terça-feira, 15 de outubro de 2013

A POSIÇÃO INFRALAPSÁRIA

a. Argumentos em seu favor: (1) Os infralapsários recorrem mais particularmente às passagens da Escritura nas quais os objetos da eleição aparecem numa condição de pecado, em estreita relação com Cristo e como objetos da misericórdia e da graça de Deus, como Mt 11.25, 26; Jo 15.19; Rm 8.28, 30; 9.15, 16; Ef 1.4-12; 2 Tm 1.9. Estas passagens parecem implicar que, no pensamento de Deus, a queda do homem precedeu à eleição de alguns para a salvação. (2) Eles chamam também a atenção para o fato de que, em sua representação, a ordem dos decretos divinos é menos filosófica e mais natural que a proposta pelos supralapsários. Está em harmonia com a ordem histórica da execução dos decretos, que parece refletir a ordem seguida no conselho eterno de Deus. Exatamente como na execução, assim há uma ordem causal no decreto. Há mais modéstia em ficar com esta ordem, justamente porque ela reflete a ordem histórica na Escritura e não pretende solucionar o problema da relação de Deus com o pecado. É considerada menos ofensiva em sua apresentação da matéria e em muito maior harmonia com as exigências da vida pratica. (3) Apesar de alegarem os supralapsários que a sua elaboração da doutrina dos decretos é a mais lógica das duas, os infralapsários reivindicam a mesma coisa para a sua posição. Diz Dabney: “O (esquema) supralapsário, com a pretensão de maiôs simetria, é na realidade o mais ilógico dos dois”. Demonstra-se que o esquema supralapsário é ilógico e que faz o decreto da eleição e da preterição referir-se a não-entidades, isto é, a homens inexistentes, exceto como simples possibilidades, mesmo na mente de Deus; inexistente ainda no decreto divino e, portanto, não vistos como criados, mas somente como criáveis. Ademais se diz que a elaboração supralapsário é ilógica em que necessariamente separa os dois elementos da reprovação, colocando a preterição antes da Queda, e a condenação depois. (4) Finalmente, também se chama a atenção para o fato de que as igrejas reformadas (calvinistas) sempre têm adotado a posição infralapsária em seus padrões oficiais, embora nunca tenham condenado, e, sim tenham tolerado sempre a outra posição. Entre os membros do Sínodo de Dort e da Assembléia de Westminster, havia diversos supralapsários que foram mantidos em alta honra (sendo que, em ambos os casos, o oficial presidente estava entre eles), mas, tanto nos Cânones de Dort como na Confissão de Westminster, está expresso o conceito infralapsário. b.Objeções. Eis algumas das mais importantes objeções levantadas contra o infralapsarianismo: (1) Ele não dá, nem diz que dá solução ao problema do pecado. Mas esta afirmação é igualmente verdadeira quanto à outra conceituação, de modo que, numa comparação de ambas as posições, isto não pode ser bem considerado como uma real objeção, embora às vezes levanta como tal. O problema da relação de Deus com o pecado é comprovadamente insolúvel para uma, bem como para outra. (2) Embora o infralapsarianismo possa ser movido pelo louvável desejo de guardar-se da possibilidade de acusar Deus de ser o autor do pecado, ao fazê-lo corre sempre o perigo de errar e ultrapassar o alvo, e alguns dos seus representantes têm cometido este erro. Eles são adversos à declaração de que Deus quis o pecado, e a substituem pela asserção de que Ele o permitiu. Mas então surge a questão quando ao sentido exato dessa afirmação. Significa que Deus meramente toou conhecimento da entrada do pecado, sem impedi-lo de modo algum, de maneira que a Queda foi, na realidade, uma frustração do Seu plano? No momento em que o infralapsário responder afirmativamente essa pergunta, estará entrando nas fileiras dos arminianos. Embora haja alguns que tomaram essa atitude, na maioria os infralapsários vêem que não podem assumir coerentemente essa posição, mas devem incorporar a Queda no decreto divino. Eles falam do decreto concernente ao pecado como um decreto permissivo, mas com o definido entendimento de que este decreto tornou certa a entrada do pecado no mundo. E se for levantada a questão sobre se Deus decretou permitir o pecado e assim deu a certeza à sua ocorrência, eles só podem indicar o beneplácito divino como resposta, e assim concordam perfeitamente com os supralapsários. (3) A mesma tendência de defender Deus se revela doutro modo e expõe o interessado a um perigo semelhante. O infralapsarianismo realmente quer explicar a reprovação como um ato da justiça de Deus. Inclina-se a negar explícita ou implicitamente que se trata de um ato do simples beneplácito de Deus. Isto realmente faz do decreto da reprovação um decreto condicional, e leva ao redil arminiano. Mas em geral os infralapsários não querem ensinar um decreto condicional, e se expressam reservadamente sobre esta matéria. Alguns deles admitem que é um engano considerar a reprovação pura e simplesmente como um ato da justiça divina. E isso está perfeitamente correto. O pecado não é a causa última da reprovação, como tampouco a fé e as boas obras são a causa da eleição, pois todos os homens estão, por natureza, mortos em pecados e delitos. Quando confrontados com o problema da reprovação, os infralapsários também só podem achar resposta no beneplácito de Deus. Sua Linguagem pode parecer mais delicada que a dos supralapsários, mas