a Sua justiça distributiva. Este termo habitualmente serve para designar a retidão de Deus na execução da lei, e se relaciona com a distribuição de recompensas e punições, Is 3.10, 11; Rm 2.6; 1 Pe 1.17. É de duas classes: (1) Justiça remunerativa, que se manifesta na distribuição de recompensas a homens e anjos, Dt 7.9, 12, 13; 2 Cr 6.16; Sl 58.11; Mq 7.20; Mt 25.21, 34; Rm 2.7; Hb 11.26. É realmente uma expressão do amor divino distribuindo a Sua generosidade, não com base em méritos propriamente ditos, pois a criatura não pode dar prova de nenhum mérito absoluto diante do Criador, mas segundo promessa e acordo, Lc 17.10; 1 Co 4.7. As recompensas de Deus são fruto da sua graça e decorrem de uma relação pactual estabelecida por ele. (2) Justiça retributiva, que se relaciona com a imposição de castigos. É uma expressão da ira divina. Enquanto que num mundo isento de pecado não haveria lugar para a sua aplicação, necessariamente tem proeminente lugar num mundo cheio de pecado. A Bíblia em geral dá mais ênfase à recompensa dos justos que à punição dos ímpios; mas mesmo esta é bastante proeminente, Rm 1.32; 12.19; 2 Ts 1.8, e muitas outras passagens. Deve-se notar que, ao passo que o homem não merece a recompensa que recebe, merece a punição que lhe é dada. A justiça divina está originária e necessariamente obrigada a punir o mal, não porém a recompensar o bem, Lc 17.10; 1 Co 4.7; Jo 41.11. Muitos negam a estrita justiça punitiva de Deus e alegam que Deus pune o pecador para reforma-lo, ou para dissuadir outros de pecar; mas estas posições não são sustentáveis. O propósito primordial da punição do pecado é a manutenção do direito e da justiça. É certo que ela pode, incidentalmente, servir para reformar o pecador e impedir que outros pequem, e, secundariamente, isso pode estar incluído em seus propósitos. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 69)

Atributos de Soberania

A soberania de Deus recebe forte ênfase na Escritura. Ele é apresentado como o Criador, e Sua vontade como a causa de todas as coisas. Em virtude de Sua obra criadora, o céu, aterra e tudo o que eles contêm Lhe pertencem. Ele está revestido de autoridade absoluta sobre as hostes celestiais e sobre os moradores da terra. Ele sustenta todas as coisas com a Sua onipotência, e determina os fins que elas estão destinadas a cumprir. Ele governa como Rei no sentido mais absoluto da palavra, e todas as coisas dependem dele e Lhe são subservientes. As provas bíblicas da soberania de Deus são abundantes, mas aqui nos limitaremos a referir-nos a algumas das passagens mais significativas: Gn 14.19; Ex 18.11; Dt 10.14, 17; 1 Cr 29.11, 12; 2 Cr 20.6; Ne 9.6; Sl 22.28; 47.2, 3, 7, 8; Sl 50.10-12; 95.3-5; 115.3; 135.5, 6; 145.11-13; Jr 27.5; Lc 1.53; At 17.24-26; Ap 19.6. Dois dos atributos requerem discussão sob este título, a saber, (1) a vontade soberana de Deus, e (2) o poder soberano de Deus. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.69)

A VONTADE SOBERANA DE DEUS

a. A vontade de Deus em geral. A Bíblia emprega várias palavras para indicar a vontade de Deus, a saber, as palavras hebraicas chaphets, tsebhu e raston, e as palavras gregas boule e thelema. A importância da vontade divina aparece de várias maneiras na Escritura. É apresentada como a causa final de todas as coisas. Tudo é derivado dela: a criação e a preservação, Sl 135.6; Jr 18.6; Ap 4.11; o governo, Pv 21.1; Dn 4.35; a eleição e a reprovação, Rm 9.15, 16; Ef 1.11; os sofrimentos de Cristo, Lc 22.42; At 2.23; a regeneração, Tg 1.18; a santificação, Fp 2.13; os sofrimentos dos crentes, 1 Pe 3.17; a vida e o destino do homem. At 18.21; Rm 15.32; Tg 4.15, e até as menores coisas da vida, Mt 10.29. Daí, a teologia cristã sempre reconheceu a vontade de Deus como a causa última de todas as coisas, embora a filosofia às vezes mostre uma inclinação para procurar uma causa mais profunda no próprio Ser do Absoluto. Todavia, a tentativa de fundamentar tudo no próprio Ser de Deus geralmente redunda em panteísmo. A palavra “vontade”, no sentido em que é aplicada a Deus, nem sempre tem a mesma conotação na Escritura. Pode denotar (1) toda a natureza moral de Deus, incluindo atributos como amor, santidade, justiça, etc; (2) a faculdade de auto-determinação, isto é, o poder de determinar que o Eu siga um curso de ação ou formule um plano; (3) o produto desta atividade, isto é, o plano ou propósito predeterminado; (4) o poder de executar este plano e de realizar este propósito (a vontade em ação, ou seja, a onipotência); e (5) a regra de vida firmada para as criaturas racionais. É primariamente na vontade de Deus como a faculdade de autodeterminação que estamos interessados no momento. Esta pode ser definida como a perfeição do Seu Ser pela qual Ele, num ato sumamente simples, dirige-se a Si mesmo como o Sumo Bem (isto é, deleita-se em Si mesmo como tal) e as Suas criaturas por amor do Seu nome e, assim, é a base do ser e da continuada existência delas. Com referência ao universo e a todas as criaturas que ele contém, isto naturalmente inclui a idéia de causação. b. Distinções aplicadas à vontade de Deus. Têm-se aplicado várias distinções à vontade de Deus. Algumas destas encontraram pouco apoio da parte da teologia reformada, calvinista, como aconteceu com a distinção entre uma vontade de Deus antecedente e uma vontade conseqüente, e com a distinção entre uma vontade absoluta e uma condicional. Estas distinções não somente estavam expostas a uma compreensão errônea, mas de fato foram interpretadas de maneiras passíveis de objeção. Outras, porém, foram consideradas úteis e, portanto, foram aceitas mais geralmente. Estas podem ser asseveradas como segue: (1) A vontade decretatória de Deus e Sua vontade preceptiva. A primeira é a vontade de Deus pela qual ele projeta ou decreta tudo que virá a acontecer, quer pretenda realiza-lo efetivamente (causativamente), quer permita que venha a ocorrer por meio da livre ação das Suas criaturas racionais. A segunda é a regra de vida que Deus firmou para as Suas criaturas morais, indicando os deveres que lhes impõe. A primeira é realizada sempre, ao passo que a segunda é desobedecida com freqüência. (2) A vontade de eudokia e a vontade de eurestia. Esta divisão não se relaciona tanto com o propósito de fazer algo, mas principalmente com o prazer de fazer algo ou com o desejo de ver alguma coisa feita. Contudo, corresponde à divisão anterior, no fato de que a vontade de eudokia, como a do decreto, compreende aquilo que será realizado com certeza, enquanto que a vontade de eurestia, como a do preceito, abrange simplesmente o que Deus apraz que as Suas criaturas façam. A palavra eudokia só se refere ao bem, e não ao mal; cf. Mt 11.26; É incorreto dizer que o elemento de complacência ou deleite está sempre presente nela. (3) A vontade do beneplacitum e a vontade do signum. Aquela de novo denota a vontade de Deus como incorporada em Seu conselho oculto, enquanto não o torna conhecido por alguma revelação ou pelo próprio evento. Toda e qualquer vontade revelada torna-se um signum. Esta distinção visa a corresponder à que se faz entre a vontade decretatória de Deus e Sua vontade preceptiva, mas dificilmente se pode dizer que o faça. O beneplácito de Deus também acha expressão em Sua vontade preceptiva; e a decretatória às vezes também chega ao nosso conhecimento por meio de um signum. (4) A vontade secreta de Deus e Sua vontade revelada. Esta distinção é a mais comum. A primeira é a vontade do decreto de Deus, em grande medida oculta em Deus, enquanto que a segunda é a vontade do preceito, revelada na Lei e no Evangelho. A distinção baseia-se em Dt 29.29. A vontade secreta de Deus é mencionada em Sl 115.3; Dn 4.17, 25, 32, 35; Rm 9.18, 19; 11.33, 34; Ef 1.5, 9, 11; e Sua vontade revelada, em Mt 7.21; 12.50; Jo 4.34; 7.17; Rm 12.2. Esta última é acessível a todos, e não está longe de nós, Dt 30.14; Rm 10.8. A vontade secreta de Deus pertence a todas as coisas que Ele quer efetuar ou permitir, e que, portanto, São absolutamente fixas. A vontade revelada prescreve os deveres do homem e apresenta o modo pelo qual ele pode fruir as bênçãos de Deus. c. A liberdade da vontade de Deus. Freqüentemente se debate a questão se Deus, no exercício de Sua vontade, age necessária ou livremente. A resposta a esta questão requer cuidadosa discriminação. Exatamente como há uma scientia necessaria e uma scientia libera, há também uma voluntas necessaria (vontade necessária) e uma voluntas libera (vontade livre) em Deus. Deus mesmo é o objeto da primeira. Ele necessariamente quer a Si próprio e quer a Sua natureza santa, bem como as distinções pessoais da Divindade. Significa que Ele necessariamente se ama a Si próprio e tem prazer na contemplação e Suas perfeições. Todavia, Ele não está sob nenhuma compulsão, mas age de acordo com a lei do Seu Ser; e esta, conquanto necessária, é também a suprema liberdade. É mais que evidente que a idéia de causação está ausente neste ponto, e que a de complacência ou de auto-aprovação está no primeiro plano. As criaturas de Deus são, porém, os objetos da Sua voluntas libera. Deus determina