terça-feira, 1 de outubro de 2013

Criação em Geral

O estudo dos decretos leva naturalmente à consideração da sua execução, e esta começa com a obra da criação. É a primeira, não somente na ordem cronológica, mas também como prioridade lógica. É o começo e a base de toda a revelação divina e, conseqüentemente, é também o fundamento de toda a vida ética e religiosa. A doutrina da criação não é exposta na Escritura como uma solução filosófica do problema do mundo, mas, sim, em seu significado ético e religioso, como uma revelação de relação do homem com seu Deus. Ela salienta o fato de que Deus é a origem de todas as coisas, e de que todas as coisas Lhe pertencem e Lhe estão sujeitas. O conhecimento desta doutrina só se aufere da Escritura e se aceita pela fé (Hb 11.3), embora os católicos romanos sustentem que também pode ser colhido da natureza. A. A doutrina da Criação na História. Enquanto a filosofia grega procurava a explicação do mundo num dualismo que envolve a eternidade da matéria, ou num processo de emanação que faz do mundo a manifestação eterna de Deus, a igreja cristã dede o começo ensinava a doutrina da criação ex nihilo e como um ato livre de Deus. Esta doutrina foi aceita com singular unanimidade desde o início. Acha-se em Justino Mártir, Irineu, Tertuliano, Clemente de Alexandria, Orígenes, e outros. Teófilo foi o primeiro “pai da igreja” a salientar o fato de que os dias da criação foram dias literais. Esta parece ter sido a opinião de Irineu e Tertuliano também e, com toda a probabilidade, era a opinião comum da igreja. Clemente e Orígenes achavam que a criação tinha sido realizada num momento único e indivisível, e entendiam sua descrição como obra de vários dias como um simples recurso literário para descrever a origem das coisas na ordem do seu valor ou da sua conexão lógica. A idéia de uma criação eterna, como ensinava Orígenes, geralmente era rejeitada. Ao mesmo tempo, alguns dos chamados pais da igreja expressaram a idéia de que Deus sempre foi Criador, embora o universo criado tenha começa do no tempo. Durante a controvérsia trinitária, alguns deles acentuaram o fato de que, em distinção da geração do Filho, que foi um ato necessário do Pai, a criação do mundo foi um ato livre do Deus triúno. Agostinho tratou da obra da criação mais minuciosamente que os outros. Ele argumentava que esteve eternamente na vontade de Deus e, portanto, não produziu mudança nele. Antes da criação o tempo não existia, dado que o mundo foi trazido à existência juntamente com o tempo, antes que no tempo. A pergunta sobre o que fazia Deus nas muitas eras antes da criação baseia-se num falso conceito da eternidade. Enquanto a igreja em geral parece que ainda sustentava que o mundo foi criado em seis dias comuns, Agostinho sugeriu uma conceituação um tanto diferente. Ele defendia vigorosamente a doutrina da creatio ex nihilo, mas distinguia dois momentos da criação: a produção da matéria e dos espíritos do nada, e a organização do universo material. Achava difícil dizer de que espécie eram os dias de Gênesis, mas evidentemente estava inclinado a pensar que Deus criou todas as coisas num momento de tempo, e que a idéia de dias foi simplesmente introduzida para auxiliar a inteligência finita. Os escolásticos discutiram bastante sobre a possibilidade da criação eterna: Alguns, como Alexandre de Hales, Boaventura, Alberto Magno, Henrique de Ghent, e a grande maioria dos escolásticos negando-a; e outros como Tomaz de Aquino, Duns Scotus, Durandus, Biel, e outros, afirmando-a. Todavia, a doutrina da criação com o tempo ou nele levou a palma. Erígena e Eckhart constituíram exceções, ensinando que o mundo foi originado por emanação. Ao que parece, os dias da criação eram considerados como dias comuns, apesar de Anselmo opinar que talvez fosse necessário concebe-los como diferentes sos nossos dias atuais. Os reformadores defendiam firmemente a doutrina da criação do nada, por um livre ato de Deus, no tempo ou com ele, e consideravam os dias da criação como seis dias literais. Esta concepção também foi mantida em geral na literatura do pós-Reforma, dos séculos dezesseis e dezessete, embora alguns teólogos (como Maresius, por exemplo) tenham falado ocasionalmente em criação contínua. No século dezoito, porém, sob a influência dominadora do panteísmo e do materialismo, a ciência vestiu contra a doutrina da criação esposada pela igreja. Substituiu a idéia da absoluta originação por um fiat divino pela evolução ou desenvolvimento. Muitas vezes o mundo era apresentado como uma manifestação necessária do Absoluto. Sua origem foi empurrada para trás, milhares e até milhões de anos, rumo a um passado desconhecido. E houve teólogos que logo se engajaram em diversas tentativas da harmonizar a doutrina da criação com ensinos da ciência e da filosofia. Alguns sugeriram que os primeiros capítulos de Gênesis fossem interpretados alegórica ou miticamente; outros, que transcorreu um longo período de tempo entre a criação primária de Gn 1.1,2 e a criação secundária dos versículos subseqüentes; e ainda outros, que os dias da criação foram de fato longos períodos de tempo. (Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 120)