segunda-feira, 29 de abril de 2013

CARACTERÍSTICAS DA ALIANÇA DA GRAÇA

1. É ALIANÇA CARACTERIZADA PELA GRAÇA. Pode-se afirmar que é uma aliança caracterizada pela graça, (a) porque nela Deus permite que um Fiador cumpra as nossas obrigações: (b) porque Ele mesmo provê o Fiador na pessoa do Seu Filho, que satisfaz as exigências da justiça; e (c) porque por Sua graça, revelada na operação do Espírito Santo, Ele capacita o homem a cumprir as responsabilidades da Sua aliança. A aliança origina-se na graça de Deus, é executada em virtude da graça de Deus e se concretiza na vida dos pecadores, pela graça de Deus. É graça do começo ao fim para o pecador. 2. É ALIANÇA TRINITÁRIA. O trino Deus age na aliança da graça. Ela tem sua origem no eletivo amor e graça do pai, encontra seu fundamento jurídico no ofício de Fiador exercido pelo Filho, e só se realiza plenamente nas vidas dos pecadores pela eficaz aplicação feita pelo Espírito Santo, Jo 1.16; Ef 1.1-14; 2.8; 1 Pe 1.2. 3. É ALIANÇA ETERNA E, PORTANTO, INVIOLÁVEL. Quando falamos que a aliança é eterna, referimo-nos à eternidade futura, e não à passada, Gn 17.19; 2 Sm 23.5; Hb 13.20. Só poderemos liga-la à eternidade passada, se não fizermos distinção entre ela e a aliança da redenção. O fato de ser eterna implica também que é inviolável; e esta é uma das razões pelas quais ela pode ser chamada testamento, Hb 9.17. Deus permanecerá para sempre fiel à Sua aliança e sem sombra de variação e levará à plena realização nos eleitos. Contudo, não significa que o homem não pode romper e nunca romperá a relação pactual em que se acha. 4. É ALIANÇA PARTICULAR, NÃO UNIVERSAL. Significa (a) que ela não realizará em todos os homens, como alegam alguns universalistas, e também que Deus não teve a intenção de que se realizasse nas vidas de todos, como ensinam os pelagianos, os arminianos e os luteranos; (b) que, mesmo na qualidade de uma relação pactual externa, ela não se estende a todos aqueles a quem o Evangelho é pregado, pois muitos deles não querem ser incorporados na aliança; e (c) que a oferta da aliança não chega a todos, visto que tem havido muitos indivíduos e até nações que jamais tiveram conhecimento do meio de salvação. Alguns dos luteranos mais antigos alegam que se pode dizer que a aliança é universal porque houve períodos da história em que ela foi oferecida à raça humana toda, como, por exemplo, em Adão, em Noé e sua família, e mesmo nos dias dos apóstolos. Mas não há base para fazer de Adão e Noé recebedores representativos do oferecimento da aliança; e o certo é que os apóstolos não evangelizaram o mundo inteiro. Alguns teólogos reformados (calvinistas), como Músculo, Polano, Wolébio e outros, falavam de um foedus generale (aliança geral) em distinção de um foedus speciale ac sempiternum (aliança especial e sempiterna), mas, ao faze-lo, tinham em mente a aliança geral de Deus com todas as criaturas, homens e animais, estabelecida mediante Noé. A dispensação neotestamentária da aliança pode ser chamada universal no sentido de que, nela, a aliança é estendida a todas as nações, não se limitando mais aos judeus, como se limitava na antiga dispensação. 5. É ESSENCIALMENTE A MESMA EM AMBAS AS DISPENSAÇÕES, EMBORA COM MUDANÇAS NA FORMA DA SUA ADMINISTRAÇÃO. Esta afirmação é contraditada por todos os que declaram que os santos veterotestamentários foram salvos de maneira diferente da dos crentes neotestamentários. Exemplos dos que assumem esta posição: Os pelagianos e socinianos, que sustentam que Deus deu ajuda adicional com o exemplo e os ensinos de Cristo; os católicos romanos, que afiram que os santos do Velho Testamento ficaram no Limbus Patrum (Limbo dos Pais) até quando Cristo desceu ao hades; os seguidores de Coceio, que asseveravam que os crentes veterotestamentários só receberam uma paresis (um passar por alto) e não uma aphesis (pleno perdão dos pecados); e os dispensacionalistas atuais, que distinguem várias e diferentes aliança (Scofield menciona 7; Milligan, 9), e insistem na necessidade de mantê-las distintas. A unidade da aliança em ambas as dispensações é comprovada pelas seguintes ponderações: a. A expressão sumária da aliança é a mesma sempre, tanto no Velho como no Novo Testamento: “Eu serei o teu Deus”. Esta é a expressão do conteúdo essencial da aliança com Abraão, Gn 17.7, da aliança davídica, 2 Sm 7.14, e da nova aliança, Jr 31.33; Hb 8.10. Esta promessa é de fato um sumário totalmente abrangente, e contém uma garantia das mais perfeitas bênçãos pactuais. Do fato de que Deus é chamado Deus de Abraão, Isaque e Jacó, Cristo infere que esses patriarcas têm posse da vida eterna, Mt 22.32. b. A Bíblia ensina que há