voluntariamente o que e quem Ele criará, e os tempos, lugares e circunstâncias de suas vidas. Ele traça as veredas de todas as Suas criaturas racionais, determina o seu destino e as utiliza para os Seus propósitos. E embora as dote de liberdade, contudo Sua vontade lhes controla as ações. A Bíblia fala desta liberdade da vontade de Deus nos termos mais absolutos, Jo 11.10; 33.13; Sl 115.3; Pv 21.1; Is 10.15; 29.16; 45.9; Mt 20.15; Rm 9.15 – 18, 20, 21; 1 Co 12.11; Ap 4.11. A igreja sempre defendeu esta liberdade, mas também deu ênfase ao fato de que não pode ser considerada como indiferença absoluta. Duns Scotus falava de uma vontade de Deus em nenhum sentido determinada; mas esta idéia de uma vontade cega, agindo com perfeita indiferença, foi rejeitada pela igreja. A liberdade de Deus não é pura indiferença, mas autodeterminação racional. Deus tem Suas razões para querer como quer, razões que O induzem a escolher um fim e não outro, e uma série de meios para realizar um fim, em preferência a outros meios. Em cada caso há um motivo predominante, que torna o fim escolhido e os meios selecionados sumamente agradáveis a Ele, embora não sejamos capazes de determinar que motivo é esse. Em geral se pode dizer que Deus não pode querer nada que seja contrário à Sua natureza, à Sua sabedoria ou amor, à Sua justiça ou santidade. O dr. Bavinck assinala que raramente podemos discernir por que Deus quis uma coisa e não outra, e que não nos é possível, e tampouco permitido, procurar alguma base mais profunda que a vontade de Deus em que as coisas se fundam, porque todas as tentativas desse jaez redundam em procurar uma base para a criatura no próprio Ser de Deus, privando-o do seu caráter contingente e tornando-a necessária, eterna, divina. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.71)

A vontade de Deus em relação ao pecado

A doutrina da vontade de Deus muitas vezes dá surgimento a graves questões. Levantam-se aqui problemas que nunca foram resolvidos e que provavelmente são insolúveis para o homem. (1) Diz-se que, se a vontade decretatória de Deus determinou também a entrada do pecado no mundo, com isso Deus é o autor do pecado e realmente quer uma coisa contrária às Suas perfeições morais. Para fugirem à dificuldade, os arminianos dizem que a vontade de Deus, permitindo o pecado, depende do Seu pré-conhecimento do curso que o homem escolheria. Os teólogos reformados (calvinistas), embora mantendo, com base em passagens como At 2.23; 3.8; etc., que a vontade decretatória de Deus inclui também os atos pecaminosos do homem, sempre têm o cuidado de assinalar que se deve conceber isto de modo que não se faça de Deus o autor do pecado. Admitem francamente que não podem resolver a dificuldade, mas ao mesmo tempo fazem algumas valiosas distinções de comprovada utilidade. A maioria deles insiste em que a vontade de Deus quanto ao pecado é de permitir o pecado, e não de efetuá-lo, pois Ele realiza o bem moral. Esta terminologia é permissível, supondo-se que seja compreendida corretamente. Deve-se ter em mente que a vontade de Deus de permitir o pecado leva consigo a certeza de que o pecado virá a ocorrer. Outros chamam a tenção para o fato de que, embora os termos “vontade” e “querer” possam incluir a idéia de complacência ou deleite, às vezes indicam uma simples determinação da vontade; e que, portanto, a vontade de Deus de permitir o pecado não implica necessariamente que Ele tem deleite ou prazer no pecado. (2) Diz-se, ainda, que a vontade decretatória de Deus e Sua vontade preceptiva muitas vezes são contraditórias, que Sua vontade decretatória inclui muitas coisas que Ele proíbe em Sua vontade preceptiva, e exclui muitas coisas que Ele ordena em Sua vontade preceptiva, cf. Gn 22; Êx 4.21-23; 2 Rs 20.1-7; At 2.23. Todavia, é de grande importância sustentar tanto a vontade decretatória como a preceptiva, mas com o definido entendimento de que, embora nos pareçam diversas, são fundamentalmente uma só em Deus. Conquanto uma solução perfeitamente satisfatória da dificuldade esteja fora de questão no presente, podemos aproximar-nos de uma solução. Quando falamos da vontade decretatória e da vontade preceptiva de Deus, empregamos a palavra “vontade” em dois sentidos diferentes. Pela primeira, Deus determinou o que Ele fará ou o que virá a acontecer; na segunda Ele nos revela o que estamos na obrigação de fazer. Ao mesmo tempo, devemos lembrar-nos de que a lei moral, a regra do nosso viver, é também, em certo sentido, a encarnação da vontade de Deus. É uma expressão da Sua natureza santa e daquilo que esta naturalmente requer de todas as criaturas morais. Daí, outra observação pode ser acrescentada à anterior. A vontade decretatória e a vontade preceptiva de Deus não estão em conflito no sentido de que na primeira Ele tem prazer no pecado e na segunda não; nem no sentido de que, de acordo com a primeira, Ele não quer a salvação de todos os indivíduos como uma violação positiva, e de acordo com a segunda, quer. Mesmo de acordo com a vontade decretatória Deus não tem prazer no pecado; e mesmo de acordo com a vontade preceptiva Ele não quer a salvação de todos os indivíduos com uma volição positiva. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg.72)

O PODER SOBERANO DE DEUS

A soberania de Deus acha expressão, não somente na vontade divina, mas também na onipotência de Deus, ou em Seu poder de executar a Sua vontade. Pode-se denominar o poder de Deus a eficaz energia da Sua natureza, ou a perfeição do Seu Ser pela qual Ele é a causalidade absoluta e suprema. É costume distinguir entre uma potentia Dei absoluta (um absoluto poder de Deus) e uma potentia Dei ordinata (poder ordenado de Deus). Contudo, a teologia reformada, calvinista, rejeita esta distinção no sentido em que a entendiam os escolásticos, que afirmavam que Deus, em virtude do Seu poder absoluto, pode efetuar contradições, e pode até pecar e aniquilar-se a Si próprio. Ao mesmo tempo, adota a distinção como expressão de uma verdade real, embora nem sempre a apresente do mesmo modo. De acordo com Hodge e Shedd, o poder absoluto é a eficiência divina, exercida sem a intervenção de causas secundárias; enquanto que o poder ordenado é a eficiência de Deus, exercida pela ordenada operação de causas secundárias. O conceito mais geral é exposto por Charnock como segue: “Absoluto é o poder pelo qual Deus é capaz de fazer o que Ele não fará, mas que tem possibilidade de ser feito; ordenado é o poder pelo qual Deus faz o que decretou fazer, isto é, o que Ele ordenou ou marcou para ser posto em exercício; os quais não são poderes distintos, mas um e o mesmo poder. O Seu poder ordenado é parte do Seu poder absoluto; pois se Ele não tivesse poder para fazer tudo o que pudesse desejar, não teria poder para fazer tudo que deseja”. A potentia ordinata pode ser definida como a perfeição de Deus pela qual Ele, mediante o simples exercício da Sua vontade, pode realizar tudo quanto está presente em Sua vontade ou conselho. O poder de Deus, em seu exercício fatual, limita-se àquilo que o Seu decreto eterno abrange. Mas o exercício fatual do poder de Deus não representa os seus limites. Deus poderia fazer mais que isso, se fosse esta a Sua intenção. Nesse sentido podemos falar em potentia absoluta, ou poder absoluto de Deus. Deve-se manter esta posição contra aqueles que, como Schleiermacher e Strauss, sustentam que o poder de Deus se limita àquilo que Ele realiza de fato. Mas em nossa afirmação do poder absoluto de Deus precisamos acautelar-nos contra noções errôneas. A Bíblia nos ensina, por um lado, que o poder de Deus estende-se além daquilo que é realizado de fato, Gn 18.14; Jr 32.27; Zc 8.6; Mt 3.9; 26.53. Portanto, não podemos dizer que aquilo que Deus não realiza concretamente não Lhe é possível realizar. Mas, por outro lado, ela indica também que há muitas coisas que Deus não pode fazer. Ele não pode mentir, pecar, mudar, e não pode negar-se a Si próprio, Nm 23.19; 1 Sm 15.29; 2 Tm 2.13; Hb 6.18; Tg 1.13, 17. Não há poder absoluto nele, divorciado de Suas perfeições, e em virtude do qual Ele pudesse fazer todo tipo de coisas inerentemente contraditórias entre si. A idéia da onipotência de Deus é expressa pelo nome ‘El-Shaddai; e a Bíblia fala a seu respeito em termos que não deixam dúvida, em passagens como Jó 9.12; Sl 115.3; Jr 32.17; Mt 19.26; Lc 1.37; Rm 1.20; Ef 1.19. Deus manifesta o Seu poder na criação, Rm 4.17; Is 44.24; nas obras da providencia, Hb 1.3; e na redenção de pecadores, 1 Co 1.24; Rm 1.16. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Em que diferentes sentidos podemos falar da presciência de Deus? 2. Como os arminianos concebem esta presciência? 3. Quais as objeções à idéia jesuítica de uma scientia media? 4. Como devemos julgar a ênfase moderna ao amor de Deus como o atributo divino central e absolutamente determinante? 5. Que concepção tem Otto de “o Santo” e, Deus? 6. Qual a objeção à posição de que os castigos impostos por Deus servem simplesmente para reformar o pecador, ou dissuadir outros de pecar? 7. Como os socinianos e Grócio concebem a justiça retributiva de Deus? 8. É correto dizer que Deus pode fazer tudo, em virtude de sua onipotência? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. II p. 171-259; Kuyper, Dict. Dogm. De Deo I, p. 355-417; Vos, Geref. Dogm. I, p. 2-36; Hodge, Syst. Theol. I, p. 393-441; Shedd, Dogm. Theol. I, p. 359-392; Dabney, Syst. And Polem. Theol., p. 154-174; pope, Chr. Theol. I, p. 307-358; Watson, Theol. Inst., Part II Chap. II; Wilmers, Handbook of the Chr. Religion, p. 171-181; Harris, God, Creator and Lord of All I, p. 128-209; Charnock, The Existence and Attributes of God, Discourse III, VII-IX; Bates, On the Attributes; Clarke, The Christian Doctrine of God, p. 56-115; Snowden, The Personality of God; Adeney, The Christian Conception of God, p. 86-152; Macintosh, Theology as an Empirical Science, p. 159-194; Strong, Syst. Theol., p. 282-303. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 75)

