terça-feira, 30 de julho de 2013

A Condição Original do Homem como a Imagem de Deus

É muito estreita a conexão existente entre a imagem de Deus e o estado original do homem e, por isso ambos são geralmente considerados juntos. Uma vez mais teremos que distinguir entre diferentes conceitos históricos da condição original do homem. 1. O CONCEITO PROTESTANTE. Os protestantes ensinam que o homem foi criado num estado de relativa perfeição, um estado de justiça e santidade. Não significa que ele já tinha alcançado o mais elevado estado de excelência de que era suscetível. Geralmente se admite que ele estava destinado a alcançar um grau mais elevado de perfeição pela obediência. Um tanto semelhante a uma criança, era perfeito em suas partes, não porém em grau. Sua condição era preliminar e temporária, podendo levar a maior perfeição e glória ou acabar numa queda. Foi por natureza dotado daquela justiça original que é a glória máxima da imagem de Deus e, conseqüentemente, vivia num estado de santidade positiva. A perda daquela justiça significaria a perda de uma coisa que pertencia à própria natureza do homem em seu estado ideal. O homem podia perdê-la e ainda continuar sendo homem, mas podia não perdê-la e continuar sendo o homem no sentido ideal da palavra. Noutras palavras, sua perda significaria realmente uma deterioração e um enfraquecimento da natureza humana. Além disso, o homem foi criado imortal. Isto se aplica não à alma somente, mas a toda a pessoa do homem; e, portanto, não significa apenas que a alma estava destinada a ter existência permanente. Tampouco significa que o homem foi elevado acima da possibilidade de ser presa de morte; isto só se pode afirmar sobre os anjos e os santos que estão no céu. Significa, porém, que o homem, como criado por Deus, não levava dentro de si as sementes da morte e não teria morrido necessariamente em virtude da constituição original da sua natureza. Embora não estivesse excluída a possibilidade de vir a ser vítima da morte, não estava sujeito à morte, enquanto não pecasse. Deve-se ter em mente que a imortalidade original do homem não era uma coisa puramente negativa e física, mas era também uma coisa positiva e espiritual. Significava vida em comunhão com Deus e o gozo do favor do Altíssimo. Esta é a concepção fundamental da vida, segundo a Escritura, assim como a morte é primariamente a separação de Deus e a sujeição à Sua ira. A perda dessa vida espiritual daria lugar à morte, e redundaria também na morte física. 2. O CONCEITO CATÓLICO ROMANO. Naturalmente, os católicos romanos têm uma idéia um tanto diversa da condição original do homem. Segundo eles, a justiça original não pertencia à natureza humana em sua integridade, mas era algo que foi acrescentado sobrenaturalmente. Em virtude da sua criação, o homem foi simplesmente revestido de todos os pecados e faculdades naturais da natureza humana como tal e, pela justitia naturalis, esses poderes foram muito bem ajustados uns aos outros. Ele estava sem pecado e vivia num estado de inocência perfeita. Pela própria natureza das coisas, porém, havia uma tendência dos apetites e paixões inferiores para rebelar-se contra os poderes superiores da razão e da consciência. Essa tendência, denominada concupiscência, não era pecado em si mesma, porém facilmente podia vir a ser ocasião e combustível para o pecado. (Mas, cf. Rm 7.8; Cl 3.5; 1 Ts 4.5, authorized Version; Almeida, Edição Rev. e Corr.). Então, o homem. Como originariamente constituído, por natureza estava sem santidade positiva, mas também sem pecado, embora levando o fardo de uma tendência que facilmente poderia redundar em pecado. Mas agora Deus acrescentou à constituição natural do homem o dom sobrenatural da justiça