também está mais sujeita a ser mal entendida, e de toda maneira acaba transmitindo a mesma idéia. (4) A posição infralapsária não faz justiça à unidade do decreto divino, apresentado os seus diferentes membros componentes como partes exageradamente desconexas. Primeiro Deus decretou criar o mundo para a glória do Seu nome, o que significa, entre outras coisas, que Ele determinou que as Suas criaturas racionais vivessem de acordo com alei divina implantada em seus corações e louvassem o seu Criador. Depois decretou permitir a Queda, pela qual o pecado entrou no mundo. Isto parece constituir uma frustração do plano divino original, ou pelo menos uma importante modificação dele, visto que Deus não mais decreta glorificar-se pela obediência voluntária de todas as Suas criaturas racionais. Finalmente, seguem-se os decretos da eleição e da reprovação, que representam apenas uma execução parcial do plano original. 4. Do que foi dito parece seguir-se que não podemos considerar o supra e o infralapsarianismo como absolutamente antitéticos. Eles tecem considerações sobre o mesmo mistério, partindo de pontos de vista diferentes, um fixando a atenção na ordem ideal ou teleológica dos decretos: o outro, na ordem histórica. Até certo ponto eles podem e devem andar juntos. Ambos acham suporte na Escritura. O supralapsarianismo, nas passagens que acentuam a soberania de Deus, e o infralapsarianismo, nas que salientam a misericórdia e a justiça de Deus, em conexão com a eleição e a reprovação. Cada um deles tem algo em seu favor: o primeiro, que não intenta justificar a Deus, mas simplesmente descansa no soberano e santo beneplácito de Deus; e o último, que é mais modesto e delicado, e leva em conta as necessidades e exigências da vida prática. Ambos são necessariamente incoerentes: o primeiro, porque não considera o pecado como uma progressão, mas tem que considera-lo como um distúrbio da criação e fala de um decreto permissivo, que dá certeza ao surgimento do pecado. Mas cada um deles também dá ênfase a um elemento verdadeiro do supralapsarianismo acha-se em sua ênfase ao seguinte: que o decreto de Deus é uma unidade: que Deus tem um único objetivo final em vista; que em certo sentido Ele quis o pecado; e que a obra da criação foi imediatamente adaptada à atividade recriadora de Deus. E o elemento verdadeiro do infralapsarianismo consiste que há uma certa diversidade nos decretos de Deus; que a criação e a Queda não podem ser consideradas apenas como meios para um fim, mas também tinham grande significação independente; e que o pecado não pode ser considerado como um elemento de perturbação do mundo. Com relação ao estudo deste tema profundo, devemos ver que o nosso entendimento é limitado, e dar-nos conta de que captamos somente fragmentos da verdade. Os nossos padrões confessionais incorporam a posição infralapsária, mas não condenam o supralapsarianismo. Percebeu-se que esta conceituação não é necessariamente incoerente com a teologia reformada (calvinista). E as conclusões de Utrecht, adotadas em 1908 por nossa igreja, declaram que, conquanto não seja permissível apresentar o conceito supralapsário como doutrina das igrejas reformadas da Holanda, tampouco é permissível molestar a quem quer que pessoalmente lhe dê agasalho. QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA. 1. É possível uma presciência divina dos eventos que não esteja baseada no decreto de Deus? 2. Qual o resultado inevitável de basear o decreto de Deus em Sua presciência, em vez do contrário, Sua presciência no decreto? 3. Como a doutrina dos decretos difere do fatalismo e do determinismo? 4. O decreto da predestinação exclui necessariamente a possibilidade de uma oferta universal da salvação? 5. Os decretos da eleição e da reprovação são igualmente absolutos e incondicionais, ou não? 6. São eles semelhantes como as causas das quais as ações humanas procedem como efeitos? 7. Como a doutrina da predestinação se relaciona com a doutrina da soberania divina: - com a doutrina da depravação total; - coma doutrina da expiação; - com a doutrina da perseverança dos santos? 8. Os reformados (calvinistas) ensinam que há uma predestinação para pecar? BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA. Geref. Dogm. II, p. 347-425; Kuyper, Dict. Dogm., De Deo III, p. 80-258; Vos, Geref. Dogm. I, p.81-170; Hodge, Syst, Theol. I, p. 535-549; II, p. 313-321; Shedd, Dogm. Theol. I 393-492; Mastricht, Godgeleerdheit I, p. 670-757; Comrie, em Holtius, Examen van het Ontwerp van Tolerantie, Samenspraken VI e VII; Turretino, Opera I, p. 279-382; Dabney, Syst. and Polem. Theol., p. 211-246; Miley, Syst. Theol, II, p. 245-266; Cunningham, Hist, Theol. II, p.416-489; Wiggers, Augustinianism and Pelagianism, p. 237-254; Girardeau, Calvinism and Evangelical Arminianism, p. 14-412; ibid., The Will in its Theological Relations; Warfield, Biblical Doctrines, p. 3-67; ibid., Studies in Theology, p. 117-231; Cole, Calvin’s Calvinism, p. 25-206; Calvino, Institutes III. Chap. XXI-XXIV; Dijik, De Strijd over Infra-en Supralapsarisme in de Gereformeerde Kerken van Nederland; ibid, Om’t Eeuwig Welbehagen; Fernhout, De Leer der Uitverkiezing; Polman, De Praedestinatieleeer van Augustinus, Thomas van Aquino en Calvijn. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 118)