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

A Trindade Santa

A. A Doutrina da Trindade na História A doutrina da trindade sempre enfrentou dificuldades e, portanto, não é de admirar que a igreja, em seus esforços para formulá-la, tenha sido repetidamente tentada a racionaliza-la e a dar-lhe uma construção que deixava de fazer justiça aos dados da Escritura. 1. PERÍODO DA PRÉ-REFORMA. Os judeus do tempo de Jesus davam muita ênfase à unidade de Deus, e esta ênfase foi trazida para dentro da igreja cristã. O resultado foi que alguns eliminaram completamente as distinções pessoais da Divindade, e que outros não fizeram plena justiça à divindade essencial da segunda e da terceira pessoas da Trindade Santa. Tertuliano foi o primeiro a empregar o termo “Trindade” e a formular a doutrina, mas a sua formulação foi deficiente, desde que envolvia uma infundada subordinação do Filho ao Pai. Orígenes foi mais longe nesta direção, ensinando explicitamente que o Filho é subordinado ao Pai quanto à essência, e que o Espírito Santo é subordinado até mesmo ao Filho. Ele desacreditou a divindade essencial destas duas pessoas do Ser Divino e forneceu um ponto de partida aos arianos, que negavam a divindade do Filho e do espírito Santo, apresentando o Filho como a primeira criatura do Pai, e o Espírito Santo como a primeira criatura do Filho. Assim, a consubstancialidade do Filho e do Espírito Santo com o Pai foi sacrificada, com o fim de preservar a unidade; e, segundo esse conceito, as três pessoas da Divindade diferem em grau de dignidade. Os arianos ainda conservaram resquícios da doutrina das três pessoas da Divindade, mas esta foi inteiramente sacrificada pelo monarquianismo, em parte no interesse da unidade de Deus e em parte para manter a divindade do Filho. O monarquianismo dinâmico via em Jesus apenas homem e no espírito Santo uma influencia divina, enquanto que o monarquianismo modalista considerava o Pai, o Filho e o Espírito Santo meramente como três modos de manifestação assumidos sucessivamente pela Divindade. Por outro lado, também houve alguns que a tal ponto perderam de vista a unidade de Deus, que acabaram no triteísmo. Alguns dos monofisistas mais recentes, como João Ascunages e João Philopono, caíram neste erro. Durante a Idade Média, o nominalista Roscelino foi acusado do mesmo erro. A igreja começou a formular a sua doutrina da Trindade no século quarto. O Concílio de Nicéia (325 A.D.) declarou que o Filho é co-essencial com o Pai, enquanto que o Concílio de Constantinopla (381 A.D.) afirmou a divindade do Espírito, embora não com a mesma precisão. Quanto à interrelação dos três, foi oficialmente declarado que o Filho é gerado pelo Pai, e que o Espírito procede do Pai e do Filho. No Oriente, a doutrina da Trindade encontrou a sua proposição mais completa na obra de João de Damasco, e no Ocidente, na grande obra de Agostinho, De Trinitate. A primeira ainda retém um elemento de subordinação, inteiramente eliminado pela segunda. 2. PERÍODO DA PÓS-REFORMA. Depois da Reforma não temos maior desenvolvimento da doutrina da Trindade, mas o que encontramos repetidamente são algumas das errôneas formulações antigas. Os arminianos, Episcópio, Curceleu e Limborgh reavivaram a doutrina da subordinação, outra vez, ao que parece, principalmente para defender a unidade da Trindade. Eles atribuíram ao Pai uma certa preeminência sobre as outras pessoas – em ordem, dignidade e poder. Posição um tanto parecida foi tomada por Samuel Clarke, na Inglaterra, e pelo teólogo luterano Kahnis. Outros seguiram o caminho indicado por Sabélio, ensinando uma espécie de modalismo, como, por exemplo, Emanuel Swedenborg, que sustentava que o eterno Deus-homem fez-se carne no Filho, e agia através do Espírito Santo; Hegel, que fala do Pai como Deus em Si, do Filho como Deus se objetivando, e do Espírito como Deus retornando a Si mesmo; e Schleiermacher, que considera as três pessoas simplesmente como três aspectos de Deus: o Pai é Deus como a subjacente unidade de todas as coisas, o Filho é Deus como passando a uma personalidade consciente no homem, e o Espírito Santo é Deus vivendo ma igreja. Os socinianos da época da reforma seguiam as linhas arianas, mas foram além de Ário, pois para eles Cristo era simples homem e o Espírito Santo apenas um poder ou influencia. Eles foram os precursores dos unitários e também dos teólogos modernistas, que falam de Jesus como um mestre divino e identificam o Espírito Santo com o Deus imanente. Finalmente, também houve alguns que, como consideravam ininteligível a afirmação da doutrina de uma Trindade ontológica, queriam livrar-se dela e se satisfizeram com a doutrina de uma Trindade econômica, uma Trindade como se vê revelada na obra de redenção e na experiência humana. Exemplos de defensores desta idéia são Moses Stuart, W. L. Alexander e W. A. Brown. Durante um considerável período de tempo, declinou o interesse pela doutrina da Trindade, e a discussão teológica centralizou-se mais particularmente na personalidade de Deus. Brunner e Barth chamaram de novo a atenção para a sua importância. Este último a coloca em primeiro plano, discutindo-a em conexão com a doutrina da revelação, e lhe dedica 220 páginas da sua Dogmática. Materialmente, ele deriva da Escritura a doutrina, mas formal e logicamente, acha que ela está envolvida na simples sentença, “Deus fala”. Ele é Revelador (Pai), Revelação (Filho) e Revelatura (Espírito Santo). Ele se revela, é a Revelação e é também o conteúdo da Revelação. Deus e Sua revelação se identificam. Em Sua revelação Ele continua sendo Deus, absolutamente livre e soberano. Esta idéia de Barth não é uma espécie de sabelianismo, pois ele reconhece três pessoas na Divindade. Além disso, ele não admite nenhuma subordinação. Diz ele: “Assim, ao mesmo Deus que, em unidade incólume, é Revelador, Revelação e Revelatura, também se atribui, em Sua variedade incólume, precisamente este modo tríplice de existência”. (Teologia Sistemática – Loius Berkhof. Pg. 76) B. Deus como Trindade em Unidade A palavra “Trindade” não é tão expressiva como a palavra holandesa “Drieenheid”, pois pode simplesmente denotar o estado tríplice (ser três), sem qualquer implicação quanto à unidade dos três. Geralmente se entende, porém, que, como, termo técnico na teologia, inclui essa idéia. Mesmo porque, quando falamos da Trindade de Deus, nos referimos a uma trindade em unidade, e a uma unidade que é trina. 1. A PERSONALIDADE DE DEUS E A TRINDADE. Como acima foi exposto, os atributos comunicáveis de Deus salientam a Sua personalidade, desde que O revelam como um Ser moral bem como racional. Sua vida se nos apresenta claramente na Escritura como uma vida pessoal; e naturalmente, é da maior importância sustentar a verdade da personalidade de Deus, pois, sem ela não pode haver religião no real sentido da palavra: nem oração, nem comunhão pessoal, nem entrega confiante, nem confiante esperança. Visto que o homem foi criado à imagem de Deus, podemos compreender algo da vida pessoal de deus pela observação da personalidade como a conhecemos no homem. Contudo, precisamos ter o cuidado de não estabelecer a personalidade humana como padrão pelo qual avaliar a personalidade de Deus.A forma original da personalidade não está no homem, mas Deus; Sua personalidade é arquetípica, ao passo que a do homem é ectípica. Esta não é idêntica àquela, mas contém tênues traços de similaridade com ela. Não devemos dizer que o homem é pessoal e Deus é superpesssoal (expressão deveras infeliz), pois o que é superpessoal não é pessoal; ao invés disso, devemos dizer que, aquilo que aparece como imperfeito no homem, existe com infinita perfeição em Deus. A grande diferença entre ambos é que o homem é unipessoal, enquanto que Deus é tripessoal. E esta existência tripessoal é uma necessidade do Ser Divino, e em nenhum sentido resulta de uma escolha feita por Deus, Ele não poderia existir em nenhuma outra forma que não a forma tripessoal. Esta verdade tem sido defendida de várias maneiras. Uma argumentação muito comum em seu favor provém da própria idéia de personalidade. Shedd baseia o seu argumento na auto consciência geral do Deus triúno, como distinta da autoconsciência individual e particular de cada uma das Pessoas da