original pela qual ele foi habilitado a manter na devida sujeição as propensões e os desejos inferiores. Quando o homem caiu, perdeu aquela justiça original, mas a constituição original da natureza humana permaneceu intacta. O homem natural está agora exatamente onde Adão estava antes de ser dotado da justiça original, embora com uma inclinação um tanto mais forte para o mal. 3. CONCEITOS DE ÊNFASE RACIONALIZANTE. Os pelagianos, os socinianos, os arminianos, os racionalistas e os evolucionistas lançam em total descrédito a idéia de um estado primitivo de santidade. Os quatro primeiros grupos concordam que o homem foi criado num estado de inocência, ou seja, de neutralidade moral e religiosa, mas foi dotado de livre arbítrio, de modo que podia seguir esta ou aquela direção. Os evolucionistas afirmam que o homem começou a sua carreira num estado de barbárie, no qual ele estava apenas ligeiramente afastado dos animais irracionais. Os racionalistas de todos os tipos acreditam que uma co-criada justiça e santidade é uma contradição de termos. O homem determina o seu caráter por sua própria e livre escolha, e a santidade só pode resultar de uma vitoriosa luta contra o mal. Pela própria natureza do caso, pois, Adão não pode ter sido criado num estado de santidade. Além disso, os pelagianos, os socinianos e os racionalistas sustentam que o homem foi criado mortal. A morte não resultou da entrada do pecado no mundo, mas era simplesmente o término natural da natureza humana como esta foi constituída. Adão teria morrido [sem a Queda], em virtude da constituição original da sua natureza. QUESTIONÁRIO: 1. Qual a precisa distinção feita por Delitzsch entre a alma e o espírito do homem? 2. Como Heard fez uso da concepção tripartida do homem na interpretação do pecado original, da conversão e da santificação? 3. O que explica o fato de que os luteranos são predominantemente traducionistas e os reformados (calvinistas) são predominantemente criacionistas? 4. Que dizer da objeção que afirma que o criacionismo virtualmente destrói a unidade da raça humana? 5. Que objeções há contra o realismo, com a sua suposição da unidade numérica da natureza humana? 6. Que crítica você faria à idéia de Dorner, de que as teorias do preexistencialismo, do traducionismo e do criacionismo são simplesmente três aspectos da verdade completa referente à origem da alma? 7.Como os católicos romanos distinguem geralmente entre a “imagem” e a “semelhança” de Deus? 8. Eles crêem ou não que o homem perdeu sua justitia ou justiça natural com a Queda? 9. Como é que aqueles luteranos que restringem a imagem de Deus à justiça original do homem explicam Gn 9.6 e Tg 3.9? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. II p. 566 – 635; Kuyper, Dict. Dogm., De Creaturis C., p. 3-131; Vos, Geref. Dogm. II, p. 1-21; Hodge, Syst. Theol. II, p. 42-116; Dabney, Syst. And Polemic Theol., p. 292-302; Shedd, Dogm. Theol. II, p. 4-114; Litton, Introd. To Dogm. Theol., 107-122; Dorner, Syst. Of Chr. Doctr. II, p. 68-96; Schmidt. Doct. Theol. Of the Ev. Luth. Church, p. 225-238; Martensen, Chr. Dogm., p. 136-148; Pieper, Chr. Dogm. I, p. 617-630; Valentine, Chr. Theol. I, p. 383-415; Pope, Chr. Theol. I, p. 421-436; Raymond, Syst. Theol. II, p. 7-49; Wilmers, Handbook of the Chr. Rel., p. 219-233; Orr, God’s Image in Man, p. 3-193; A. Kuyper, Jr., Het Beeld Gods, p. 8-143; Talma, De Anthropologie van Calvijn, p. 29-68; Heard, The Tri-partite Nature of Man; Dickson, St. Paul’s Use of the Terms Flesh and Spirit, capítulos V-XI; Delitzsch, Syst. Of Bibl. Psych., p. 103-144; Laidlaw, the Bibl. Doct. Of Man, p. 49-108; H. W. Robinson, The Chr. Doct. Of Man, p. 4-150. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg 202)