somente um único Evangelho, por meio do qual os homens podem salvar-se. E porque o Evangelho nada é senão a revelação da graça, segue-se que há também somente uma aliança. Este Evangelho já foi ouvido na promessa materna, Gn 3.15, foi pregado a Abraão, Gl 3.8, e não pode ser suplantado por nenhum evangelho judaizante, Gl 1.8,9. c. Paulo argumenta extensamente contra os judaizantes com a tese de que o modo pelo qual Abraão obteve a salvação é típico quanto aos crentes do Novo Testamento, não importando se estes eram judeus ou gentios, Rm 4.9-25; Gl 3.7-9, 17, 18. Ele fala de Abraão como o pai dos crentes e prova claramente que a aliança com Abraão continua vigente.O argumento de Paulo em Rm 4 e Gl 3 esclarece perfeitamente que a lei não anulou nem alterou a aliança. Cf. também Hb 6.13-18. d. O Mediador da aliança é o mesmo ontem, hoje e para sempre, Hb 13.8. Em nenhum outro há salvação, Jo 14.6; pois tampouco há qualquer outro debaixo do céu, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos, At 4.12. A semente prometida a Abraão é Cristo, Gl 3.16, e os que se identificam com Cristo são verdadeiros herdeiros da aliança, Gl 3.16-29. e. O meio de salvação revelado na aliança é o mesmo. A escritura insiste nas condições idênticas em toda a linha, Gn 15.6, comparado com Rm 4.11; Hb 2.4; At 15.11; Gl 3.6, 7; Hb 11.9. As promessas, cuja realização os crentes esperavam, também eram as mesmas, Gn 15.6; Sl 51.12; Mt 13.17; Jo 8.56. E os sacramentos, embora diferindo na forma, têm essencialmente a mesma significação em ambas as dispensações, Rm 4.11; 1 Co 5.7; Cl 2.11, 12. f. É tanto condicional como incondicional. Repetidamente se faz a indagação se a aliança é condicional ou incondicional. É uma indagação que não se pode responder sem uma cuidadosa discriminação, pois a resposta dependerá do ponto de vista segundo o qual se considere a aliança. Por um lado, a aliança é incondicional. Não há aliança da garça nenhuma condição que se possa considerar meritória. O pecador é exortado a arrepender-se e a crer, mas a sua fé e o seu arrependimento de modo nenhum merecem as bênçãos da aliança. Deve-se sustentar isto em oposição às posições católica romana e arminiana. Tampouco é condicional no sentido de que se espera que o homem realize com as suas próprias forças o que a aliança exige dele. Ao coloca-lo diante das exigências da aliança, sempre devemos lembrar-lhe o fato de que somente de Deus ele pode receber as forças necessárias para o cumprimento do seu dever. Num sentido se pode dizer que o próprio Deus preenche a condição nos eleitos. Para os que são escolhidos para a vida eterna, aquilo que se pode considerar como condição da aliança é também uma promessa e, portanto, um dom de Deus. Finalmente, a aliança não é condicional no sentido de que o recebimento de cada bênção particular da aliança depende de alguma condição. Podemos dizer que a fé é aconditio sine qua non da justificação, mas o recebimento da fé propriamente dita na regeneração não depende de nenhuma condição, mas, sim, unicamente da operação da graça de Deus em Cristo. Por outro lado, pode-se dizer a aliança é condicional. Há um sentido em que a aliança é condicional. Se considerarmos a base da aliança, esta se vê claramente condicionada pelo penhor de Jesus Cristo, o Fiador. Para introduzir a aliança da graça, Cristo teve que satisfazer, e de fato satisfez, as condições originariamente estabelecidas na aliança das obras, por Sua obediência ativa e passiva. Pode-se dizer ainda que a aliança é condicional na medida em que se refere ao primeiro ingresso consciente na aliança como uma real comunhão de vida. Este ingresso depende da fé, fé, porém, que em si mesma é dom de Deus. Quando aqui falamos da fé como uma condição, naturalmente nos referimos à fé como uma atividade espiritual da mente. É só mediante s fé que podemos obter um usufruto consciente das bênçãos da aliança. Nosso conhecimento experimental da vida pactual depende inteiramente do exercício da fé. Aquele que não vive a vida da fé está praticamente fora da aliança, no que se refere à sua consciência. Se em nosso exame incluirmos não somente o começo, mas também o gradativo desdobramento e aperfeiçoamento da vida pactual, poderemos considerar a santificação como uma condição, em acréscimo à fé. Todavia, ambas as condições estão dentro da aliança. As igrejas reformadas (calvinistas) se opuseram muitas vezes ao uso da palavra “condição” em conexão com a aliança da graça. Deve-se isto em grande parte a uma reação contra o arminianismo, que empregava o vocábulo “condição” num sentido anti-escriturístico, e, portanto, a uma falha em não discrimina-lo apropriadamente. Tendo