Divindade, pois na autoconsciência o sujeito tem que se conhecer a si mesmo como objeto, e também percebe que o faz. Isso é possível em Deus em razão de Sua existência trina. Argumenta Shedd que Deus não poderia contemplar-se a Si mesmo, conhecer-se e comunicar-se Consigo mesmo, se não fosse trino em sua constituição. Bartlett apresenta de maneira interessante várias considerações para provar que Deus é necessariamente tripessoal. A argumentação que parte da personalidade, para provar ao menos que há pluralidade em Deus, pode ser expressa de forma semelhante a esta: Entre os homens o ego só se desperta para a consciência por meio do contato com o não-ego. A personalidade não se desenvolve nem existe na isolação, mas somente associada a outras pessoas. Daí, não é possível conceituar a personalidade de Deus independentemente de uma associação de pessoas iguais nele. Seu contato com Suas criaturas não se explica a Sua personalidade, do mesmo modo como o contato do homem com os animais não explica a sua personalidade. Em virtude da existência tripessoal de Deus, há uma infinita plenitude da vida divina nele. Paulo fala desta pleroma (plenitude) da Divindade em Ef 3.19 e Cl 1.9; 2.9. Em vista do fato de que há três pessoas em Deus dizer que Deus é pessoal é melhor do que falar dele como uma Pessoa. (Teologia Sistemática – Loius Berkhof. Pg. 78) 2. PROVA BÍBLICA DA DOUTRINA DA TRINDADE. A doutrina da Trindade depende decisivamente da revelação. É verdade que a razão humana pode sugerir algumas idéias para consubstanciar a doutrina, e que os homens, fundados em bases puramente filosóficas, por vezes abandonaram a idéia de uma unidade nua e crua em Deus, e apresentaram a idéia do movimento vivo e de auto-distinção. Também é verdade que a experiência cristã parece exigir algo parecido com esta construção da doutrina de Deus. Ao mesmo tempo, é uma doutrina que não teríamos conhecido, nem teríamos sido capazes de sustentar com algum grau de confiança, somente com base na experiência, e que foi trazida ao nosso conhecimento unicamente pela auto-revelação especial de Deus. Portanto, é de máxima importância reunir suas provas escriturísticas. a. Provas do Velho Testamento. Alguns dos primeiros pais da igreja, assim chamados, e mesmo alguns teólogos mais recentes, desconsiderando o caráter progressivo da revelação de Deus, opinaram que a doutrina da Trindade foi revelada completamente no Velho Testamento. Por outro lado, o socinianos e os arminianos eram de opinião que não há nada desta doutrina ali. Tanto aqueles como estes estavam enganados. O Velho Testamento não contém plena revelação da existência trinitária de Deus, mas contém várias indicações dela. É exatamente isto que se poderia esperar. A Bíblia nunca trata da doutrina da Trindade como uma verdade abstrata, mas revela a subsistência trinitária, em suas várias relações, como uma realidade viva, em certa medida em conexão com as obras da criação e da providência, mas particularmente em relação à obra de redenção. Sua revelação mais fundamental é revelação dada com fatos, antes que com palavras. E esta revelação vai tendo maior clareza, na medida em que a obra redentora de Deus é revelada mais claramente, como na encarnação do Filho e no derramamento do Espírito.E quanto mais a gloriosa realidade da Trindade é exposta nos fatos da história, mais claras vão sendo as afirmações da doutrina. Deve-se a mais completa revelação da Trindade no Novo Testamento ao fato de que o Verbo se fez carne, e que o Espírito Santo fez da igreja Sua habitação. Têm-se visto, por vezes, provas da Trindade na distinção entre Jeová e Elohim, e também no Plural Elohim, mas a primeira não tem nenhum fundamento, e a última é, para dizer o mínimo, duvidosa, embora ainda defendida por Rottenberg, em sua obra sobre De Triniteit in Israels Godsbegrip É muito mais plausível entender que as passagens em que Deus fala de Si mesmo no plural, Gn 1.26; 11.7, contêm uma indicação de distinções pessoais em Deus, conquanto não surgiram uma triplicidade, mas apenas uma pluralidade de pessoas. Indicações mais claras dessas distinções pessoais acham-se nas passagens que se referem ao Anjo de Jeová que, por um lado, é identificado com Jeová e, por outro, distingue-se dele. Ver Gn 16.7-13; 18.1.21; 19.1-28; Ml 3.1. E também nas passagens em que a Palavra e a Sabedoria de Deus são personificadas, Sl 33.4, 6; Pv 8.12-31. Em alguns casos mencionam-se mais de uma pessoa, Sl 33.6; 45.6, 7 (com. Hb 1.8,9), e noutros quem fala é Deus, que menciona o Messias e o Espírito, ou quem fala é o Messias, que menciona Deus e o Espírito, Is 48.16; 61.1; 63. 9,10. Assim, o Velho Testamento contém clara antecipação da revelação mais completa da Trindade no Novo Testamento. b. Provas do Novo Testamento. O Novo Testamento traz consigo uma revelação mais clara das distinções da Divindade. Se no Velho Testamento Jeová é apresentado como o Redentor e Salvador do Seu povo, Jó 19.25; Sl 19.14; 78.35; 106.21; Is 41.14; 43.3, 11, 14; 47.4; 49.7, 26; 60.16; Jr 14.3; 50.14; Os 13.3, no Novo Testamento e o Filho de Deus distingue-se nessa capacidade, Mt 1.21; Lc 1.76-79; 2.17; Jo 4,42; At 5.3; Gl 3.13; 4.5; Fl 3.30; Tt 2.13, 14. E se no Velho Testamento é Jeová que habita em Israel e nos corações dos que O temem, Sl 74.2; 135.21; Is 8.18; 57.15; Ez 43.7-9; Jl 3.17, 21; Zc 2.10, 11, no Novo testamento é o Espírito Santo que habita na igreja, At 2.4; Rm 8.9, 11; 1 Co 3.16; Gl 4.6; Ef 2.22; Tg 4.5 O Novo Testamento oferece clara revelação de Deus enviando Seu filho ao mundo, Jo 3.16; Gl 4.4; Hb 1.6; 1 Jo 4.9; e do pai e Filho enviando o Espírito, Jo 14.26; 15.26; 16.7; Gl 4.6. Vemos o pai dirigindo-se ao Filho, Mc 1.11; Lc 3.22, o Filho comunicando-se com o Pai, Mt 11.25, 26; 26.39; Jo 11.41; 12.27, 28, e o Espírito Santo orando a Deus nos corações dos crentes, Rm 8.26. Assim, as pessoas da Trindade, separadas, são expostas com clareza às nossas mentes. No batismo do Filho, o pai fala, ouvindo-se do céu a Sua voz, e o Espírito Santo desce na forma de pomba, Mt 3.16, 17. Na grande comissão Jesus menciona as três pessoas: “batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”, Mt 28.19. Também são mencionadas juntamente em 1 Co 12. 4-6; 2 Co 13.13; e 1 Pe 1.2. A única passagem que fala de tri-unidade é 1.Jo 5.7, mas sua genuinidade é duvidosa, razão pela qual foi eliminada das mais recentes edições críticas do Novo Testamento. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 80) 3. EXPOSIÇÃO DA DOUTRINA DA TRINDADE. Pode-se discutir melhor, e resumidamente, a doutrina da Trindade em conexão com várias proposições que constituem um epítome da fé professada pela Igreja sobre estes pontos. a. Há no Ser Divino apenas uma essência indivisível (ousia, essentia). Deus é um em Seu se essencial, ou seja, em Sua natureza constitucional. Alguns dos primeiros pais da Igreja empregavam o termo “substantia” como Sinônimo de “essentia”, mas os escritores mais recentes evitaram esse emprego do termo, em vista do fato de que na igreja latina “substantia” era o termo utilizado pra traduzir “hypostasis”, bem como “ousia” e, portanto, era ambíguo. No presente, muitas vezes os dois vocábulos são empregados um pelo outro. Não há objeção a isto, desde que se tenha em mente que eles têm conotações ligeiramente diversas. Shedd os distingue como segue: “Essência vem de esse, ser, e denota o ser ativo. Substância vem de substare, e denota a possibilidade latente do ser. ...O termo essência descreve Deus como a soma total das perfeições infinitas; o termo substância O descreve como a base subjacente das atividades infinitas. O primeiro é, comparativamente, uma palavra ativa; o último, uma palavra passiva. O primeiro é, comparativamente, um termo espiritual; o último, material. Falamos de substância material, não de essência material”. Desde que já foi discutida acima a unidade de Deus, não é necessário demorar-nos em minúcias no presente contexto. Esta proposição concernente à unidade de Deus baseia-se em passagens como Dt 6.4; Tg 2.19, sobre a existência autônoma e a imutabilidade de Deus, e no fato d que Ele é identificado com as Suas perfeições, como quando é chamado vida, luz, verdade, justiça, e assim por diante. b. Neste único Ser Divino Há três Pessoas ou subsistências individuais, o Pai e o Filho e o Espírito Santo. Provam-no as várias passagens já citadas como válidas para consubstanciar a doutrina da Trindade. Para indicar estas distinções da Divindade, os escritores gregos geralmente empregavam o termo hypostasis, enquanto que os autores latinos utilizavam o termo persona e, às vezes, substantia. Como aquele podia levar a mal-entendidos e este era ambíguo, os eruditos cunharam a palavra subsistência. A variedade dos termos empregados mostra que sempre se sentiu que são inadequados. Geralmente se admite que a palavra “pessoa” é apenas uma expressão imperfeita da idéia. Na linguagem comum ela designa um indivíduo racional e moral separado, dotado de consciência própria, e consciente da sua identidade em meio a todas as mudanças. A experiência ensina que onde temos uma pessoa, temos também uma essência individual