segunda-feira, 29 de abril de 2013

O HOMEM NA ALIANÇA DA GRAÇA

I. Nome e Conceito da Aliança A. O Nome. 1. NO VELHO TESTAMENTO. A palavra hebraica para aliança é sempre berith, de derivação incerta. A opinião mais geral é a de que deriva do verbo hebraico barah, cortar, e que, portanto, contém uma reminiscência da cerimônia mencionada em Gn 15.17. mas alguns preferem pensar que deriva da palavra assíria beritu, que significa “ligar”, “atar”. Isto levaria logo a entender a aliança como um laço. A questão da derivação não tem grande importância para a elaboração da doutrina. A palavra berith pode indicar um acordo mútuo voluntário (diplêurico), mas também uma disposição ou um arranjo imposto por uma parte a outra (monoplêurico).* Seu sentido exato não depende da etimologia da palavra, nem do desenvolvimento histórico do conceito, mas, simplesmente das partes interessadas. Na medida em que uma das partes é subordinada e tem menos que dizer, a aliança adquire o caráter de uma disposição ou de um arranjo imposto por uma ou outra parte. Berith, então, vem a ser sinônimo de choq (estatuto ou ordenança determinada), Ex. 34.10; Is 59.21; Jr 31.36; 33.20; 34.13. Daí vemos também que Karath beith (cortar uma aliança) é expressão que se constrói não somente com as preposições ‘am e ben (com), mas também com lamedh (a, para), Js 9.6; Is 55.3; 61.8; Jr 32.40. naturalmente, quando Deus estabelece uma aliança com o homem, este caráter monoplêurico fica em muita evidência pois Deus e o homem não são partes iguais. Deus é o Soberano que impõe as Suas ordenanças às Suas criaturas. 2. NO NOVO TESTAMENTO. Na Septuaginta a palavra berith é traduzida por diatheke em todas as passagens em que ocorre, exceto em Dt 9.15 (martyrion) e 1 Rs 11.11 (entole). A palavra diatheke foi limitada a este uso, exceto em quatro passagens. Este uso da palavra parece, com efeito, peculiar, em vista do fato de que ela não é a palavra grega habitualmente empregada para designar aliança, mas, na verdade, indica uma disposição ou arranjo e, conseqüentemente, também um testamento. A palavra ordinariamente utilizada com referência a aliança é syvtheke. Os tradutores tiveram a intenção de substituir a idéias de aliança por outra? Evidentemente não, pois em Is 28.15 eles empregam as duas palavras sinonimamente, e ali diatheke significa evidentemente um pacto ou acordo. Daí, não atribuem este sentido a diatheke .Mas permanece a questão: Por que evitam eles tão geralmente o uso de syntheke e a substituem por uma palavra que denota disposição e não acordo? Com toda a probabilidade, a razão jaz no fato de que no mundo grego a idéia de aliança expressa por syntheke baseava-se tão amplamente na igualdade legal das partes que não podia, sem considerável modificação, ser incorporada no sistema escriturístico de pensamento. A idéia de que a prioridade pertence a Deus no estabelecimento da aliança, e de que Ele impõe soberanamente a Sua aliança ao homem, estava ausente da palavra grega usual. Daí a substituição desta pela palavra em que essa idéia era proeminente. Assim, semelhantemente a muitas outras palavras, a palavra diatheke recebeu novo significado, quando se tornou veículo do pensamento divino. Esta mudança é importante, em relação ao uso neotestamentário da palavra. Tem havido considerável diferença de opinião a respeito da apropriada tradução da palavra. Em cerca da metade das passagens nas quais ocorre, as versões Holandesa e Autorizada (AV) a traduzem por “aliança”. Enquanto que na outra metade, por “testamento”. A versão Revista Americana (ARV), porém, a traduz por “aliança” em toda parte, menos em Hb 9.156,17.