em mente o que foi dito acima, parecerá perfeitamente válido falar de uma condição em conexão com a aliança da graça, pois (1) a Bíblia mostra claramente que a entrada na vida pactual é condicionada pela fé, Jo 3.16, 36; At 8.37 (texto que não se acha em alguns manuscritos); Rm 10.9; (2) Muitas vezes a Escritura ameaça os filhos da aliança, mas estas ameaças aplicam-se exatamente aos que ignoram a condição, isto é, aos que se recusam a andar no caminho da aliança; e (3) se não houvesse nenhuma condição, só Deus estaria obrigado à aliança, e não haveria nenhuma “disciplina” ou “vinculo do concerto”* para o homem(mas cf. Ez 20.37); e, assim, a aliança deixaria de ser aliança, pois em todas as alianças há duas partes. g. Há um sentido em que a aliança pode ser chamada testamento. Em vista do fato de que o testamento é uma declaração absoluta e desconhece condições, surge a questão se há alguma propriedade em aplicar o termo “testamento” à aliança. Há somente uma passagem do Novo Testamento em que parece justificável verter a palavra diatheke para “testamento”, a saber, Hb 9.16, 17. Ali Cristo é apresentado como o testador, em cuja morte a aliança da graça, considerada como um testamento, torna-se eficaz. Houve uma disposição testamentária das bênçãos da aliança, e isto entrou em vigor pela morte de Cristo. Esta é a única passagem em que se faz referencia explícita à aliança como testamento. Mas a idéia de que os crentes recebem as bênçãos espirituais da aliança de maneira testamentária está implícita em várias passagens da escritura, conquanto a apresentação implícita seja ligeiramente diversa da de Hb 9.16, 17. Deus, e não Cristo, é o testador . tanto no Velho Testamento como no Novo, mas especialmente no Novo, os crentes são descritos como filhos de Deus, legalmente por adoção e eticamente pelo novo nascimento, Jo 1.12; Rm 8.15, 16; Gl 4.4-6; 1 Jo 3.1-3, 9. Ora, as idéias de herdeiro e herança associam-se naturalmente à filiação e, portanto, não é de admirar que se encontrem freqüentemente na Escritura. Paulo declara: “Ora, se somos filhos, somos também herdeiros”, Rm 8.17; Cf. também Rm 4.14; Gl 3.29; 4.1, 7; Tt 3.7; Hb 6.17; 11.7; Tg 2.5. Em vista dessas passagens, não há dúvida de que a aliança e as bênçãos da aliança são descritas na escritura como uma herança. Mas esta descrição também se baseia ma idéia de testamento, com esta diferença, porém: que a confirmação da aliança não implica a morte do testador. Os crentes são herdeiros de Deus (que não pode morrer) e co-herdeiros com Cristo, Rm 8.17. É mais que evidente que, quanto ao pecador, a aliança tem um lado testamentário e pode ser considerada como uma herança; mas agora surge a questão , se também pode assumir este caráter quanto a Cristo. Parece que se requer uma resposta afirmativa, em vista do fato de que somos chamados co-herdeiros com Cristo. Então, será Ele também um herdeiro? Esta pergunta pode ser respondida na afirmativa, em vista da declaração que se acha em Lc 22.29. A herança aqui referida é a glória de Cristo como Mediador, glória que Ele recebeu como herança do pai, e que Ele, por Seu turno, entrega como herança a todos os Seus. Mas, embora haja indubitavelmente um lado testamentário, este é apenas um lado da questão, e não exclui a idéia de que a aliança é realmente uma aliança. Pode-se-lhe chamar testamento porque (1) é toda ela um dom de Deus; (2) a dispensação do Novo Testamento foi introduzida pela morte de Cristo; (3) é firme e inviolável; e (4) nela Deus mesmo dá o que Ele exige do homem. Todavia, isto não deve ser interpretado no sentido de que não existem dois lados da aliança e que, por conseguinte, ela é absolutamente monoplêurica. Por desiguais que as partes possam ser, Deus condescende em baixar ao nível do homem e, por Sua graça, habilitando-o a agir como a segunda parte da aliança. Uma aliança monoplêurica, no sentido absoluto, é realmente uma contradictio in adjecto (contradição em adjeto). Ao mesmo tempo, os teólogos que darão ênfase ao caráter monoplêurico da aliança o fazem para salientar uma importante verdade, a saber, que Deus e o homem não se encontram a meio caminho na aliança, mas, sim, que Deus desce até o homem e, por Sua graça, estabelece a Sua aliança com ele, dando livremente tudo quanto Ele requer, e que o homem é realmente o único beneficiado pela aliança. É essencial, porém, que o caráter diplêurico da aliança seja mantido, porque o homem aparece nela realmente satisfazendo as exigências da aliança na fé e na conversão, conquanto seja assim somente quando Deus opera nele tanto o querer como o efetuar, de acordo com o Seu beneplácito. (Teologia Sistemática – L. Berkhof. Pg 278)