distinta. Toda pessoa é um indivíduo distinto e separado, em quem a natureza é individualizada. Mas em Deus não há três indivíduos justapostos e separados uns dos outros, mas somente auto-distinções pessoais dentro da essência divina, que é não só genericamente, mas também numericamente, uma só. Conseqüentemente, muitos preferiram falar de três hipóstases em Deus, três diferentes modos, não de manifestação, como ensinava Sabélio, mas de existência ou de subsistência. Daí diz Calvino: “Então, com pessoa, quero dizer uma subsistência na essência divina – uma subsistência que, conquanto relacionada com as outras duas, distingue-se delas por suas propriedades incomunicáveis”. Isso é perfeitamente permissível e pode proteger-nos de entendimento errôneo, mas não deve levar-nos a perder de vista o fato de que as auto-distinções do Ser Divino implicam um “Eu” e “Tu” no Ser de Deus, que assumem relações pessoais uns com os outros. Ver Mt 3.16; 4.1; Jô 1.18; 3.16; 5.20-22; 14.26; 15.26; 16.13-15. c. Toda a indivisa essência de Deus pertence igualmente a cada uma das três pessoas. Quer dizer que a essência não é dividida entre as três pessoas, mas está com a totalidade absoluta da sua perfeição em cada uma das pessoas, de modo que têm unidade numérica de essência. A natureza divina distingue-se da natureza humana em que pode subsistir total e indivisivelmente em mais de uma pessoa. Enquanto que três pessoas humanas têm apenas unidade de natureza ou essência, isto é, participam da mesma espécie de natureza ou essência, as pessoas da Divindade têm unidade numérica de essência, isto é, possuem a mesma essência, essência idêntica. A natureza humana pode ser considerada como uma espécie, da qual cada homem tem ma parcela individual, de sorte que há uma unidade específica (termo derivado de “espécie”); mas a natureza divina é indivisível e, portanto, idêntica, nas pessoas da Divindade. É numericamente uma e a mesma, pelo que a unidade da essência das pessoas é uma unidade numérica. Segue-se daí que a essência divina não é uma existência independente justaposta paralelamente às três pessoas. Ela não tem existência à parte e fora das três pessoas. Se tivesse, não haveria verdadeira unidade, mas uma divisão que levaria ao tetrateísmo. A distinção pessoal é uma, dentro da essência divina. Esta tem, nos termos usualmente empregados, três modos de subsistência. Outra conclusão que se tira da anterior é que não pode haver subordinação de uma pessoa a outra da Divindade quanto ao ser essencial, e, portanto, nenhuma diferença na dignidade pessoal.deve-se defender esta verdade contra o subordinacionismo de Orígenes e doutros chamados “pais da igreja” primitivos, dos arminianos, de Clarke e doutros teólogos anglicanos. A única subordinação de que podemos falar é uma subordinação quanto à ordem e ao relacionamento. É especialmente quando refletimos na relação das três pessoas da essência divina, que todas as analogias nos falham e ficamos profundamente conscientes de que a Trindade é um mistério que ultrapassa a nossa possibilidade de compreensão. É a incompreensível glória da Divindade. Assim como a natureza humana é tão rica, em sua amplíssima plenitude, que não pode ser incorporada, toda ela, num só indivíduo, e só obtém adequada expressão na humanidade como um todo, também o Ser Divino só se revela em Sua plenitude em Sua tríplice subsistência de Pai e Filho e Espírito Santo. d. A subsistência e as operações das três pessoas do Ser Divino são assinaladas por certa ordem definida. Há uma certa ordem na Trindade ontológica.Quanto à subsistência pessoal o Pai é a primeira pessoa, o Filho é a segunda, e o Espírito Santo é a terceira. Mal se precisa dizer que esta ordem não pertence a nenhuma prioridade de tempo ou de dignidade essencial, mas somente à ordem de derivação lógica. O Pai não é gerado por nenhuma das outras duas pessoas, nem delas procede; o Filho é eternamente gerado pelo Pai, e o Espírito procede do Pai e do Filho desde a eternidade. A geração e a processão ocorrem dentro do Ser Divino, e implicam certa subordinação quanto ao modo da subsistência pessoal, não porém subordinação no que se refere à posse da essência divina. Esta Trindade ontológica e sua ordem inerente constitui a base metafísica da Trindade econômica. Portanto, nada mais natural que a ordem existente na Trindade essencial se reflita nas opera ad extra (obras externas ao ser essencial) que se atribuem mais particularmente a cada uma das pessoas. A Escritura indica claramente esta ordem nas chamadas praepositiones distinctionales, ek, dia, e en, utilizadas para expressar a idéia de que todas as coisas provêm do Pai, mediante o Filho, e no Espírito Santo. e. há certos atributos pessoais pelos quais se distinguem as três pessoas. Chamam-se também opera ad intra, porque são obras realizadas no interior do Ser Divino e não se finalizam na criatura. São operações pessoais, não realizadas pelas três pessoas juntas, e são incomunicáveis. A geração é um ato exclusivo do Pai, a filiação pertence exclusivamente ao Filho, e a processão só pode ser atribuída ao Espírito Santo. Como opera ad intra, estas obras se distinguem das opera ad extra, que são as atividades e efeitos pelos quais a Trindade se manifesta exteriormente. Nunca estas obras se devem exclusivamente a uma das pessoas, mas sempre são obras do Ser Divino completo. Ao mesmo tempo, é verdade que, na ordem econômica das obras de Deus, algumas das obras ad extra são atribuídas mais particularmente a uma pessoa, algumas mais especialmente a outra, e assim com cada uma das três pessoas divinas. Conquanto sejam obras das três pessoas conjuntamente, atribui-se a criação primariamente ao Pai, e redenção ao Filho e a santificação ao Espírito Santo. Esta ordem das operações divinas indica a ordem essencial de Deus e forma a base daquilo que geralmente se conhece como Trindade econômica. f. a igreja confessa que a Trindade é um ministério que transcende a compreensão do homem. A Trindade é um mistério, não somente no sentido bíblico de que se trata de uma verdade anteriormente oculta e depois revelada, mas também no sentido de que o homem não pode compreendê-la e não pode torná-la inteligível. É inteligível em algumas de suas relações e de seus modos de manifestação, mas é ininteligível em sua natureza essencial. Os numerosos esforços feitos para explicar o mistério foram especulativos, e não teológicos. Invariavelmente redundaram no desenvolvimento de conceitos triteístas ou modalistas de Deus, na negação ou da unidade da essência divina ou da realidade das distinções pessoais dentro da essência. A real dificuldade está na relação em que as pessoas da Divindade estão com a essência divina e uma com as outras; e esta é uma dificuldade que a igreja não é capaz de remover, podendo apenas tentar reduzi-la a suas apropriadas proporções mediante uma apropriada definição de termos. Ela jamais tentou explicar o mistério da Trindade, mas procurou somente formular a doutrina de modo que fossem evitados os erros que a ameaçam. 4. VÁRIAS ANALOGIAS SUGERIDAS PARA LANÇAR LUZ SOBRE O ASSUNTO. Desde os albores da era cristã fizeram-se tentativas para lançar luz sobre o Ser trinitário de Deus, sobre a trindade na unidade e a unidade na trindade, com analogias extraídas de várias fontes. Embora defeituosas, não se pode negar tiveram algum valor na discussão trinitária. Isto se aplica particularmente às analogias oriundas da natureza constitucional ou da psicologia do homem. Em vista do fato de que o homem foi criado à imagem de Deus, é simplesmente natural admitir que, se existem vestígios da vida trinitária nas criaturas, os mais claros deles hão de achar-se no homem. a. Algumas dessas analogias ou ilustrações foram tiradas da natureza inanimada e do reino vegetal, como a da água da nascente, o riacho e o rio, ou a do vapor subindo na atmosfera, a nuvem e a chuva, ou a da chuva, a neve e o gelo; e como a da árvore com a sua raiz, o seu tronco e os seus ramos. Estas e todas as demais ilustrações similares são muito defeituosas. É evidente que lhes falta inteiramente a idéia de personalidade; e conquanto exemplifiquem uma natureza ou substancia comum, não são exemplos de uma essência comum que esteja presente, não apenas em parte, mas em sua inteireza, em cada uma de suas partes ou formas constituintes. b. Outras, de maior importância, foram extraídas da vida do homem, particularmente da constituição da mente humana e seus processos. Estas foram consideradas especialmente relevantes porque o homem é portador da imagem de Deus. A esta classe pertencem as analogias da unidade psicológica de intelecto, afetos e vontade (Agostinho); da unidade lógica de tese, antítese e síntese (Hegel); e da unidade metafísica de sujeito, objeto e sujeito-objeto (Olshausen, Shedd). Em todos estes casos temos certa trindade numa unidade, mas nenhuma Tri-personalidade numa unidade de substancia. c. Tem-se chamado a atenção também para a natureza do amor, que pressupõe um sujeito e um objeto e requer a união de ambos, de modo que, quando o amor concretiza perfeitamente a sua obra, três elementos são incluídos. Mas é fácil ver que esta analogia é defeituosa, desde que coordena duas pessoas e um relacionamento. Não ilustra, absolutamente, uma tri-personalidade. Além disso, refere-se apenas a uma qualidade, e não a uma substancia possuída em comum pelo sujeito e pelo objeto. C. As Três Pessoas Consideradas Separadamente. 