* Não é senão natural, pois, que se levante a questão: Qual é o sentido neotestamentário da palavra? Alguns alegam que ela tem o seu sentido clássico de disposição ou testamento onde quer que se ache, no Novo Testamento, ao passo que outros afirmam que significa testamento nalguns lugares, mas que na grande maioria das passagens a idéia de aliança está proeminentemente em primeira plana. Este é indubitavelmente o conceito correto. Era de esperar, aprioristicamente, que o uso neotestamentário geralmente estaria de acordo com o da LXX; e um cuidadoso estudo das passagens pertinentes mostra que as versões que, como a Versão Revista Americana (ARV), traduzem diatheke por “testamento” somente em Hb 9.16, 17, estão na trilha certa, sem dúvida nenhuma. Com toda a probabilidade, não há nenhuma outra passagem onde esta tradução estaria certa, nem mesmo 2 Co 3.6,14. O fato de que várias traduções do Novo Testamento usam “testamento” em lugar de “aliança” em tantas passagens deve-se provavelmente a três causas: (a) o desejo de acentuar a prioridade de Deus na transação: (b) a suposição de que a palavra deve, quanto possível, ser traduzida em harmonia com Hb 9.16, 17; e (c) a influência da tradução latina, que uniformemente verteu diatheke para “testamentum”. B. O conceito. A idéia da aliança desenvolveu-se na história antes de Deus fazer uso formal do conceito na revelação da redenção. Foram feitas alianças entre os homens muito tempo antes de Deus estabelecer a Sua aliança com Noé e com Abraão, e isso preparou os homens para entenderem o sentido de uma aliança num mundo dividido pelo pecado, e os ajudou a compreenderem a revelação divina, quando esta apresentou a relação do homem com Deus em termos de uma relação pactual. Não significa, porém, que a idéia da aliança se originou do homem, sendo posteriormente copiada por Deus como uma forma apropriada de descrição da relação mútua entre Ele e o homem. O oposto é a verdade; o arquétipo de toda vida pactual acha-se no ser trinitário de Deus, e o que ser vê entre os homens é apenas uma pálida cópia (éctipo) do modelo divino. Deus ordenou a vida do homem de modo que a idéia da aliança nela se desenvolvesse como uma das colunas da vida social e, depois de desenvolvida, Ele introduziu formalmente como expressão da relação existente entre Ele e o homem. A relação pactual entre Deus e o homem existe desde o princípio mesmo e, portanto, já existia muito antes do estabelecimento formal da aliança com Abraão. Embora a palavra berith seja empregada muitas vezes com referencia a alianças entre os homens, sempre inclui uma idéia religiosa. Uma aliança é um pacto ou acordo entre duas partes ou mais. Pode ser, e entre os homens geralmente o é, um acordo a que as partes, que podem encontrar um terreno básico de igualdade, chegam voluntariamente, depois de uma cuidadosa estipulação de seus deveres e privilégios mútuos; mas também pode ser da natureza de uma disposição ou de um arranjo imposto por uma parte superior à outra, que lhe é inferior, sendo aceito por esta. Geralmente é ratificado por uma cerimônia solene, com a consciência da presença de Deus, e, com isso, obtém caráter inviolável cada parte de obriga ao cumprimento de certas promessas, com base nas condições estipuladas. Agora, não devemos dizer que não podemos falar com propriedade de uma aliança entre Deus e o homem pelo fato de serem desiguais as partes e, daí, partir do pressuposto de que a aliança da graça nada mais é, senão a promessa de salvação na forma de uma aliança. Se a aliança da graça nada mais é, senão a promessa de salvação n forma de uma aliança. Se o fizermos, não faremos justiça à idéia da aliança revelada na escritura. É mais que certo que, tanto a aliança das obras (como subseqüentemente se verá) como a aliança da graça, são originariamente monoplêuricas, são de natureza de arranjos ordenados e instituídos por Deus, e Deus tem a prioridade em, ambas; mas, sem embargo, são alianças. Por Sua graça, Deus condescendeu em baixar ao nível do homem e a honrá-lo, tratando-o mais ou menos na base da igualdade. Ele estipula as Suas exigências e outorga as Suas promessas e o homem assume os seus deveres assim impostos a ele e, desta maneira, herda as bênçãos divinas. Na aliança das obras o homem não podia satisfazer as exigências da aliança, em virtude dos seus dotes naturais, mas na aliança da graça ele é capacitado a satisfazê-las, unicamente pela influencia regeneradora e santificante do Espírito Santo. Deus realiza no homem o querer e o efetuar, concedendo-lhe de graça tudo quanto dele requer. Chama-se aliança da graça porque é a revelação ímpar da graça de Deus, e porque o homem recebe todas as bênçãos prometidas na aliança como dádivas da graça divina. (Teologia Sistemática – L. Berkhof. Pg 260)