1. O PAI, OU A PRIMEIRA PESSOA DA TRINDADE a. O nome “Pai” em sua aplicação a Deus. Este nome nem sempre é empregado com relação a Deus com o mesmo sentido na Escritura. (1) Às vezes se aplica ao Deus Triúno como a origem de todas as coisas criadas, 1 Co 8.6; Ef 3.15; Hb 12.9; Tg 1.17. Conquanto nestes casos o nome se aplique ao Deus Triúno, refere-se mais particularmente à primeira pessoa, a quem a obra da criação é mais especialmente atribuída na Escritura. (2) Atribui-se também o nome ao Deus Triúno para expressar a relação teocrática que Ele mantém com Israel como o Seu povo no Velho Testamento, Dt 32.6; Is 63.16; 64.8; Jr 3.4; Ml 1.6; 2.10. (3) Mo Novo Testamento o nome é geralmente empregado para designar o Deus Triúno como Pai, num sentido ético, de todos os Seus filhos espirituais, Mt 5.45; 6.6-15; Rm 8.16; 1 Jo 3.1. (4) Num sentido inteiramente diverso, contudo, o nome é aplicado à primeira pessoa da Trindade em Sua relação com a segunda pessoa, Jô 1.14, 18; 5.17-26; 8.54; 14.12, 13. A primeira pessoa é o Pai da segunda num sentido metafísico. Esta é a paternidade originária de Deus, da qual toda paternidade terrena é apenas pálido reflexo. b. A propriedade distintiva do Pai. A propriedade pessoal do Pai, falando em termos negativos, consiste em que Ele não é gerado, e, em termos positivos consiste na geração do Filho e na espiração do Espírito Santo. É verdade que a espiração é obra do Filho também, mas neste, essa obra não se combina com a geração. Estritamente falando, a única obra exclusivamente peculiar ao Pai é a da geração ativa. c. As opera ad extra atribuídas mais particularmente ao Pai. Todas as opera ad extra de Deus são do Deus Triúno, mas nalgumas destas obras o Pai está em primeira plano, como nestas: (1) Planejando a obra de redenção, a eleição inclusive, da qual o próprio Filho era um objeto, Sl 2.7-9; 40.6-9; Is 53.10; Mt 12.32; Ef 1.3-6. (2) As obras da criação e da providência, principalmente em seus estágios iniciais, 1 Co 8.6; Ef 2.9. (3) A obra de representação da Trindade no Conselho da Redenção, como o Ser santo e justo, cujo direito foi violado, Sl 2.7-9; 40.6-9; Jô 6.37; 17.4-7. 2. O FILHO, OU A SEGUNDA PESSOA DA TRINDADE a. O nome “Filho” em sua aplicação à segunda pessoa. A segunda pessoa da Trindade é chamada “Filho” ou “Filho de Deus” em mais de um sentido do termo. (1) Num sentido metafísico. Deve-se sustentar isto contrariamente aos socinianos e aos unitários, que rejeitam a idéia de uma Divindade tripessoal, vêem em Jesus apenas um homem, e consideram o nome “Filho de Deus” a Ele aplicado, primariamente como um título honorário conferido a Ele. É muito evidente que Jesus Cristo é apresentado como o Filho de Deus na Escritura, independentemente de Sua posição e obra como Mediador. (a) Ele é mencionado como o Filho de Deus do ponto de vista da pré-encarnação, por exemplo em Jó 1.14, 18; Gl 4.4. (b) É chamado o “unigênito” Filho de Deus ou do pai, expressão que não se aplicaria a Ele, se Ele fosse o Filho de Deus somente num sentido oficial ou ético, Jo 1.14, 18; 3.16,18; 1 Jo 4.9. Comparar com 2 Sm 7.14; Jó 2.1; Sl 2.7; Lc 3.38; Jo 1.12. (c) Nalgumas passagens o contexto evidencia muito bem que o nome indica a divindade de cristo, Jô 5.18-25; Hb 1. (d) Embora Jesus ensine os Seus discípulos a falarem de Deus e a dirigir-se a Ele como “Pai nosso”, Ele mesmo fala dele chamando-lhe simplesmente “pai” ou “meu Pai”, e com isso mostra que estava cônscio de uma relação única, singular, com o Pai, Mt 6.9; 7.21; Jo 20.17. (e) De acordo com mt 11.27, Jesus, como o Filho de Deus, arroga-se um conhecimento único de Deus, conhecimento que ninguém mais pode possuir. (f) Os judeus certamente entendiam que Jesus afirmava que era o Filho de Deus num sentido metafísico; pois consideravam blasfêmia o modo como Ele falava de Si mesmo como o Filho de Deus, Mt 26.63; Jo 5.18; 10.36. - (2) Num sentido oficial ou messiânico. Nalgumas passagens este sentido é associado ao sentido mencionado acima. As passagens subseqüentes aplicam o nome “Filho de Deus” a Cristo como Mediador, Mt 8.29; 26.63 (onde este sentido vem ligado ao outro); 27.40; Jo 1.49; 11.27. Naturalmente, esta filiação e a messianidade se relacionam com a filiação originária de Cristo. É somente porque Ele era o Filho de Deus essencial e eterno, que podia ser chamado Filho de Deus como Messias. Além disso, a filiação e a messianidade refletem a filiação eterna de Cristo. É do ponto de vista desta filiação e messianidade que até Deus é chamado Deus do Filho, 2 Co 11.31; Ef 1.3, e às vezes é mencionado como Deus em distinção do Senhor, Jo 17.3; 1 Co 8.6; Ef 4.5, 6. (3) Num sentido natalício. Também se dá a Jesus o nome “Filho de Deus” em vista do fato de que deveu o Seu nascimento à paternidade de Deus. De acordo com a Sua natureza humana, ele foi gerado pela operação sobrenatural do Espírito Santo, e nesse sentido é o Filho de Deus. Lc 1.32, 35 o indica claramente, e provavelmente se pode inferir também de Jo 1.13. b. A subsistência pessoal do Filho. Deve-se defender a realidade da subsistência pessoal do Filho contra todos os modalistas que, de um modo ou de outro, negam as distinções pessoais da Divindade. Pode-se consubstanciar a doutrina da personalidade do Filho como segue: (1) O modo pelo qual a bíblia fala do pai e do Filho um ao lado do outro implica que um é tão pessoal como o outro, e também indica a existência de uma relação pessoal entre ambos. (2) O emprego dos apelativos “unigênito” e “primogênito” implica que a relação entre o pai e o Filho, conquanto singular, pode ser, não obstante, retratada aproximadamente como uma relação de geração e nascimento. O designativo “primogênito” encontra-se em Cl 1.15; Hb 1.6, e acentua o fato da geração eterna do Filho. Simplesmente significa que Ele já exista antes da criação dos céus e da terra. (3) O emprego distintivo do termo “Logos” na Escritura aponta na mesma direção. Este termo é aplicado ao Filho, em primeiro lugar não para expressar a Sua relação com o mundo (o que é absolutamente secundário), mas para indicar a Sua profunda relação com o Pai, relação como a que existe entre uma palavra e o orador que a profere. Diferentemente da filosofia a Bíblia apresenta o Logos como pessoal e o identifica com o Filho de Deus, Jo 1.1-14; 1 Jo 1.1-3. (4) A descrição do Filho como a imagem ou mesmo como a expressa imagem de Deus em 2 Co 4.4; Cl 1.15; Hb 1.3. Deus sobressai claramente na Escritura como um Ser pessoal. Se o Filho de Deus é a expressa imagem de Deus, necessariamente é uma pessoa também. c. A geração eterna do Filho. A propriedade característica do Filho consiste em que Ele é eternamente gerado do pai (resumidamente denominada “filiação”) e toma parte com o Pai na espiração do Espírito. A doutrina da geração do Filho é sugerida pela representação bíblica da primeira e da secunda pessoas da Trindade como estando na relação do pai e o Filho um com o outro. Não somente os nomes “Pai” e “Filho” sugerem a geração deste por aquele, mas também o Filho é repetidamente chamado “o Unigênito”, Jo 1.14, 18; 3.16, 18; 1 Jo 4.9. Várias particularidades merecem ênfase em conexão com a geração do Filho: (1) É um ato necessário de Deus. Orígenes, um dos primeiros a falar da geração do Filho, considerava-a como um ato dependente da vontade do Pai e, portanto, livre. Outros, em diversas ocasiões, expressaram a mesma opinião. Mas Atanásio e outros perceberam claramente que uma geração dependente da vontade facultativa do Pai tornaria contingente a existência do Filho e assim O privaria da Sua divindade. Então o Filho não seria igual e homoousios ao Pai, pois o Pai existe necessariamente e não pode ser entendido como não existente. A geração do Filho deve ser considerada como um ato necessário e perfeitamente natural de Deus. Não significa que este ato não esteja relacionado com a vontade do pai nalgum sentido da palavra. É um ato da vontade necessária do pai, o que significa simplesmente que a Sua vontade concomitante agrada-se perfeitamente com ele. (2) É um ato eterno do pai. Este ponto segue-se naturalmente do anterior. Se a geração do Filho é um ato necessário do pai, de modo que é impossível entende-lo como não gerando, naturalmente participa do pai na eternidade. Não significa, porém, que seja um ato que se realizou completamente no passado distante, mas antes, que é um ato atemporal, o ato de um eterno presente, um ato que se realiza continuadamente e, todavia, sempre de maneira completa. Sua eternidade segue-se não somente da eternidade de Deus, mas também a imutabilidade divina e da verdadeira divindade do Filho. Acresce que também se pode inferir das passagens bíblicas que ensinam ou a preexistência do Filho ou a Sua igualdade com o Pai, Mq 5.2; Jo 1.14, 18; 3.16; 5.17, 18, 30, 36; At 13.33; Jo 17.5; Cl 1.16; Hb 1.3. A declaração do Sl 2.7, “Tu és meu filho, eu hoje te gerei”, geralmente é citada para provar a geração do Filho, mas, segundo alguns, com mui duvidosa propriedade, Cf. At 13.33; Hb 1.5. Supõem eles que essas palavras se referem à elevação de Jesus como Rei Messiânico, e ao reconhecimento dele como Filho de Deus num sentido oficial, estando provavelmente ligadas à promessa registrada em 2 Sm 7.14, exatamente como se vêem em Hb 1.5. (3) É geração da subsistência pessoal, e não da essência divina do Filho. Alguns falam como se o pai gerasse a essência do Filho, mas isto equivale a dizer que Ele gerou a Sua própria essência, pois a essência do Pai e do Filho é exatamente a mesma. É melhor dizer que o pai gera a subsistência pessoal do Filho, mas com isso também Lhe comunica a essência divina em sua inteireza. Mas, ao fazê-lo, devemos evitar a idéia de que o Pai gerou primeiramente a segunda pessoa e depois comunicou a essência divina e esta pessoa, pois isto levaria à conclusão de que o Filho não foi gerado da essência divina, mas foi criado do nada. Na obra de geração houve comunicação da essência: foi um ato indivisível. E, em virtude desta comunicação, o Filho também tem vida em Si mesmo. Isso está de acordo com a declaração de Jesus: “Porque assim como mo pai tem vida em si mesmo, também concedeu ao Filho ter vida em si mesmo”, Jo 5.26. (4) É geração que deve ser entendida como espiritual e divina. Em oposição aos arianos, que insistiram em que a geração do Filho implicava necessariamente separação ou divisão do Ser Divino, os chamados pais da igreja acentuavam o fato de que não se deve entender esta geração de maneira física ou que lembre o processo de geração das criaturas, mas deve ser entendida como espiritual e divina, excluindo toda idéia de divisão ou mudança. Ela traz distinctio e distributio, não porém diversitas e divisio ao Ser Divino (Bavinck). Sua mais notável analogia acha-se no pensamento e na alocução do homem, e a própria Bíblia parece indicar isto, quando fala do Filho como o Logos. (5) Pode-se dar a seguinte definição da geração do Filho: É o ato eterno e necessário da primeira pessoa da Trindade, pelo qual Ele, dentro do Ser Divino, é a base de uma segunda subsistência pessoal, semelhante à Sua própria, e dá a esta segunda pessoa posse da essência divina completa, sem nenhuma divisão, alienação ou mudança. d. A divindade do Filho. A divindade do Filho foi negada na Igreja Primitiva pelos ebionitas e pelos “alogi” (alogoa), e também pelos monarquistas e pelos arianos.Nos dias da Reforma os socinianos seguiram o exemplo daqueles e falavam de Jesus como mero homem. A mesma posição foi tomada por Schleiermacher e Ritschl, por um batalhão de eruditos liberais, particularmente da Alemanha, pelos unitários e pelos modernistas e humanistas dos dias atuais. Esta negação só é possível para os que desconsideram os ensinos da Escritura, pois a Bíblia contém abundantes provas da divindade de Cristo. Vemos que a Escritura (1) asseverava explicitamente a divindade do Filho. Em passagens como Jo 1.1; 20,28; Rm 9.5; Fp 2.6; Tt 2.13; 1 Jo 5.20; (2) aplica a Ele nomes divinos, Is 9.6; 40.3; Jr 23.5, 6; Jl 2.32 (comp. At 2.21); 1 Tm 3.16: (3) atribui a Ele perfeições divinas,tais como existência eterna, Is 9.6; Jo 1.1, 2; Ap 1.8; 22.13, onipresença, Mt 18.20; 28.20; Jo 3.13, onisciência, Jo 2.24, 25; 21.17; Ap 2.23, onipotência, Is 9.6; Fp 3.21; Ap 1.8, imutabilidade, Hb 1.10-12; 13.8, e em geral todos os atributos pertencentes ao pai, Cl 2.9: (4) fala dele como realizando obras divinas, como a criação, Jo 1.3, 10; Cl 1.16; Hb 1.2,10, a providência, Lc 10.22; Jo 3.35; 17.2; Ef 1.22; Cl 1.17; Hb 1.3, o perdão de pecados, Mt 9.2-7; Mc 2. 7-10; Cl 3.13, a ressurreição e o juízo, Mt 25.31, 32; Jo 5.19-29; At 10.42; 17.31; Fp 3.21; 2 Tm 4.1, a final dissolução e renovação de todas as coisas Hb 1.10-12; Fp 3.21; Apo 21.5, e (5) Lhe outorga honra divina, Jo 5.22, 23; 14.1; 1 Co 15.19; 2 Co 13.13; Hb 1.6; Mt 28.19. e. O lugar do Filho na Trindade econômica. Deve-se notar que a ordem da existência na Trindade essencial ou ontológica reflete-se na Trindade econômica. O Filho ocupa o segundo lugar nas opera ad extra. Se todas as coisas provêm do Pai, provêm mediante o Filho, 1 Co 8.6. Se o Pai é apresentado como a causa absoluta de todas as coisas, o Filho sobressai claramente como a causa mediadora. Isto se aplica à esfera natural, onde todas as coisas são criadas e mantidas por meio do Filho, Jo 1.3, 10; Hb 1.2, 3. Ele é a luz que ilumina todo homem que vem ao mundo, Jo 1.9. Aplica-se também à obra de redenção. No Conselho da Redenção Ele toma sobre Si a tarefa de ser a Segurança do Seu povo, e executar o plano de redenção feito pelo Pai, Sl 40.7, 8. Realiza-o mais particularmente em Sua encarnação, em Seus sofrimentos e em Sua morte, Ef 1.3-14. Em conexão com a Sua função os atributos de sabedoria e poder, 1 Co 1.24; Hb 1.3, e de misericórdia e graça, são atribuídos especialmente a Ele, 2 Co 13.13; Ef 5.2, 25. 3. O ESPÍRITO SANTO, OU A TERCEIRA PESSOA DA TRINDADE. a. O nome aplicado à terceira pessoa da Trindade. Apesar de se nos dizer em Jo 4.24 que Deus é Espírito*, o nome se aplica mais particularmente à terceira pessoa da Trindade. O termo hebraico com o qual Ele é designado é Ruach, e o grego, é pneuma, ambos os quais, como o vocábulo latino spiritus, derivam de raízes que significam “soprar”, “respirar”. Daí, também podem ser traduzidos por “sopro” ou “fôlego”, Gn 2.7; 6,17; Ez 37.5, 6, ou “vento”, Gn 8.1: 1 Rs 19.11: Jo 3.8. O Velho Testamento geralmente emprega o termo “espírito” sem qualificativos, ou fala do “Espírito de Deus” ou “Espírito do Senhor”, e utiliza a expressão “Espírito Santo” somente em Sl 51.11; Is 63.10, 11, enquanto que o Novo Testamento esta veio a ser uma designação da terceira pessoal da Trindade. É um fato notável que, enquanto o Velho Testamento repetidamente chama a Deus “o Santo de Israel”, Sl 71.22; 89.18; Is 10.20; 41.3; 48.17, o Novo Testamento raramente se aplica o adjetivo “santo” a Deus em geral, mas utiliza freqüentemente para caracterizar o Espírito. Com toda a probabilidade isto se deve ao fato de que foi especialmente no Espírito e Sua obra santificadora que Deus se revelou como Santo. É o Espírito Santo que faz Sua habitação nos corações dos crentes, que os separa para Deus, e que os purifica do pecado. b. A personalidade do Espírito Santo. As expressões “Espírito de Deus” e “Espírito Santo” não sugerem personalidade com a clareza que o temo “Filho” sugere. Além disso, a pessoa do Espírito Santo não apareceu de forma pessoal claramente discernível entre os homens, como aconteceu com a pessoa do Filho de Deus. Como resultado, a personalidade do Espírito Santo muitas vezes foi posta em questão e, portanto, merece atenção especial. A personalidade do Espírito foi negada na Igreja Primitiva pelos monarquistas e pneumatomaquianos. Nesta negação eles foram seguidos pelos socianos dos dias da Reforma. Mas recentemente, Schleiermacher, Ritschil, os unitários, os modernistas dos dias atuais e todos os sabelianos modernos rejeitam a personalidade do Espírito Santo. Muitas vezes se diz hoje em dia que as passagens que parecem implicar a personalidade do Espírito Santo simplesmente contêm personificações. Mas as personificações certamente são raras nos escritos em prosa do Novo Testamento, e podem ser reconhecidas com facilidade. Ademais, essa explicação evidentemente destrói o sentido de algum, as dessas passagens como, por exemplo, Jo 14.26; 16.7-11; Rm 8.26. A prova bíblica da personalidade do Espírito Santo é mais que suficiente: (1) Designativos próprios de personalidade Lhe são dados. Embora pneuma seja neutro, o pronome masculino ekeinos é utilizado como referência ao Espírito Santo em Jo 16.14; e em Ef 1.14 algumas das melhores autoridades têm o pronome relativo masculino hos. Além disso, é-lhe aplicado o nome Parakletos, Jo 14.26; 15.26; 16.7, termo que não pode ser traduzido por “conforto”, “consolação”, nem pode ser considerado como nome de alguma influência abstrata. Um fato que indica que se trata de uma pessoa é que o Espírito Santo, como Consolador, é colocado em justaposição com Cristo como o Consolador que estava para partir, a quem o mesmo termo é aplicado em 1 Jo 2.1. É verdade que este termo é seguido pelos neutros Ho e auto em Jo 14.16-18, mas isto se deve ao fato de que intervém o vocábulo pneuma. (2) São-lhe atribuídas características de pessoa, como inteligência, Jo 14.26; 15.26; Rm 8.16, vontade, At 16.7; 1 Co 12.11; e sentimentos, Is 63.10; Ef 4.30. Demais, Ele realiza atos próprios de personalidade. Sonda, fala, testifica, ordena, revela, luta, cria, faz intercessão, vivifica os mortos, etc, Gn 1.2; 6.3; Lc 12.12; Jo 14.26; 15.26; 16.8; At 8.29; 13.2; Rm 8.11; 1 Co 2.10, 11. O realizador destas coisas não pode ser um simples poder ou influência, mas tem que ser uma pessoa. (3) É apresentado como mantendo tais relações com outras pessoas, que implicam Sua própria personalidade. Ele é colocado na justaposição com os apóstolos em At 15.28, com Cristo em Jo 16.14, e com o Pai e o Filho em Mt 28.19; 2 Co 13.13; 1 Pe 1.1, 2; Jd 20, 21. Uma boa exegese exige que nestas passagens o Espírito Santo seja considerado uma pessoa. (4) Também há passagens em que se distingue entre o Espírito e o Seu Poder, Lc 1.35; 4.14; At 10.38; Rm 15.13; 1 Co 2.4. Tais passagens seriam tautalógicas, sem sentido, e até absurdas, se fossem interpretadas com base no princípio de que o Espírito é pura e simplesmente um poder impessoal. Pode-se ver isto substituindo o nome “Espírito Santo” pela palavra “poder” ou “influência”. c. A relação do Espírito Santo com as outras pessoas da Trindade. As primeiras controvérsias trinitárias levaram à conclusão de que o Espírito Santo, como o Filho, é da mesma essência do pai e, portanto, é consubstancial com Ele. E a longa discussão acerca da questão, se o Espírito Santo procedeu somente do pai ou também do Filho, foi firmada finalmente pelo Sínodo de Toledo em 589*, pelo acréscimo da palavra “Filioque” (e do Filho) à versão latina do Credo de Constantinopla: “Credimos in Spiritum Sanctum qui a Patre Filioque procedidit” (“Cremos no Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho”). Esta processão do Espírito Santo, resumidamente chamada espiração, é Sua propriedade pessoal. Muito do que foi dito a respeito da geração do Filho também se aplica à espiração do Espírito Santo, e não é necessário repetir. Notem-se, contudo, os seguintes pontos de distinção entre ambas: (1) A geração é obra exclusiva do Pai; a espiração é obra do pai e do Filho. (2) Pela geração o Filho é habilitado a tomar parte na obra de espiração, mas o Espírito Santo não adquire esse poder. (3) Segundo a ordem lógica, a geração precede à espiração. Devemos lembrar, porém, que isso tudo não implica nenhuma subordinação essencial do Espírito Santo ao Filho. Na espiração, como na geração, há uma comunicação da substância total da essência divina, de modo que o Espírito Santo está em igualdade com o Pai e o Filho. A doutrina da processão do Espírito Santo do Pai e do Filho baseia-se em Jo 15.26, e no fato de que o Espírito é chamado também o Espírito de Cristo e do Filho, Rm 8.9; Gl 4.6, e é enviado por Cristo ao mundo. Pode-se definir a espiração como o terno e necessário ato da primeira e da segunda pessoa da Trindade pelo qual elas, dentro do Ser Divino, vêm a ser a base da subsistência pessoal do Espírito Santo, e propiciam à terceira pessoa a posse da substância total da essência divina, sem nenhuma divisão, alienação ou mudança. O Espírito Santo está na relação mais estreita possível com as outras pessoas. Em virtude da Sua processão do Pai e do Filho, o Espírito é descrito como estando na relação mais estreita possível com as outras duas pessoas. De 1 Co 2.10, 11 podemos inferir, não que se deve identificar o Espírito com a autoconsciência de Deus, mas, sim, que Ele é tão estreitamente relacionado com Deus o pai como a alma humana o é com o homem. Em 2 Co 3.17 lemos: “Ora, o Senhor é o Espírito; e onde está o Espírito do Senhor aí há liberdade”. Aí o Senhor (Cristo) é identificado com o Espírito, não quanto à personalidade, mas quanto à maneira de agir. Na mesma passagem o Espírito é chamado “o Espírito do Senhor”. A obra para a qual o Espírito Santo foi enviado à igreja no dia de Pentecostes estava baseada em Sua unidade com o Pai e com o Filho. Ele veio como o Paráclito para tomar o lugar de Cristo e realizar a Sua obra na terra, isto é, para ensinar, proclamar, testificar ou dar testemunho etc., como o Filho fizera. Pois bem, no caso do Filho, esta obra de revelação estava firmada em Sua unidade com o Pai. Justamente assim a obra do Espírito baseia-se em Sua unidade com o Pai e com o Filho, Jo 16.14, 15. Notem-se as palavras de Jesus nesta passagem: “Ele me glorificará porque há de receber do que é meu, e vo-lo há de anunciar. Tudo quanto o Pai tem é meu; por isso é que vos disse que há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar”. d. A divindade do Espírito Santo. Pode-se estabelecer a veracidade da divindade do Espírito Santo com base na Escritura seguindo uma linha de comprovação muito semelhante à que foi empregada com relação ao Filho: (1) São-lhe dados nomes divinos, Êx 17.7 (comp. Hb 3.7-9); At 5.3, 4; 1 Co 3.16; 2 Tm 3.16; 2 Pe 1.21. (2) São-lhe atribuídas perfeições divinas, como onipresença, Sl 139.7-10, onisciência, Is 40.13, 14 (comp. Rm 11.34); 1 Co 2.10, 11, onipotência, 1 Co 12.11; Rm 15.19, e eternidade, Hb 9.14 (?). (3) Ele realiza obras divinas, como a criação, Gn 1.2; Jó 26.13; 33.4, renovação providencial, Sl 104.30, regeneração, Jo 3.5, 6; Tt 3.5, e a ressurreição dos mortos, Rm 8.11. (4) É-lhe prestada honra divina, Mt 28.19; Rm 9.1; 2 Co 13.13. e. A obra do espírito Santo na economia divina. Certas obras são atribuídas mais particularmente ao Espírito Santo, não somente na economia geral de Deus, mas também na economia especial da redenção. Em geral se pode dizer que a tarefa especial do Espírito Santo consiste em levar as coisas à completação agindo imediatamente sobre a criatura e nela. Justamente como Ele é a pessoa que completa a Trindade, assim a Sua obra é a completação do contato de Deus com as Suas criaturas e a consumação da obra de Deus em todas as esferas. Ela se segue à obra do Filho, como a obra do Filho segue-se à do Pai. É importante ter isto em mente, pois, se a obra do Espírito Santo for divorciada do objetivo da obra do Filho, um falso misticismo fatalmente surgirá como resultado. A obra do Espírito inclui as seguintes ações na esfera natural: (1) A geração da vida. Como o ser provém do Pai, e o pensamento vem mediante o Filho, assim a vida é mediada pelo Espírito, Gn 1.3; Jó 26.13; Sl 33.6 (?); Sl 104.30. Com relação a isso, Ele dá o toque final à obra da criação. (2) A inspiração geral e a qualificação dos homens. O Espírito Santo inspira e qualifica os homens para as suas tarefas oficiais, para trabalho na ciência e nas artes, etc., Ex 28.3; 31.2, 3, 6; 35.35: 1 Sm 11.6; 16.13, 14. De maior importância ainda é a obra do Espírito Santo na esfera da redenção. Aqui podem ser mencionados os seguintes pontos: (1) O preparo e a qualificação de Cristo para a Sua obra mediadora. Ele preparou para Cristo um corpo e, assim, capacitou-o a tornar-se um sacrifício pelo pecado, Lc 1.35; Hb 10.5-7. Nas palavras “corpo me formaste”, o escritor de Hebreus segue a Septuaginta. O sentido é: Pela preparação de um corpo santo, me capacitaste a ser um sacrifício pelo pecado. Em seu batismo Cristo foi ungido com o Espírito Santo Lc 3.22, e recebeu do Espírito Santo dons habilitadores sem medida, Jo 3.24 (2) A inspiração da Escritura. O Espírito Santo inspirou a Escritura e deste modo trouxe aos homens a revelação especial de Deus, 1 Co 2.13; 2 Pe 1.21, o conhecimento da obra de redenção que há em Cristo Jesus. (3) A formação e o aumento da igreja. O Espírito Santo forma e dá crescimento à igreja, o corpo místico de Jesus Cristo, pela regeneração e pela santificação, e habita nela como o princípio da nova vida, Ef 1.22, 23; 2.22; 1 Co 3.16; 12.4s. (4) Ensino e direção da igreja. O Espírito Santo dá testemunho de Cristo e guia a igreja em toda verdade. Em fazendo isto, Ele manifesta a glória de Deus e de Cristo, aumenta o nosso conhecimento do Salvador, livra de erro a igreja e a prepara para o seu destino eterno, Jo 14.26; 15.26; 16.13, 14; At 5.32; Hb 10.15; 1 Jo 2.27. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Contém a literatura pagã alguma analogia da doutrinada Trindade? 2. O desenvolvimento da doutrina da Trindade parte da Trindade ontológica ou da econômica? 3. Pode-se compreender a Trindade econômica isolada da ontológica? 4. Por que a doutrinada Trindade é discutida por alguns como introdutória da doutrina da redenção? 5. Qual é a concepção hegeliana da Trindade? 6. E a da Swedenborg? 7. Onde encontramos sabelianismo na teologia moderna? 8. Por que é objetável sustentar que a Trindade é puramente econômica? 9. Que objeções podem ser feitas ao conceito que o humanismo moderno tem a Trindade? 10. Por que Barth trata da Trindade nos prolegômenos da teologia? 11. Qual é a significação prática da doutrina da Trindade? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dog. II, p. 260-347; Kuyper, Dict. Dogm., De Deo II, p. 3-255; Vos, Geref. Dogm. I, p.36-81; Mastricht, Godgeleerdheit I, p. 576-662; Turretino, Opera, Locus Tertius; Hodge, Syst. Theol. I, p. 442-534; Dabney, Syst. And Polem. Theo., p. 174-211; Curtiss, The Chr Fith, p. 483-510; Harris, God, Creator and Lord of All I, p. 194-407; Illingworth, The Doutrine, of the Trinity, p. 159-269; Clarke, The Chr. Doct. Of God, p. 227-248; Bartlett, The Triune God; Liddon, The Divinity of Our Lord; Mackintosh, The Doctrine of the person of Jesus Christ; Warfield, The Lord of Glory, ibid., The Spirit of God in the Old Testament; and The Biblical Doctrine of the Trinity (ambas em Biblical Doctrines), p. 101s; ibid., Calvin’s Doctrine of the Trinity (em Calvin and Calvinism); Kuyper, Het Werk van den Heiligen Geest, cf. Indice; Owen, A Discourse Concerning the Holy Spirit, cf. Indice; Smeaton, The Doct, of the Holy Spirit; Pohle-Preuss, The Divine Trinity. (Teologia Sistemática - Louis Berkhof. Pg. 90)